O status do Brasil como “país de risco insignificante” para a doença de “vaca louca” será examinado em fevereiro pela comissão científica da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), no rastro do caso identificado no Paraná.
Foi o que revelou ontem o diretor-geral da OIE, Bernard Vallat, em entrevista ao Valor. Ele disse que, pelas normas sanitárias atuais, “não é em razão de um único caso que o Brasil perderia seu status”, o melhor possível em relação à encefalopatia espongiforme bovina (BSE, na sigla em inglês), nome científico do mal.
Mas, prudente, Vallat notou que “os cientistas tomam as decisões de maneira independente”. A reunião já estava prevista antes do caso brasileiro, confirmado pelo Ministério da Agricultura no dia 7.
Contrariando as autoridades brasileiras, que classificam a ocorrência do Paraná como “atípica”, o diretor da OIE afirmou que ainda aguarda o resultado final dos exames realizados no laboratório Weybridge, na Inglaterra, de referência mundial, para confirmar a informação (ver Contexto ao lado).
Também na contramão de declarações de técnicos brasileiros, Vallat disse que há “pouquíssimos casos atípicos de BSE”. Esclareceu que a OIE tampouco faz a diferença, oficialmente, entre “atípico” e “clássico” (mais perigoso para a contaminação da cadeia alimentar).
“Pensamos que a proteína atípica pode aparecer espontaneamente nos animais muito velhos, mas isso ainda não é confirmado por todos os cientistas. É um debate científico em aberto’, afirmou.
Vallat insistiu, em todo caso, que não há risco de se consumir carne vermelha mesmo quando um país é atacado pelo mal. Há riscos no consumo de alguns órgãos, mas não no caso do músculo.
Quanto ao debate sobre o atraso do Brasil em apresentar os testes sobre o caso, Vallat foi claro: “É verdade que o Brasil teve um problema de logística. Mas, se o Brasil queria esconder alguma coisa, o atraso não teve interferência. O Brasil declarou o caso e é isso que interessa”.
Para o diretor da OIE, os países importadores deveriam retomar as compras “o mais breve possível” depois que o Brasil der todas as informações para tranquilizar os compradores de sua carne bovina.
Vallat considerou normal a decisão de alguns importadores de suspender a importação, já que a BSE provoca medo. Mas insistiu que, depois de obterem as informações pedidas, “devem respeitar as normas internacionais e reabrir o mercado”.
Fundada em 1924, a Organização Mundial de Saúde Animal é sediada em Paris. A adesão é voluntária e suas normas servem de referência para os serviços sanitários dos governos dos 176 países membros.
Mas o peso da entidade é grande e quem não a segue pode ficar fora do mercado. Embora as normas não sejam obrigatórias, “normas de saúde animal” são utilizadas pela Organização Mundial do Comércio (OMC) para regulamentar as trocas internacionais. Ou seja, as normas de saúde animal (mas não de bem estar animal) da OIE, se desrespeitadas, podem servir para um país acusar o outro de barreiras diante dos juízes da OMC.
A OIE tem outra particularidade, que é realizar amplas pesquisas no segmento veterinário. O Brasil mesmo tem interesse em financiar alguns desses projetos.
Uma delegação brasileira voltará nesta sexta-feira a entidade, em Paris, para discutir de novo o caso da “vaca louca” do Paraná, que arrisca afetar exportações de carne bovina, que já alcançaram cerca de US$ 4 bilhões entre janeiro-setembro.
Ontem, a delegação apresentou a representantes de cerca de 20 países, na missão brasileira, respostas a várias perguntas de países importadores. Pelo menos do lado brasileiro, a impressão foi positiva. Nenhum país falou em restringir mais as importações pelo momento.