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Energia Limpa

Brasil atrai muitos investimentos e pode se tornar polo de fontes alternativas de energia

Ensolarada e ventilada costa brasileira tem terrenos disputados por projetos de energia limpa

Brasil atrai muitos investimentos e pode se tornar polo de fontes alternativas de energia

Construir uma fábrica ou um shopping center com lâmpadas, tomadas e equipamentos exclusivamente alimentados com energia limpa é plenamente possível num país como o Brasil. Com geografia, clima e regras favoráveis, o país tem tudo para se tornar um polo de atração de negócios baseados em fontes renováveis — que ficam mais baratas com o avanço da tecnologia —, particularmente no momento em que a pandemia e os conflitos geopolíticos estimulam a realocação de cadeias produtivas no planeta.

A definição da origem da energia de um empreendimento passa pelo marketing ambiental sensível aos consumidores e pelo cumprimento de exigências de sustentabilidade crescentes de investidores e reguladores, mas pode significar também redução de custos, novos mercados e oportunidades de negócios.

Neste cenário, a ensolarada e ventilada costa brasileira, do Nordeste ao Sul, tem terrenos disputados por projetos de energia limpa, ampliando a oferta em um país que já se destaca com uma das matrizes elétricas mais descarbonizadas do mundo, graças às muitas hidrelétricas.

Agora, está em curso uma diversificação, com fontes de menor impacto ambiental ainda, alta competitividade e muito potencial inexplorado. Atentas, empresas nacionais e estrangeiras do setor investem para ampliar a capacidade por aqui, o que viabiliza projetos para usar essa energia verde.

— Na premissa de que o mundo vai ser mais verde, o Brasil pode se tornar um polo que vai atrair outros. Tem potencial como nenhum outro país com sua abundância de renováveis. Pode ser um grande celeiro de investimentos — avalia Lucas Araripe, diretor de Novos Negócios da Casa dos Ventos, uma operadora e comercializadora de energia de fontes renováveis.

Segundo Araripe, a empresa tem três grandes projetos em curso: a conclusão da expansão do complexo Rio do Vento em 2023, o início das obras do complexo eólico Umari neste ano (ambos no Rio Grande do Norte) e o começo da atividade do complexo eólico Babilônia Sul, na Bahia, em 2023.

 Um bom termômetro desse movimento é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que tem melhores condições de financiamento para projetos relacionados a fontes renováveis. Os números do banco dimensionam o aumento da oferta de energia limpa que fomenta o mercado livre — no qual empresas grandes consumidoras podem escolher de quem comprar — e favorece a transição energética.
 
De 2017 a 2021, o BNDES financiou 62 projetos de energia eólica, solar, hidrelétrica e de biomassa (como geradoras a partir de bagaço da cana), totalizando 9,4 GW de capacidade instalada e R$ 29 bilhões em crédito que viabilizaram R$ 50,2 bilhões em investimentos.

A geração eólica soma 795 parques em 12 estados e 9 mil aerogeradores, aquelas torres que parecem grandes cataventos. Isso representa uma capacidade de 22 GW, que deve chegar a 27 GW no fim do ano. No entanto, o potencial dessa modalidade no país é bem maior, acima de 800 GW, diz Elbia Gannoum, presidente da ABEEólica, associação do setor:
— Em 2017, houve um ponto de inflexão importante, pois a produção (de equipamentos) e (avanços na) tecnologia permitiram ganho de escala e redução no preço (da energia gerada). O Brasil então dobrou sua capacidade instalada, e agora o mercado está extremamente aquecido. A tendência é que continue nessa trajetória nos próximos dez anos.

energia limpa Brasil

15 GW de potência operacional em energia solar

Um dos segmentos que mais crescem agora é o fotovoltaico, que já conta com 15 GW de potência operacional, considerando grandes empreendimentos e as placas em residências e estabelecimentos.

Rodrigo Sauaia, CEO da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), diz que a expectativa do setor é de crescimento acelerado, consequência principalmente do marco legal da geração própria, sancionado em janeiro.

Marcos Pavarini, sócio da gestora de investimentos Biguá Capital, diz que multinacionais não podem levar energia limpa do Brasil, mas comprá-la para atividades aqui ajuda as metas ambientais de suas matrizes, além de reforçar a imagem com redução de emissões de carbono e práticas ESG (sigla em inglês para práticas ambientais, sociais e de governança). Ele afirma que esses aspectos de fato importam para investidores, que valorizam certificados de redução de CO2 e acesso à energia limpa:

— Numa indústria, a energia mais cara é a que não tem.

Gabriel Mann, diretor de comercialização da Engie Brasil Energia, outra geradora e comercializadora de eletricidade, diz que a procura por renováveis estimulou a empresa a triplicar a participação de eólica em sua capacidade total, para 18%, em cinco anos. Da geração, 60% vão para quase 700 consumidores livres.

— Com a pandemia, houve um amadurecimento generalizado do setor privado em relação às temáticas ESG, que estão ocupando posição estratégica na tomada de decisão das empresas. Isso desencadeou aumento exponencial do engajamento de diferentes setores em jornadas de descarbonização — analisa Mann.

Um exemplo é a fabricante de eletrodomésticos sueca Electrolux, que vem investindo em energia renovável em suas operações na América Latina desde 2015. A partir de 2020, todas as suas 70 instalações na região, entre fábricas e armazéns, passaram a consumir exclusivamente energia de origem solar ou eólica.

Fernando Keske, diretor de EHS (Saúde, Segurança e Meio Ambiente, na sigla em inglês) e Sustentabilidade em Operações para a Electrolux América Latina, diz que os contratos de cinco a dez anos contam com incentivos como descontos em tarifas de transmissão e permitem equalizar eventuais custos mais altos.
 
Para ele, fontes renováveis vão se tornar cada vez mais baratas com o avanço da tecnologia e diz que o acesso a elas virou um ativo para a empresa. E cita instrumentos financeiros associados ao tema, como os green bonds, os títulos verdes cuja captação de recursos está atrelada ao cumprimento de metas de sustentabilidade:

— Além de atingir o ESG, nosso papel é trazer esse benefício do mercado porque a empresa estabeleceu que há uma questão financeira envolvida.

A calçadista brasileira Vulcabrás, dona das marcas Olympikus e Mizuno, aderiu à energia totalmente renovável a partir deste ano nas fábricas de Horizonte (CE) e Itapetinga (BA). Elas são abastecidas com energia eólica do complexo Rio do Vento, da Casa dos Ventos, num contrato de R$ 150 milhões por no mínimo 13 anos. A meta da Vulcabrás é, até 2030, ter todas as suas operações com energia limpa.

A Vale atingiu, em 2021, a fatia de 89% da eletricidade de suas operações no mundo provenientes de fontes renováveis. No Brasil, a participação chega a 99%. A mineradora destaca o Projeto Sol do Cerrado para geração de energia solar em Jaíba (MG), que produzirá 13% da energia demandada pela Vale no país em 2025.

Capacidade instalada

Confiança no país

Para ampliar essa oferta, a Enel Green Power direciona para o Brasil mais de 50% dos € 9,8 bilhões (cerca de R$ 50 bilhões) que o grupo italiano, que opera em 30 países, aplica em renováveis na América Latina. Roberta Bonomi, responsável pela subsidiária no Brasil, destaca que o marco regulatório, a segurança jurídica e os leilões de energia renovável foram decisivos.

Uma das novidades recentes do setor foi a liberação pela agência reguladora de projetos eólicos com aerogeradores no mar, mas a executiva da Enel diz que ainda há muito o que explorar em terra.

— Em outros países se faz offshore porque não tem terra ou o vento do mar é mais forte, mas se gasta o dobro ou o triplo para fazer instalação no mar. No Brasil, tem muita terra, e o vento é quase igual — diz ela. — O problema hoje é a intermitência (inconstância dos ventos). O ideal é termos tecnologia para poder armazenar a energia. Isso já existe em outros países, mas no Brasil depende do marco regulatório.