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Gripe H1N1

Velho conhecido?

De acordo com estudo internacional, vírus da nova gripe pode estar circulando há anos no mundo.

O primeiro retrato molecular detalhado do vírus da nova gripe acaba de ser publicado online e pode tanto assustar quando trazer certo alívio, dependendo de como os dados são examinados. Uma equipe internacional capitaneada por Rebecca J. Garten, dos CDCs (Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA), estudou dezenas de amostras da nova versão do vírus H1N1 e mostrou que ele pode ter passado por anos de evolução e multiplicação silenciosa antes do surto deste ano. Por outro lado, a análise confirma que, ao menos por enquanto, ele não tem as características necessárias para virar um assassino planetário.

O artigo científico descrevendo a análise foi liberado para a imprensa nesta sexta (22) pela revista especializada americana “Science”. Trata-se de um procedimento inusitado para a prestigiosa revista, que normalmente dá aos jornalistas uma semana para avaliar as pesquisas originais, que ficam sob embargo. A “Science” justifica a exceção pelo grande interesse público e pela urgência de divulgar os dados.

Os pesquisadores explicam que era um bocado natural esperar que vírus de origem suína acabassem causando problemas como uma pandemia iminente. Os vírus da gripe circulam o tempo todo entre aves selvagens, aves domésticas, porcos e humanos.

Nas últimas décadas, as formas de gripe circulando entre pessoas no planeta começaram a se distanciar geneticamente dos chamados vírus “clássicos” H1N1 presentes em porcos, que permaneceram mais ou menos “parados” em termos evolutivos, em especial no que diz respeito às características que levam à reação do sistema de defesa do organismo. Na prática, isso significa uma diminuição da imunidade das pessoas aos vírus vindos de porcos.

Oito pedaços

Vírus estão entre as criaturas mais simples do planeta. Por isso, é relativamente fácil entender a estrutura genética do H1N1. Pense num feixe de oito “palitos” (na verdade, fitas de RNA, molécula “prima” do DNA), que correspondem a 11 genes diferentes (em vez das dezenas de milhares em humanos).  Esse material genético enxuto contém tudo o que o vírus precisa para invadir células de animais e se multiplicar. E é com base nesses oito “palitos” ou segmentos que os cientistas conseguiram pistas sobre a origem da atual cepa.

Analisando sete amostras virais vindas do México e 44 oriundas de 13 estados dos EUA, eles determinaram que, dos oito segmentos que compõem o vírus, dois derivam de um ancestral que circula entre porcos da Europa e da Ásia, enquanto os outros seis são de vírus suínos detectados antes na América do Norte e na Ásia. Esses últimos vírus já eram resultado do chamado rearranjo triplo: a mistura de uma forma humana, outra suína “clássica” e outra oriunda de aves. O grau de “mestiçagem”, portanto, é considerável.

“Os detalhes sobre os hospedeiros nos quais esses vírus circularam, bem como os eventos de rearranjo que levaram ao surgimento do novo vírus, são desconhecidos. Mas a relativa falta de vigilância sobre os vírus suínos, e o fato de que o gene ancestral mais próximo para os oito segmentos é sempre de origem suína, sugere que esse vírus pode ter circulado por criações de porcos sem ser detectado em algum lugar do mundo”, escrevem os pesquisadores.

Outra pista sobre isso vem da comparação da atual cepa com vírus de gripe já conhecidos. Curiosamente, a maior semelhança aparece quando a comparação é feita com vírus isolados… há dez anos, em média. No entanto, mesmo nesses casos o parentesco é relativamente distante, o que sugere um período de evolução silenciosa antes que o atual vírus fosse detectado pela primeira vez.

Baixa diversidade

A análise também indica que há baixa variabilidade genética entre os vírus, ao menos por enquanto: é como se todos ainda fossem quase “irmãos gêmeos”. Para os cientistas, isso sugere que todos os membros da atual cepa descendem de uma única infecção em humanos, ou então de infecções múltiplas causadas por vírus praticamente idênticos entre si.

Mas a verdadeira boa notícia vem do fato de que não há sinais, ao menos por enquanto, de que o atual H1N1 seja transmitido com alta velocidade ou produza mortalidade aumentada em suas vítimas. Quando comparado a vírus conhecidos, ele não possui marcas genéticas de alta transmissão ou de letalidade. Nesses pontos, ele é muito parecido com o vírus “clássico” presente em porcos. Porém, isso deixa no ar um mistério: ainda não se sabe, então, como o vírus está tendo sucesso em se espalhar pela população humana.  

Análise crítica

A pedido do G1, o biólogo Atila Iamarino, da USP, que faz doutorado sobre a evolução de vírus como o HIV e edita o blog Rainha Vermelha , comentou o estudo.

“Devemos dar crédito ao artigo por mostrar de onde vêm os pedaços do vírus e a presença de características importantes, como a ausência de mutações associadas à virulência. Mas ainda carecemos entender a dinâmica do vírus, se veio do porco ou apareceu direto em humanos, o crescimento dele, se foi rápido ou não e como se espalhou. Tudo isso faria diferença se esse vírus fosse agressivo.”

Iamarino disse que, nesse ponto, a pesquisa seria realmente crucial se fizesse

“uma análise do tamanho de população do vírus, através das sequências [genéticas]. Assim teríamos uma estimativa melhor do número de infectados e do tempo em que o vírus circula, com mais precisão”.