Menos de uma semana após audiência pública feita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para discutir restrições às propagandas de alimentos, especialmente as voltadas ao público infantil, a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) anunciou, ontem, um “compromisso público” para inibir a publicidade dirigida a crianças até 12 anos. A iniciativa, que passa a valer em 1º de janeiro de 2010, prevê a proibição de propaganda de alimentos e bebidas em programas nos quais crianças sejam maioria da audiência. Promoções em escolas também não serão permitidas.
O compromisso, no entanto, abre brechas. Segundo a Abia, não haverá punição para quem não seguir o acordo, que foi assinado por 24 associadas. São as próprias fabricantes que vão decidir quais alimentos seguem “critérios nutricionais específicos”, assim como definir que referencial adotaram para esses critérios. Se o produto estiver enquadrado, a propaganda continua. “Alimentos saudáveis, com teores adequados de gordura, sal e açúcares, vão poder anunciar”, diz o presidente da Abia, Edmundo Klotz. É assim, por exemplo, que a Kraft mantém a campanha do biscoito Trakinas e, a Pepsico, a do achocolatado pronto Toddynho.
“Trakinas foi um dos nossos produtos que sofreram mudanças no perfil nutricional”, diz Fabio Acerbi, diretor de assuntos corporativos e governamentais da Kraft. Segundo o presidente da PepsiCo Brasil Alimentos, Otto Von Sotten, o Toddynho é o único produto da companhia que tem um “perfil nutricional” adequado ao público infantil. “Já não anunciamos a linha de salgadinhos, por exemplo”, diz ele, referindo-se à Elma Chips.
Mas outros itens da PepsiCo com apelo infantil, como o achocolatado Mágico, têm sites com jogos no ar. Von Sotten diz que vai rever os sites. A prática é adotada por várias fabricantes, como a Nestlé, que tem o site “Mais Divertido”, com marcas como Passatempo e Moça Fiesta. O acordo proposto pela Abia impede também a comunicação na internet.
A PepsiCo pretende destacar na frente da embalagem os valores nutricionais dos seus mais de 200 produtos. São informações como o percentual de sódio, gordura, açúcar e calorias em relação às necessidades diárias. Medida semelhante já foi adotada pela Mars, dona dos chocolates M&M’S. “As calorias vão estar em destaque na frente do tubo de 30 gramas, que informará no verso o teor de açúcar, algo não exigido pela legislação”, diz Gerson Francisco, diretor da Mars.
Para a Anvisa, a iniciativa da Abia é positiva, mas não descarta a necessidade de regulação. “A indústria reconheceu que a propaganda tem influência negativa no consumo, mas o acordo é muito vago”, diz Maria José Delgado, gerente geral de monitoramento e fiscalização de propaganda do órgão. Na opinião da advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Daniela Trettel, a indústria está reagindo à pressão. “Mas os critérios são muito frágeis e variam de fabricante a fabricante, o que impede um monitoramento por parte da sociedade”.