Da Redação 19/04/2005 – A guerra jurídica dos alimentos transgênicos está longe de ser concluída, mesmo após a sanção da Lei de Biossegurança (Lei n 11.105/05). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mantém em consulta pública, desde o dia 5, uma proposta de resolução que define procedimentos para avaliar a segurança, para consumo humano, de alimentos que contêm organismos geneticamente modificados.
A proposta vem engordar um pacote de discussões jurídicas – que até então tinham como articuladores o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama – , que questionam a autoridade da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNB) para avaliar a segurança dos transgênicos.
O regulamento é composto por 161 questões e solicitações de documentos para comprovar que o alimento é seguro para consumo humano e fundamenta-se no Decreto n 3029/99 e na Portaria n 593/00, que definem as atribuições da Anvisa. Pelo projeto, a Anvisa teria poder para proibir o consumo de produtos contendo componentes transgênicos que o órgão considerar não seguros para alimentação, mesmo tendo sido aprovados pela CTNBio.
Procurada pelo Valor por duas semanas, a Anvisa informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que seus técnicos não iriam se pronunciar sobre a proposta, que ficará em consulta pública até o início de maio e pode sofrer alterações. A assessoria de imprensa da CTNBio também informou que só se posicionará quando a regulamentação for aprovada.
Patrícia Fukuma, sócia da Fukuma Advogados e membro do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB), observa que a Lei de Biossegurança é clara ao estabelecer a CTNBio como único órgão com competência para avaliar se um alimento é seguro para consumo humano. “O projeto da Anvisa ignora a Lei de Biossegurança e usurpa o poder dado à CTNBio.”
Antônio José Monteiro, sócio da área de direito ambiental do Pinheiro Neto Advogados, observa que, de acordo com o artigo 14 da lei, “(…) os órgãos de registro e fiscalização, no exercício de suas atribuições em caso de solicitação pela CTNBio, observarão, quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio”.
“Isso significa que a Anvisa não pode ignorar a decisão da Comissão favorável a um produto”, afirma Monteiro. O advogado observa que, pela lei, os órgãos de fiscalização podem pedir a reavaliação de um produto se houver nova descoberta científica que não tenha sido apreciada. “Reavaliar documentos já analisados é ignorar o parecer técnico da CTNBio.”
Paulo Pacini, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), argumenta que a Anvisa não pode deixar de avaliar a segurança dos alimentos e deve estabelecer normas para avaliar os transgênicos. “A Lei de Biossegurança confere à CTNBio o poder de decidir sobre a segurança de um alimento, mas nenhuma legislação pode afastar de um órgão em exercício a atividade que lhe é atribuída por lei e pela Constituição”, diz Pacini.
Ele observa que o Ministério do Meio Ambiente também já informou que não deixará de avaliar o impacto dos transgênicos ao meio ambiente. “Esse assunto ainda será motivo de muitas discussões jurídicas”, afirma Pacini.