Em um artigo publicado na revista Science Advances, pesquisadores da Vanderbilt University Medical Center, em Nashville, nos EUA, apresentaram um novo método para aumentar a viabilidade do transplante de pulmão. Ao conectar o sistema circulatório de um porco vivo aos pulmões doados, com o auxílio de um imunossupressor encontrado no veneno da cobra naja, conseguiram quadruplicar o tempo de preservação do órgão fora do corpo humano.
Flávio Galvão, cirurgião, pesquisador e professor associado ao Departamento de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) da USP, enfatiza que o transplante de pulmão é um procedimento delicado, com uma janela de apenas seis horas entre a remoção e o transplante, exigindo agilidade dos profissionais de saúde. Ele destaca que a pesquisa fez uma descoberta interessante, observando que, após um dia, os pulmões ainda estavam muito bem preservados.
Embora não tenha participado da pesquisa, Galvão explica que o estudo internacional buscou criar um novo sistema de perfusão. Atualmente, uma máquina simula a circulação humana, auxiliando na preservação dos órgãos removidos dos doadores, mas ele aponta que essa máquina é grande, pesada e encarece o transplante, sendo pouco utilizada nesse processo.
Ao utilizar o sistema circulatório de um suíno vivo em vez da máquina, os pesquisadores conseguiram desenvolver um método potencialmente mais flexível e econômico. No entanto, um dos maiores desafios enfrentados foi a rejeição hiperaguda, um processo que leva à rápida degeneração dos órgãos e ocorre quando animais muito diferentes são transplantados.
O destaque do novo artigo, segundo o especialista, foi a maneira como os pesquisadores contornaram esse problema. Diversos imunossupressores, incluindo uma substância encontrada no veneno da cobra naja, foram utilizados para evitar a degeneração do pulmão. O veneno da cobra interfere no sistema imunológico do corpo, evitando assim a rejeição hiperaguda.
O estudo faz parte do campo de pesquisa dedicado ao xenotransplante, que envolve transplantes de órgãos e tecidos de animais em seres humanos. Embora os procedimentos ainda estejam em fase experimental, teoricamente podem agilizar significativamente os transplantes de órgãos. No entanto, Galvão destaca os problemas éticos e de segurança, incluindo a possibilidade de o porco causar uma pandemia decorrente de viroses ligadas à sua própria genética.
Apesar dos avanços na pesquisa, o professor conclui que a doação de órgãos ainda é a única alternativa viável para salvar a vida dos pacientes que aguardam um transplante, enfatizando a carência de doadores como um dos maiores desafios nesse processo.
Fonte: Jornal USP