Redação (27/10/06) – Quando o presidente da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), Walter Colli, vem a público dizer que são praticamente nulas as possibilidades de o País ter este ano alguma nova decisão sobre liberação comercial de sementes transgênicas e, ao mesmo tempo, ainda precisa fazer um apelo para que os integrantes da CTNBio compareçam às reuniões, conforme matéria publicada em O Estado de S.Paulo do último domingo, dia 22, é possível se ter uma dimensão dos problemas que a Comissão está enfrentando na tentativa de realizar o seu trabalho.
Atualmente, a CTNBio passou a ter 54 integrantes, metade deles com a posição de suplente. Para a aprovação de uma liberação comercial, por exemplo, são necessários 18 votos favoráveis, com a presença de dois terços dos titulares. Como tem sido bem alto o índice de absenteísmo nas reuniões, acaba não sendo possível fazer as votações. O problema está na lei. Em vez de uma comissão, eles criaram uma assembléia geral, desabafou Colli, na mesma manifestação contra as amarras que a CTNBio está enfrentando.
A verdade é que, todos somos sabedores, existem dois grupos dentro da CTNBio se digladiando o tempo todo: um deles querendo agilizar os trabalhos e o outro com o único compromisso de retardar o andamento dos processos. Diante disso, o que podem fazer os pesquisadores sérios que precisam dar continuidade a seus trabalhos e não podem ficar à mercê de um órgão regulatório, que não consegue dar andamento aos processos de avaliação para poder liberar ou não os inúmeros pedidos para a realização de pesquisas de campo na área de biotecnologia?
Reunidas no mês passado, em Florianópolis, as Comissões Internas de Biossegurança (CBIo) de Instituições Públicas e Privadas debateram outro problema gravíssimo do setor, que são os atentados a estações experimentais e laboratórios de pesquisa provocados por vândalos empenhados em destruir a ciência brasileira. Em moção de repúdio a essa dilapidação organizada, que coloca em risco a própria continuidade dos investimentos públicos e privados em P&D, os pesquisadores informaram onde estão buscando proteção para seus trabalhos:
Muitas pesquisas e colaborações institucionais de biotecnologia já estão sendo conduzidas em parte ou no todo naqueles países onde as leis e normas de biossegurança são observadas, inclusive em países vizinhos como a Argentina, diz o documento. Isto resultará em atraso significativo em P&D de biotecnologia no Brasil, que perderá em capacitação técnico-científica, em formação acadêmica, em geração de empregos e em captação de royalties na exportação de produtos biotecnológicos, acrescentaram os pesquisadores que compareceram ao III Encontro das Comissões Internas de Biossegurança, na capital catarinense.
Como se não bastassem as dificuldades para a continuidade da análise dos atuais processos pendentes em sua pauta, a CTNBio também criou normas internas que contribuem para sua inércia. Ela poderia, por exemplo, concentrar-se nas avaliações de risco contidas nesses processos e repassar às CIBios as avaliações burocráticas, sem implicações técnicas. Atualmente, para fazer uma pequena ampliação em seu laboratório, por exemplo, é preciso encaminhar para aprovação da CTNBio ( que já fiscaliza as CBIos sistematicamente), gerando um novo processo que vai contribuir para atravancar ainda mais a continuidade de avaliação dos processos.
O que é ainda mais grave é que os representantes ambientalistas da CTNBio afirmam que não existe atraso algum na avaliação dos processos e, sim, uma busca de maior segurança. O que parece passar desapercebido para esses miltantes são as grandes perdas ambientais e econômicas para o País, que é quem pagará a conta dessa atitude. Com isso, o que conseguem é impedir o acesso brasileiro a uma tecnologia que há mais de 10 anos vem provando agredir menos o meio ambiente, que economiza a água do planeta, causa menos erosão e, ainda, economiza o uso de defensivos.
Como o Governo pretende ter a biotecnologia como grande aliada para resolver os problemas nacionais, se não dá condições de colocar esses produtos nas mãos do cidadão brasileiro? É preciso refletir sobre o risco de não se ter a tecnologia e não apenas no risco de introduzi-la.
Leila Oda é pesquisadora da FioCruz e presidente da Associação Nacional de Biossegurança (ANBIO)