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Saúde Animal

O bem-estar animal ganha espaço

<p>Criação de animais ao ar-livre gera polêmica entre produtores e ambientalistas.</p>

Aves mantidas em gaiolas de bateria não têm espaço para se mover, apenas para comer e botar ovos.

A preocupação com as condições de vida dos animais está deixando de ser uma discussão isolada na Europa e nos Estados Unidos. Prova disso são as várias medidas que têm sido tomadas para combater práticas de crueldade contra os bichos. No Estado americano da Califórnia, uma proposta que sugeria mudanças na legislação sobre os direitos dos animais de fazenda foi aprovada com mais de 60% dos votos em um referendo no ano passado. A lei proíbe três formas de criação de animais excessivamente cruéis: as baias em que são mantidos filhotes para a produção de carne de vitela; o confinamento de suínas grávidas; e as gaiolas de bateria – espécie de prateleiras onde aves são amontoadas e enfileiradas em um espaço restrito para aumentar a quantidade de ovos.

Com a nova legislação californiana, os animais devem ficar em locais onde possam se virar livremente, levantar-se, deitar e estender o corpo. Os fazendeiros têm até janeiro de 2015 para se adequar completamente. A nova regra não é uma iniciativa inédita no mundo, mas é emblemático que o mais rico dos Estados americanos esteja fazendo essa opção, o que pode incentivar outras regiões dos Estados Unidos a adotar o mesmo código de direitos dos animais. A União Europeia decidiu banir completamente as gaiolas de bateria até 2012, e países como Alemanha, Áustria, Suécia e Suíça já proibiram o seu uso.

A pressão sobre esse tipo de produção de carne nos países ricos é tanta que até empresas de alimentação já estão buscando comprar animais criados de outras formas, como uma estratégia de comprometimento ambiental. A rede de fast-food Burger King comprometeu-se, desde 2007, a usar 2% de ovos de galinhas criadas livres e 10% da carne de porco de animais que não fossem criados com o confinamento de gestantes. O McDonald”s estuda ação semelhante nos EUA, e, na Grã-Bretanha, deve deixar de usar ovos de animais que não sejam criados livres até 2010.

Não são apenas os animais de fazenda que estão recebendo uma atenção maior. Em junho de 2008, o Parlamento espanhol aprovou uma lei que estende direitos humanos básicos aos grandes primatas, o que inclui chimpanzés, orangotangos, gorilas e bonobos, considerados nossos parentes mais próximos no mundo animal. Agora, eles não podem mais ser usados em comerciais de TV nem em espetáculos circenses. Pesquisas científicas com essas espécies já são proibidas na Alemanha, na Áustria, na Holanda, na Nova Zelândia, no Reino Unido e na Suécia.

Mesmo com essas ações, alguns ativistas dos direitos animais e pensadores criticam essa solução, que se importa com o bem-estar dos animais mas aceita que eles continuem sendo mortos – para eles, a única opção seria o veganismo, que exclui o consumo de qualquer produto de origem animal, nem mesmo leite ou ovos. O filósofo australiano Peter Singer, um dos mais respeitados defensores dos direitos animais no mundo, não encoraja esse extremismo. “Eu já acharia ótimo se todas as pessoas se tornassem vegetarianas”, disse. “Mas também é bom se mais países banirem as gaiolas de bateria, porque isso vai poupar milhões de animais de uma existência horrível”. Singer, que é professor das universidades de Princeton, nos Estados Unidos, e Melbourne, na Austrália, já foi indicado como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo pela revista Time, em 2005 Seu livro Libertação Animal, de 1975, teve um papel importante no surgimento do movimento pelos direitos dos animais.

Políticas pró-animais dependem da riqueza do país

Peter Singer, que em seu mais recente livro The life you can save (A vida que você pode salvar, em português) escreve sobre a pobreza mundial, entende que esses passos na direção do bem-estar animal estão ligados ao desenvolvimento dos países. “Preocupar-se com os animais é algo que você só poderá fazer quando tiver seu direito básico garantido”, afirma. “Quando as pessoas estão realmente necessitadas, elas têm que dispor de todas as fontes de alimentação disponíveis”. O filósofo acredita que esse cenário está mudando. “Atualmente a miséria está diminuindo e os países estão ficando mais prósperos.”

Diante desse raciocínio, como o Brasil se enquadra no cenário de políticas de bem-estar dos bichos? Nessa área, ainda temos problemas mais comuns dos países pobres, como o grande número de animais abandonados nas ruas. Em abril, cerca de 1.000 manifestantes se reuniram em São Paulo para protestar contra o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), órgão municipal responsável pelos bichos de rua. Segundo os manifestantes, o CCZ estaria matando animais saudáveis, contrariando uma lei estadual que permite a eutanásia apenas em animais em estado terminal. Como resultado da manifestação, a coordenadora do programa de proteção e bem-estar de cães e gatos da Prefeitura, Rita de Cássia Maria Garcia, disse que a cidade terá um centro de adoção a partir de 2010.

O desrespeito às leis é um dos obstáculos para promover boas condições aos bichos no Brasil. Segundo o promotor de Justiça de São Paulo Laerte Fernando Levai, autor do livro Direito dos Animais, a Constituição Federal e a Lei de Crimes Ambientais são legislações bastante avançadas – o que não significa que essas normas sejam cumpridas. Apesar dos pontos positivos da lei brasileira, Levai acredita que uma parte da legislação é “permissiva de comportamentos cruéis”. Segundo ele, a Lei de Proteção à Fauna, escrita em 1967, “é um código de caça disfarçado”. O promotor também cita a lei que permite a dissecção de animais vivos com o propósito de estudos em instituições de educação e pesquisa como exemplo de uma legislação que é tolerante à crueldade. No Rio de Janeiro, uma lei municipal proibe essa prática, conhecida como vivissecção.