A Brasil Ecodiesel espera ter escrito, nos últimos meses, as primeiras linhas de um novo capítulo em sua curta e turbulenta história. Criada em 2003 para a ser a principal “âncora” privada do programa brasileiro de mistura de biodiesel no diesel mineral, a empresa, que abriu o capital em 2006, já esteve nos píncaros da glória e no fundo do poço, de onde começou a sair no segundo semestre de 2009 em busca de seus melhores dias – ou, pelo menos, de dias melhores.
Após a profunda reestruturação operacional, financeira e societária do ano passado, quando bancos credores tornaram-se controladores, houve uma capitalização de R$ 420 milhões e dívidas de R$ 340 milhões foram reduzidas e alongadas, a companhia encerrou o primeiro trimestre de 2010 no azul e passou a prever inclusive investimentos na expansão de sua capacidade de produção, ainda que duas de suas seis unidades de produção sigam praticamente paradas e estejam fora do jogo.
“Buscamos um novo padrão e uma nova imagem”, afirma Mauro Cerchiari, presidente da Brasil Ecodiesel. O próprio executivo é parte da reestruturação. Após deixar a International Paper e atuar por um ano como consultor da área de biocombustíveis, Cerchiari assumiu o posto em agosto. No quarto trimestre de 2009, a Brasil Ecodiesel voltou ao azul, e houve ganhos também entre janeiro e março deste ano.
Conforme balanço enviado à CVM na semana passada, a companhia encerrou o primeiro trimestre de 2010 com lucro líquido ajustado de R$ 18,4 milhões, ante prejuízo de R$ 27,4 milhões em igual intervalo do ano passado. A receita líquida mais do que triplicou na comparação, para quase R$ 150 milhões, e o Ebitda ajustado também foi positivo (R$ 23,4 milhões). O volume de biodiesel faturado se aproximou de 62 mil metros cúbicos, 6% maior que entre outubro e dezembro de 2009.
Pioneira no mercado, a Brasil Ecodiesel chegou a abocanhar mais de 40% das vendas nos leilões que o governo promove para comprar o biocombustível e garantir o sucesso do programa de mistura no diesel, que desde janeiro prevê um percentual de mistura de 5%. Mas o aprendizado custou caro, com reflexos que ainda hoje influenciam os rumos da empresa, como admite Cerchiari. No auge, em meados de 2007, a ação da companhia atingiu R$ 10,88; em outubro de 2008, o valor chegou a cair a R$ 0,43, e hoje está um pouco abaixo de R$ 1, segundo o Valor Data.
O processo de busca de matérias-primas para a produção de biodiesel, por exemplo, mostrou-se um enorme desafio para as companhias do segmento. A fonte preferida continua sendo o óleo de soja, e o uso de culturas como a mamona, a preferida pelo presidente Lula por integrar a agricultura familiar à cadeia, mostrou-se pouco competitivo sem um forte apoio oficial – leia-se subsídios. A mamona não foi esquecida, mas recentemente o governo lançou um programa para incentivar o uso do óleo de palma, sobretudo no Norte e Nordeste, também com o objetivo de atrair os pequenos.
“Um dos pilares do programa nacional do biodiesel é a agricultura familiar, e continuará assim. Mas o segmento ainda busca melhores formas de garantir a utilização de culturas alternativas. Acreditamos que será preciso haver incentivos diferenciados na medida que as fontes para a produção aumentarem”, diz.
Cerchiari lembra que os percentuais obrigatórios de compra de matérias-primas da agricultura familiar pelas empresas que produzem biodiesel já foram reduzidos pelo governo. No Sul e no Nordeste, caíram para 30%. No Centro-Oeste, está em 10%. Em 2007, antes das reduções, duas unidades da Brasil Ecodiesel – localizadas em Itaqui (MA) e Iraquara (BA) – tiveram o Selo Combustível Social suspenso. A empresa contesta a suspensão promovida pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário na Justiça, e, paralelamente, trabalha com o ministério para equacionar melhor a questão.
As duas fábricas estão entre as quatro que receberão investimentos em expansão este ano – as outras são em Porto Nacional (TO) e Rosário do Sul (RS). Conforme Cerchiari, os aportes, ainda em fase de definição, poderão totalizar R$ 20 milhões em 18 meses e elevar a capacidade de produção da empresa em até 25%. Hoje, a capacidade anual é da ordem de 500 mil metros cúbicos. “Mas nosso foco principal é redução de custos, não expansão”. Nesse sentido, a companhia também estuda uma nova destinação para uma área de 42 mil hectares espalhadas pelos Estados do Ceará, Piauí e Bahia, originalmente adquirida para o plantio de mamona e onde já houve experiência com pinhão-manso.
Apesar de os desafios serem grandes, Cerchiari acredita que a Brasil Ecodiesel terá um bom 2010, capaz de melhorar o posicionamento da empresa em um mercado que certamente passará por um processo de consolidação. Atualmente, as dez maiores companhias do segmento – são cerca de 60 no total – já dominam 70% da produção e das vendas.