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Fiscalização, maior desafio da rotulagem

Para Idec, ideal é que seja estabelecida uma estratégia conjunta que cubra do campo ao varejo.

Da Redação 05/04/2004 – 05h25 – A partir desta semana, todos os alimentos para consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados (OGM) deverão trazer impresso, no rótulo da embalagem, o símbolo de identificação da presença de transgênicos, o triângulo amarelo com a letra “T” ao centro. Com a publicação no Diário Oficial, na última sexta-feira, da instrução normativa que define os procedimentos e as atribuições de cada órgão envolvido, a fiscalização já pode começar a atuar. E, segundo fontes ligadas ao governo, às indústrias e a entidades ambientais e de defesa do consumidor, aí está o maior desafio para que as regras sejam de fato cumpridas no país.

O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, reúne hoje os delegados federais dos oito Estados produtores de soja para traçar a estratégia de fiscalização. Caberá aos fiscais do ministério verificar se os produtores de soja transgênica, que assinaram o termo de compromisso admitindo que plantaram soja transgênica nesta safra 2003/04, estão incluindo a informação na nota fiscal. Os funcionários também vão fiscalizar o cumprimento das regras de rotulagem nas bebidas à base de soja; nos alimentos de origem animal que contenham soja, como hambúrgueres e salsichas; na soja para consumo humano; e nas indústrias de rações animais e farelo. O Ministério da Agricultura será responsável, ainda, pela fiscalização da entrada de soja transgênica nos portos e fronteiras.

Dependendo da safra da soja, a lei prevê dois tratamentos diferentes. Os produtos que contenham soja da safra 2002/03 não precisam apresentar o símbolo de identificação de transgênicos. Será exigida apenas a presença, na embalagem, das frases “pode conter soja transgênica” ou “pode conter ingrediente produzido a partir de soja transgênica”. Uma etiqueta colada ao rótulo é suficiente para atender à exigência da legislação. Já os produtos à base de soja da safra 2003/04 precisam, obrigatoriamente, seguir as regras de rotulagem que, além do símbolo, exigem a identificação do tipo de organismo transgênico utilizado.

Os Procons estaduais terão papel vital no processo de fiscalização. Amparados por um convênio com o Ministério da Justiça, esses órgãos terão o poder de fiscalizar os produtos destinados ao consumidor final. Nesse sentido, eles poderão inclusive solicitar testes de laboratório para constatar a presença ou não de OGMs. Quem descumprir as regras sofrerá as sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor.

A Instrução Normativa que definiu os procedimentos complementares para a fiscalização saiu quase um ano após a edição do decreto presidencial que obrigou à rotulagem dos alimentos com ingredientes transgênicos em proporção maior do que 1%. Mesmo assim, existem áreas nebulosas, como o efetivo papel que será exercido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A agência não vai atuar diretamente na fiscalização, apesar de constar da Instrução Normativa como um dos órgãos envolvidos na questão. Segundo a assessoria da agência, a sua atuação só seria necessária se os alimentos à base de transgênicos apresentassem risco à saúde. “Até agora, não existe nenhum estudo conclusivo que diga que transgênico faz mal à saúde, esse não é um problema de saúde pública”, disse um técnico da agência. As denúncias que a Anvisa receber quanto ao descumprimento das regras serão repassadas aos Procons e às vigilância sanitárias estaduais.

Outro problema está na fiscalização dos inúmeros tipos de alimentos industrializados que usam a soja como ingrediente e não precisam de registro nos órgãos de fiscalização, como biscoitos e sopas. Os fiscais dos Procons terão que esperar estes alimentos chegarem às gôndolas dos supermercados para agir.

“Será preciso integrar a fiscalização para que tenhamos uma fiscalização eficiente do campo ao varejo”, afirmou Sezifredo Paz, consultor técnico do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Ele comemorou a publicação da instrução normativa, mas também tem dúvidas quanto ao cumprimento da legislação. Um dos pontos complicados, segundo ele, é a rotulagem de produtos fabricados a partir de OGMs mas cujos sinais de transgenia desaparecem ao longo do processo de produção, como o óleo de soja. “Por isso o trabalho dos fiscais nas lavouras é fundamental”, disse. Daqui para frente, adiantou, o Idec estará permanentemente monitorando o processo de fiscalização.

Se depender da disposição das empresas que atuam no ramo de alimentos, não será difícil que as regras sejam cumpridas. Edmundo Klotz, presidente da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia), garantiu que as empresas do setor estão preparadas e dispostas a modificar as embalagens dos produtos que contenham mais de 1% de transgenia. “As indústrias acreditam que ganham mais credibilidade junto ao consumidor ao assumir que utilizam transgênicos”. Ele informa que é difícil saber o número de produtos no mercado brasileiro que apresentam esse percentual de componentes transgênicos. Na sexta-feira, não havia no varejo qualquer produto já rotulado.

Klotz reconhece que, além dos gastos com alteração de embalagens – que respondem, em média, por 15% do custo de produção no setor -, preocupa a possibilidade de redução no consumo de produtos rotulados. “É preferível mudar a composição do produto a rotular. Essa identificação pode assustar o consumidor no momento da compra”, afirmou.

A Kraft Foods informou que não utiliza ingredientes transgênicos em seus produtos e não modificará os rótulos. Adalgiso Telles, diretor da Bunge, dona de marcas de óleo de soja, margarinas e bebidas à base de soja, informou que todos os produtos vendidos pela empresa no varejo estão muito abaixo do limite determinado, e que já promove a separação de soja transgênica da convencional em algumas unidades. As blitze que certamente serão promovidas pelo Idec e pela ONG Greenpeace no varejo também serão um termômetro do cumprimento das regras.