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Presidente da Abipecs concede entrevista a Gazeta Mercantil

<p>O novo status sanitário de Santa Catarina, a ser homologado pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) em maio, vai provocar uma reação em cadeia dos demais estados para aumentar o investimento na erradicação da febre aftosa.</p>

Redação (01/02/07) – A estimativa do presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), Pedro de Camargo Neto, é de que, assim como os catarinenses, o restante do Brasil possa também ser livre de febre aftosa sem vacinação.

“O ciúme vai provocar uma reação e abrir o debate sobre o assunto”, avalia Camargo Neto, em entrevista exclusiva à Gazeta Mercantil. Ele acredita que a OIE comunique esta semana a mudança de status de Santa Catarina, com ressalvas, devido aos focos da doença na Bolívia detectados nos últimos dias.

GAZETA MERCANTIL Qual é hoje o maior problema do Brasil em relação à sanidade animal?

Camargo Neto O problema do Brasil é este centro: Mato Grosso do Sul-Paraguai, Mato Grosso-Bolívia, e Norte da Argentina-Rio Grande do Sul. Ou seja, a fronteira. A percepção de que o problema é ali é o centro da questão. A missão da OIE, em dezembro, já constatou isso. Faz 10 anos que o problema do Brasil é esse: a fronteira.

GZM Como o Brasil resolve este problema? Doando vacinas?

Camargo Neto O Brasil doa uma quantidade mínima de vacinas. Para erradicar tem de vacinar 90%, e não é vacinando o gado da fronteira. Doar pouco é enganar que estamos resolvendo.

GZM Se não é imunizando o gado, o que então deve ser feito?

Camargo Neto Tem de ser uma ação integrada com todos os países. Para começar tem de ter cadastro do rebanho, controle de trânsito de animais. Já fizemos isso bem feito no Brasil. É preciso ser feito no Paraguai e na Bolívia também.

GZM Se o problema é dos países vizinhos, qual é a parcela de culpa do Brasil?

Camargo Neto O problema do Brasil é onde teve foco: Japorã e Eldorado. Ficou claro que a febre aftosa estava lá há meses, que as propriedades de assentamentos e indígenas não vacinavam. O pior não é ter o foco. Acidentes acontecem. O pior é ficar sem ser detectado como ocorreu em Mato Grosso do Sul. Mostrou que não temos estrutura de vigilância sanitária, que existem falhas graves, como por exemplo, o cadastro dos animais e o controle do trânsito.

GZM – A vigilância é uma responsabilidade só do governo federal, que tem diminuído os recursos para a área?

Camargo Neto A vigilância é uma parceria do setor privado com o público, tanto estadual, quanto municipal e federal. O governo não vai fazer sozinho. Os pecuaristas, por exemplo, têm de estar cientes disso e denunciar quem não vacina. Ajudar no controle da doença.

GZM No episódio de aftosa na Bolívia, anunciado na última sexta-feira, o secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Gabriel Maciel, disse que hoje o maior problema do Brasil é Mato Grosso do Sul. O senhor concorda com isso?

Camargo Neto Mato Grosso do Sul tem um efeito sanfona. Em 1990, o estado liderava o combate à doença. Na mesma época, Mato Grosso não sofria pressão da Bolívia. Repito, a OIE detectou o problema na região e deve haver uma ação conjunta de todos os países do continente. O lado bom da missão da OIE é a possibilidade de Santa Catarina mudar o seu status.

GZM O que significa Santa Catarina ser reconhecida como livre de febre aftosa sem vacinação?

Camargo Neto Significa uma reação em cadeia. Na seqüência de Santa Catarina deve vir o Rio Grande do Sul. O debate de parar de erradicar eu espero que termine. Está na hora de o Brasil fazer um esforço. O status provisório não interessa. O definitivo tem de ser sem vacinação.

GZM O senhor acredita que o Rio Grande do Sul está preparado para parar de vacinar? Afinal, eles tiveram um foco faz seis anos…

Camargo Neto Acho que o Rio Grande do Sul tem de realizar o debate e parar de vacinar. E investir em vigilância sanitária. O setor privado tem de se reunir e apoiar o combate à doença. Parar de vacinar significa ter acesso a mercados importantes como o do Japão.

GZM A mudança de status sanitário de Santa Catarina muda o mercado das carnes?

Camargo Neto Se o relatório da OIE for bom, o Brasil já pode trabalhar o Chile e ir ao Japão e programar visitas. Acreditamos que no segundo semestre conseguiremos abrir um novo mercado com o status de Santa Catarina. E, no dia em que abrirmos o Japão, serão cinco anos maravilhosos. Teremos de investir para atender a demanda deles.

GZM O mercado japonês é muito exigente. Fala-se que eles só compram de países que sejam livres da doença e não de regiões. Como Santa Catarina pode se beneficiar desta mudança de status?

Camargo Neto O Japão precisa rever seus conceitos. Há 15 anos eles dizem isso, mas estão em fase de aceitar a compartimentalização das aves nos Estados Unidos. Ou seja, há espaço para a abertura de Santa Catarina. Além disso, nós apostamos que eles são muito mais contra a vacinação do que a regionalização.

GZM Que outros mercados estarão disponíveis a partir da mudança de status de Santa Catarina?

Camargo Neto Santa Catarina resolve o problema dos suínos, pois hoje somos dependentes da Rússia. Alcançaremos com isso países que pagam até 40% mais. Vai ser a única região com esse status sanitário. Então, mesmo com um rebanho de bovinos pequeno, na hora em que a carne de Santa Catarina chegar ao Japão, o debate vai ocorrer. E o primeiro lugar é no Rio Grande do Sul. Ou a gente arregaça as mangas ou perde o bonde da história.

GZM – Quanto o Brasil perde por não ter acesso ao mercado japonês?

Camargo Neto No caso dos bovinos, a perda é calculada em US$ 1 bilhão. Nos suínos é muito alta, mas não foi calculada. A gente perde exportações e, além disso, perde o efeito de preços que teria em todo o mercado.

GZM Quem perde mais com a febre aftosa?

Camargo Neto A mudança de status de Santa Catarina já resolve o problema dos suínos. Já a pecuária de corte vive uma crise de preços há cinco anos e que pode ser resolvida com a abertura do mercado japonês. Os suínos têm pagado o preço dos erros dos suínos. A probalidade de transmissão de febre aftosa pela comercialização de carne suína é remota. Portanto, quem tem de liderar esta cruzada contra a doença é o boi.

GZM Depois de Santa Catarina qual é o próximo passo do Brasil?

Camargo Neto Nós precisamos ter uma estratégia para colocar ordem no Centro-Oeste. Não podemos aceitar o estado do Paraguai e Bolívia.

GZM A mudança de status sanitário de Santa Catarina pode mudar a legislação brasileira?

Camargo Neto Se temos um estado, podemos ter compartimentos, o que é aceitável pela OIE. No caso dos suínos, a compartimentalização é algo plausível devido ao sistema de integração. Podemos mostrar à OIE que é possível a compartimentalização no Brasil e mudar a nossa legislação atual. A compartimentalização garante que o sistema produtivo está protegido. A granja, o comércio entre elas, o abate, que o fluxo é um compartimento estanque.

GZM E os suínos devem pedir a compartimentalização, assim como as aves estão pleiteando?

Camargo Neto Acho que a gente caminha para isso. Se houvesse a compartimentalização, um foco de aftosa não afetaria o comércio de suínos. É uma questão de querer implantar. Mas acho que é mais fácil nas regiões mais novas que nas tradicionais, pois estão mais distantes de rebanhos bovinos. Talvez para as aves isso seja mais essencial por causa da gripe aviária. No nosso caso, ou o boi põe ordem na casa ou a gente faz o divórcio e parte para a compartimentalização.