O uso consciente de antibióticos é uma das mais importantes discussões que irão impactar a produção mundial de carnes nos próximos 10 anos. Tão relevante quanto os temas do bem-estar animal e do aumento dos consumidores adeptos de uma alimentação sem proteína animal – os veganos –, a prática de ministrar antibióticos, sobretudo as moléculas que são compartilhadas entre o uso veterinário e o humano, poderá ser a grande barreira para o crescimento do setor de proteínas nas próximas décadas. Aqui a questão não é de ser contra ou a favor do uso de tais produtos, e sim da ameaça à saúde humana devido ao aparecimento cada vez mais frequente de resistência bacteriana e também dos riscos envolvidos com o negócio de produção animal.
O uso das mesmas moléculas tanto em saúde humana quanto para uso veterinário se transformou em uma das hipóteses para explicar o recente fenômeno das “superbactérias”, que ganharam resistência à algumas drogas. Segundo pesquisadores, o abuso ou uso indevido destes medicamentos aumenta o desenvolvimento de bactérias resistentes. De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CCPD) dos EUA, todos os anos, mais de dois milhões de americanos contraem infecções bacterianas resistentes a antibióticos, que causam a morte de pelo menos 23 mil deles.
Sobre o assunto, a OMS lançou nesta semana uma campanha global por meio da Semana Mundial de Conscientização sobre os Antibióticos. O objetivo da iniciativa é melhorar o entendimento do problema e mudar a forma como os antibióticos são utilizados. Na pecuária, o tema tem recebido forte pressão de grupos de consumidores. Líderes do setor de saúde pública consideram isso uma crise mundial e atribuem a culpa, em parte, à utilização generalizada de remédios pela indústria da carne.
A BBC News também divulgou nesta quinta-feira (19/11) importante matéria sobre o assunto. Um estudo divulgado na revista científica Lancet – uma das mais importantes publicações científicas na área médica –, identificou, em pacientes e animais na China, bactérias que resistem à polimixina, também conhecida como colistina. A pesquisa detectou um gene que torna bactérias infecciosas, como a E.coli, altamente resistentes à “última linha de defesa humana” contra esses organismos. A mutação genética denominada gene MCR-1, permite às bactérias se tornarem altamente resistentes à polimixina, antibiótico geralmente usado como último recurso no caso de ineficácia de medicamentos. Segundo a matéria, “o mundo está no limiar de uma ‘era pós-antibiótico’, após a descoberta dessas bactérias”.
Numa reposta a essas preocupações, o McDonald´s foi o primeiro a anunciar uma nova política. No primeiro trimestre desse ano, a rede americana de fast-food informou que não venderá mais nos EUA produtos com carne de frango tratado com antibióticos de uso humano. Apesar da decisão entrar em vigor a partir de 2017, gerou um efeito cascata junto aos grandes fornecedores de frango no país. A Tyson Foods e a Pilgrim´s Pride também declararam a eliminação gradual desses medicamentos.
Já a rede americana de fast-food Subway – que no Brasil ultrapassou o McDonald’s em número de unidades com 1.817 estabelecimentos no país –, informou que iniciaria um processo de transição para servir em seus cardápios apenas produtos com frango produzidos sem antibióticos até o final de 2016. A empresa informou que pretende ainda eliminar antibióticos completamente da carne de peru em 2 a 3 anos, e das carnes suína e bovina até 2025.
O aumento das preocupações com a saúde, sobretudo a partir da ingestão de alimentos, aliado à massificação da informação e agravado pelo ativismo de grupos que se aproveitam de divulgações de dados sérios para, de forma contestável, defenderem suas causas, transformam assuntos altamente importantes à saúde humana e à produção animal em verdadeiros fatores de risco à indústria mundial da alimentação.