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Tecnologia para diagnósticos virtuais

<p>Pesquisadores da USP desenvolvem sistema de diagnóstico remoto de parasitas por reconhecimento de imagens.</p>

Redação (19/04/07) – Os métodos clássicos de diagnóstico de parasitas se baseiam primordialmente no isolamento e identificação do organismo através de suas características morfológicas. Mais recentemente, com o advento das técnicas de biologia molecular, o diagnóstico parasitológico também pode ser feito mediante a amplificação de alvos específicos do DNA desses organismos. Em ambas as metodologias, a identificação precisa pode requerer a presença de um profissional altamente especializado, com experiência em diagnóstico morfológico no primeiro caso, ou de técnicas de purificação e amplificação de DNA no segundo. Isso significa que amostras biológicas de diferentes locais devem ser enviadas a laboratórios de referência de diagnóstico, o que implica em custos e tempo de transporte de um lado, e potenciais riscos sanitários de outro.

Baseados nessa realidade, dois grupos de pesquisa da Universidade de São Paulo (USP) decidiram juntar esforços para criar um novo conceito de diagnóstico, baseado na identificação de parasitas por reconhecimento de formas a partir de imagens digitais. Arthur Gruber é professor do Departamento de Parasitologia do ICB, e trabalha há mais de 10 anos com parasitas do gênero Eimeria, agentes patogênicos que causam grandes prejuízos na produção animal, especialmente na avicultura. Luciano da Fontoura Costa, do Instituto de Física de São Carlos, lidera um grupo de pesquisa em visão cibernética. Ambos os professores se conheceram através do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Bioinformática da USP, do qual foram fundadores e são orientadores credenciados. Através da orientação conjunta do estudante de Doutorado César Armando Beltrán Castaón, foi possível desenvolver o sistema COCCIMORPH, uma plataforma de diagnóstico automático de parasitas através do reconhecimento de padrões de imagens de parasitas.

A utilização de algoritmos computacionais para a análise e reconhecimento de formas tem sido grandemente utilizada em várias aplicações, como a identificação de impressões digitais e faces humanas. Contudo, a aplicação totalmente integrada e automatizada dessa tecnologia para o diagnóstico remoto de agentes patogênicos, é totalmente inédita no mundo e representa um novo paradigma na área de diagnóstico de parasitas.  Em virtude desse ineditismo, um artigo científico do grupo, descrevendo o sistema COCCIMORPH, acaba de ser publicado no mais importante periódico científico da área de reconhecimento de padrões, a revista Pattern Recognition.

Diagnóstico virtual

Comparado com outras abordagens de diagnóstico, o sistema desenvolvido não requer pessoal treinado na identificação de parasitas ou em técnicas de biologia molecular. Além disso, como o sistema pode funcionar de forma remota, através da submissão de imagens via uma interface web, não há necessidade de se realizar o transporte físico de amostras biológicas entre a granjas e o laboratório de referência. Esse é um aspecto particularmente importante, uma vez que o transporte de amostras vivas representa um potencial risco sanitário devido à possibilidade de disseminação de doenças. Assim, granjas localizadas em áreas com surtos de doenças controladas poderiam enviar amostras digitais para laboratórios de referência, sem o risco de espalhar essas doenças em regiões livres das mesmas. Outra grande vantagem dessa abordagem é que o diagnóstico é obtido em tempo real, o que possibilita uma tomada de decisão rápida por parte do usuário.

Embora os autores não preconizam a substituição das formas convencionais de diagnóstico, essa abordagem certamente pode representar uma poderosa ferramenta de auxílio para o diagnóstico, especialmente em regiões mais carentes de profissionais habilitados. O envio de imagens microscópicas de tecidos e microrganismos para laboratórios de referência, usando-se o sistema de e-mail não é nova, e tem permitido que especialistas possam analisar e diagnosticar com precisão amostras enviadas de locais remotos. Contudo, nesse tipo de análise, a interferência humana no processo ainda é fundamental, e a resposta varia em função da disponibilidade desses profissionais. No sistema preconizado por Gruber e Fontoura Costa, as imagens são enviadas mediante uma interface web, processadas em tempo real, e o resultado diagnóstico é fornecido em questão de segundos, sem necessidade de interferência humana. O sistema foi inicialmente padronizado para o diagnóstico das sete espécies de Eimeria que infectam a galinha doméstica e, mais recentemente, estendido para as onze espécies que infectam o coelho. Essa abordagem poderá no futuro ser aplicada para o diagnóstico de outros gêneros de parasitas, incluindo parasitas de interesse médico.

A taxa média de acerto do programa para a diferenciação das sete espécies de Eimeria de galinha é de cerca de 85% para cada imagem individual, valor bastante aceitável para um diagnóstico baseado em morfologia. Contudo, o envio de um conjunto de imagens de cada amostra biológica pode contribuir para aumentar a confiabilidade do resultado. Atualmente, com a colaboração do Prof. Carlos Alberto de Bragança Pereira (IME-USP), especialista em Estatística, os pesquisadores estão desenvolvendo métodos para gerar resultados diagnósticos na forma de probabilidades. Isso significa que, ao invés de o sistema simplesmente emitir um diagnóstico de uma espécie do parasita, será fornecida uma lista de probabilidades de diagnóstico para cada uma das espécies. A grande vantagem desse tipo de relatório é que, em casos duvidosos, também denominados “borderline” ou fronteiriços, o sistema indicará qual ou quais espécies alternativas devem ser consideradas pelo profissional.

Além do artigo já publicado na Pattern Recognition, um outro com enfoque mais biológico está sendo enviado para um periódico científico na área de parasitologia. Além disso, o trabalho está sendo continuado, agora em estudos filogenéticos (relações evolutivas entre os organismos). Para isso, os pesquisadores pretendem comparar reconstruções filogenéticas obtidas com o uso de marcadores moleculares, utilizando seqüências de determinados genes, com filogenias determinadas com os mesmos marcadores morfológicos utilizados no sistema de diagnóstico COCCIMORPH. O artigo que descreve o COCCIMORPH pode ser acessado no endereço http://dx.doi.org/10.1016/j.patcog.2006.12.006. O sistema COCCIMORPH está disponível para uso público na página http://puma.icb.usp.br/coccimorph/. Os usuários podem seguir um tutorial com imagens exemplo fornecidas pelos autores, ou enviar suas próprias imagens para diagnóstico.