A carne bovina brasileira passou a ser a mais cara do mundo, mas isso não impede que o setor enfrente uma de suas crises mais graves. A valorização do real em relação ao dólar elevou o preço da arroba brasileira, historicamente cotada em US$ 25, para US$ 44. Com isso, o País perdeu competitividade ante outros exportadores, como Austrália, Argentina e Uruguai.
A redução nas exportações, sobretudo de cortes mais valorizados, por causa da crise internacional, provocou uma queda de 22% no faturamento do setor e teve influência na redução do Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio, segundo a Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato). ”Perdemos o mercado europeu, que era o que mais remunerava, pois levava só filé mignon e carne de primeira”, disse o pecuarista e consultor da Famato, Luiz Carlos Meister.
Os efeitos ainda são sentidos no campo. Somente em Mato Grosso, seis unidades frigoríficas estão paradas. Outras nove que também suspenderam os abates voltaram a operar depois de serem absorvidas por outros grupos. Em Mato Grosso do Sul, 11 unidades frigoríficas continuam com o abate suspenso ou reduzido.
No Estado de São Paulo, pecuaristas tradicionais veem com preocupação a forte redução na renda. De acordo com o criador de gado de elite José Fernandez Lopez Netto, vice-presidente do Sindicato Rural de Itapeva, o preço da arroba do boi recuou de mais de R$ 90 para a faixa de R$ 75. ”Os preços de insumos, minerais e medicamentos não caíram na mesma proporção.”
Segundo ele, o pecuarista pagou caro pelo bezerro e a relação de troca, na venda, não é boa. ”O produtor vê o mercado frouxo e investe menos em genética.” Muitas empresas de genética bovina do sudoeste paulista estão paradas. ”A renda da pecuária caiu tanto que, para o criador conseguir salário igual ao de um soldado, precisa manter 300 vacas.” Ex-presidente da Associação Paulista de Criadores de Gado Pardo-Suiço, Lopez Netto vê a atividade encolher no Estado.
”Muitos criadores arrendaram o pasto para usina de cana.” No setor de frangos e suínos o faturamento diminuiu, respectivamente, 18% e 14% este ano. Segundo a Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), a queda nas exportações de janeiro a outubro deste ano foi de 29%. Os volumes embarcados tiveram pequeno crescimento em relação a 2008, mas os preços ficaram muito abaixo.
Para o presidente da Abipecs, Pedro de Camargo Neto, o real valorizado é um dos principais fatores da perda de rentabilidade dos produtores. Ele defende intervenção do governo no câmbio.
José Antônio Fontes, presidente da Associação Nacional de Produtores de Bovinos de Corte, afirma que o mercado da carne sofre outras interferências. Segundo ele, a fusão de grandes frigoríficos brasileiros diminuiu o número de empresas que negociam no exterior. ”A fusão afugenta possíveis compradores porque temem que haja alinhamento de preços”, opina.
Fontes afirma que a conjuntura internacional acaba beneficiando o consumidor brasileiro, que consegue comprar cortes nobres de carne a preços mais baixos e que o valor só não é menor por pressão do varejo. Neste ano, segundo o dirigente, o produtor vive situação atípica. ”Nem mesmo na entressafra o preço subiu”, diz, lembrando que as condições climáticas permitiram uma grande oferta do produto.