Enquanto o Ministério da Agricultura informa ter decidido alterar as regras do sistema de rastreamento de bovinos (Sisbov) rumo a uma simplificação das exigências feitas pela União Europeia para importar carne brasileira, os exportadores do produto, representados pela Abiec, querem fazer consulta à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra a UE, abordando o que chamam de “discriminação da carne brasileira”.
O diretor-executivo da Abiec, Otávio Cançado, afirma que um pedido do Ministério da Agricultura para flexibilizar o Sisbov foi negado pela Comissão Europeia, por isso o setor decidiu propor ao Itamaraty a abertura de uma consulta na OMC, conhecida como “trade specific concern”, para questionar a decisão da UE de não aceitar a flexibilização, o que elevaria o número de fazendas habilitadas a fornecer animais para abate e e exportação ao bloco.
O secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Inácio Kroetz, porém, nega que o governo tenha solicitado formalmente qualquer alteração nas exigências da UE. “Temos que cumprir a atual regra até mudar o sistema. E não vamos mudar o sistema sem avisar aos importadores”.
De acordo com Kroetz, na próxima semana, um comitê técnico consultivo deve finalizar a proposta para racionalizar o Sisbov, em vigor desde julho de 2006. As novas regras, que devem ficar em consulta pública pelo prazo mínimo de 30 dias, serão comunicadas formalmente à UE para reforçar os pedidos informais do governo brasileiro por alterações no Sisbov.
Cançado, da Abiec, reitera que houve a negativa e diz que se a UE não responder à consulta brasileira, no caso de esta ser concretizada, o setor poderá propor a abertura de painel na OMC, questionando as restrições à carne brasileira.
Segundo o diretor da Abiec, o Brasil deixou de exportar US$ 2 bilhões em carne para a UE em 2008 e 2009 depois que o bloco decidiu limitar o número de fazendas aptas a fornecer animais, exigindo um longo processo de certificação.
Kroetz, que nega já ter havido a consulta à UE, afirma que as principais alterações no sistema serão a revisão da metodologia de verificação, ampliação do gerenciamento da base nacional de dados (BND) do Sisbov e a eliminação de alguns documentos. Pela proposta, a base de dados será única. Não haverá necessidade da duplicidade de registros na propriedade, na certificadora e no escritório regional da agência estadual de defesa. Tudo será centralizado na BND.
Além disso, as auditorias poderão ser feitas por amostragem, e não mais fazenda por fazenda. Os pecuaristas poderão incluir os dados de seu rebanho diretamente no Sisbov. Para gerenciar os dados, os produtores também poderão escolher certificadoras ou profissionais cadastrados e habilitados a operar o Sisbov. O fluxo de documentos, hoje restrito às certificadoras, poderá ser gerenciado diretamente pelo criador.
“As exigências atuais são muitas. Temos que adequar o sistema porque as condições vigentes em 2006 são diferentes da realidade de hoje”, diz Inácio Kroetz. “O sistema tem que ser mais atraente sem perder a segurança e a confiabilidade exigidas pelo mercado”.
Hoje, o Brasil tem 1.704 propriedades habilitadas a vender gado para frigoríficos autorizados a exportar à UE. Outras 126 fazendas aguardam o sinal verde dos europeus. O governo espera que o processo de habilitação passe a ser automático. O Ministério da Agricultura seguiria como auditor e garantidor final do Sisbov. E a UE faria auditorias anuais em todas as pontas do sistema.
O Brasil tem alguns argumentos para convencer a UE a mudar as exigências. O sistema de auditoria brasileiro, treinado pelos próprios veterinários europeus, tem capacidade para realizar quatro mil auditorias anuais, diz o secretário. “Temos 660 auditores capacitados e treinados nos Estados e no ministério”. Em 2008, foram feitas 1.788 auditorias. Neste ano, até outubro, foram 1.650 inspeções nas fazendas. “Ocorre que não há uma demanda muito forte nem represamento de pedidos. O prêmio oferecido ao produtor caiu e o mercado da União Europeia não está remunerando. Também é difícil reunir cortes exigidos para encher um contêiner”, avalia Kroetz.