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Biossegurança

<p>Protocolo de Cartagena ainda gera disputa. Governo não tem posição unificada para apresentar em reunião em Curitiba em março de 2006.</p>

Da Redação 28/11/2005 – A longa batalha travada nos bastidores do governo em torno da regulamentação da nova Lei de Biossegurança não sepultou as divergências entre defensores e inimigos dos transgênicos. Ao contrário, virou combustível para outro duelo, desta vez disputado em uma arena internacional com outros 125 países.

Às vésperas da mais importante reunião sobre comércio internacional de organismos modificados, que ocorrerá em março de 2006, em Curitiba (PR), o governo ainda não se entende sobre as regras que deverá defender para preservar o meio ambiente sem perder de vista ganhos econômicos.

A disputa ocorre em torno das regras do Protocolo de Biossegurança de Cartagena, adotado pelas partes desde 2000. O tratado prevê a identificação desses organismos, mecanismos de responsabilização e compensação por danos ao ambiente e à saúde humana, além da avaliação de riscos e montagem de um base de dados internacionais.

A principal divergência gira em torno de qual expressão deve ser adotada para identificar esses produtos no trânsito internacional.

A briga reproduz divergências iniciadas em 1997 com o debate sobre a liberação comercial de transgênicos. De um lado, estão os ministérios da Agricultura, Desenvolvimento e Ciência e Tecnologia. De outro, figuram Meio Ambiente, Desenvolvimento Agrário, Saúde e Justiça. Em meio ao desentendimento está o Itamaraty, que defenderá os interesses do país no tratado.

O primeiro grupo de ministérios, pró-transgênicos, defende que as cargas levem a expressão “pode conter” organismos modificados. O segundo, resistente à biotecnologia, quer que os documentos expressem “contém” um determinado tipo de organismo.

Na última rodada de negociações das regras, em Montreal, no Canadá, o Brasil entendeu que o acordo ambiental seria usado como barreira não-tarifária e travou as discussões sobre exigências de documentação para carregamentos de transgênicos destinados à alimentação ou processamento.

Há, porém, outra discussão sobre o paradoxo que significa o Brasil defender regras mais brandas em documentos de trânsito internacionais e, ao mesmo tempo, impor normas rígidas de rotulagem internamente. “Nossa lei de rotulagem tem aspectos em desarmonia com a posição do Brasil no protocolo”, diz José Maria da Silveira, pesquisador do Núcleo de Economia Agrícola da Unicamp. O decreto de rotulagem, de abril de 2003, exige informações na embalagem quando o produto tiver mais de 1% de ingredientes transgênicos em sua composição.

Uma parte do governo vê no protocolo uma tentativa dos países importadores para transferir o custo do rastreamento das commodities aos produtores, como o Brasil, além de um movimento para evitar eventuais ágios nessas mercadorias, sobretudo a soja.

“A União Européia quer regras estritas e rígidas para usar como barreira aos nossos produtos”, resume o ministro Hadil da Rocha Vianna, chefe da Divisão de Meio Ambiente do Itamaraty e coordenador da delegação brasileira em Montreal. A outra parte exige a defesa da legislação nacional de rotulagem. “Nossa defesa se dá em cima da lei brasileira e do decreto de rotulagem”, argumenta o assessor jurídico do Ministério do Meio Ambiente, Gustavo Trindade.

O Ministério da Agricultura alerta, porém, que o Protocolo de Cartagena não trata de rotulagem, mas de informação na nota fiscal. “Há uma confusão. Não há comparações possíveis entre objetos tão distintos”, diz o coordenador de biossegurança da Pasta, Marcus Vinícius Coelho.

No setor privado, a disputa repercute mal. “Não existe cooperação dentro do governo para seguir a mesma linha”, diz Rodrigo Carvalho Abreu Lima, pesquisador do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone).

Para o professor José Maria da Silveira, da Unicamp, é preciso saber os limites do princípio da precaução em cada país. “Precisamos de informações para ter um sistema suficiente e confiável com o protocolo”.

Grande produtor e exportador de commodities, e agora com regras definitivas para plantio e comercialização de transgênicos, o Brasil precisa medir exatamente até onde as decisões do protocolo podem beneficiar ou prejudicar seus interesses. O protocolo se aplica ao comércio, armazenagem, identificação e uso de todos os transgênicos que podem afetar a biodiversidade e a saúde