No mundo invisível aos nossos olhos, os microrganismos travam intensas batalhas. Bactérias, vírus e parasitas, que antes eram controlados pela ação medicamentosa, agora se mostram grandes adversários, desafiando a eficácia dos tratamentos e demonstrando maior resistência. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a capacidade desses microrganismos se adaptarem quando expostos a antimicrobianos, tornando esses medicamentos menos eficazes, denomina-se resistência antimicrobiana (AMR, do inglês Antimicrobial Resistance).
De acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (Centers for Disease Control and Prevention – CDC) dos Estados Unidos, ocorrem mais de 2,8 milhões de infecções resistentes a antibióticos no país a cada ano, resultando em mais de 35 mil mortes. Na União Europeia, a AMR é responsável por cerca de 33 mil mortes anuais, com custo estimado de 1,5 bilhão de euros em despesas com saúde e perda de produtividade. O cenário reflete o impacto da resistência antimicrobiana como problema de saúde pública global, sendo abordada pela OMS como uma questão central em sua estratégia de “Saúde Única”, a qual considera a interdependência entre a saúde de seres humanos, animais e meio ambiente.
A disseminação da resistência antimicrobiana é multifatorial incluindo o uso inadequado de antimicrobianos em humanos e animais, a automedicação, o descarte inadequado de medicamentos e o uso excessivo de antimicrobianos na produção. Ao longo dos últimos anos, esse tema vem ganhando destaque também na agenda nacional, culminando no Plano de Ação Nacional para Prevenção e Controle da Resistência aos Antimicrobianos no Âmbito da Saúde Única – PAN-BR.
PAN-BR AGRO: uma rota de esperança
O PAN-BR AGRO, ou Plano de Ação Nacional de Prevenção e Controle da Resistência aos Antimicrobianos no âmbito da Agropecuária, foi desenvolvido como parte do PAN-BR, buscando construir uma resposta coordenada para enfrentar a resistência antimicrobiana no Brasil. A primeira etapa, que ocorreu entre 2018 e 2022, mostrou-se promissora, alcançando avanços significativos.
“Para saber as perspectivas futuras, é necessário conhecer a situação atual”, afirma a auditora fiscal federal agropecuária Mirela Janice Eidt. “Por isso, um dos principais avanços obtidos durante a 1ª Etapa do PAN-BR AGRO foi a elaboração e a implementação do Programa de Vigilância e Monitoramento da Resistência aos Antimicrobianos no âmbito da agropecuária, para que tenhamos um diagnóstico situacional que defina as estratégias a serem adotadas e a tomada de decisão Mirela destaca que o Programa representou um marco ao fornecer dados cruciais sobre a resistência antimicrobiana em alimentos de origem animal, subsidiando o desenvolvimento de políticas e ações de prevenção.
Dentre as ações da primeira etapa, Mirela enfatiza a relevância dos Guias de Uso Racional de Antimicrobianos para Cães e Gatos, e para a Avicultura de Postura. “Esses guias capacitaram profissionais e produtores para a aplicação mais consciente e responsável desses medicamentos”. Além disso, destaca as parcerias com instituições públicas e privadas, a participação em eventos nacionais e internacionais, e a promoção de ações durante a Semana Mundial de Conscientização sobre o Uso de Antimicrobianos.
A 2ª Etapa do PAN-BR AGRO (2º quinquênio de 2023-2027) buscará continuar harmonizando as políticas públicas nacionais com as recomendações e exigências internacionais sobre resistência antimicrobiana, promovendo o fortalecimento das relações institucionais com os principais atores públicos e privados, sempre considerando o conceito de Saúde Única.
“A conscientização é essencial”, ressalta Mirela, “por isso a segunda etapa concentrará esforços em estratégias de comunicação e educação em saúde, visando aumentar a conscientização sobre a resistência antimicrobiana entre profissionais de saúde, gestores na área, setor regulado e sociedade em geral”. Ela destaca ainda que a formação e a capacitação de profissionais e gestores na área de saúde animal serão aprimoradas para proporcionar uma prestação de assistência técnica mais qualificada, beneficiando os produtores brasileiros com o acesso a profissionais mais capacitados.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) fomentará a adoção de boas práticas agropecuárias para reduzir a necessidade do uso de antimicrobianos, enquanto o conhecimento científico sobre resistência antimicrobiana será fortalecido e ampliado por meio de vigilância e pesquisa. As principais ações específicas da 2ª Etapa do PAN-BR AGRO estão alinhadas a cinco objetivos estratégicos, refletindo o compromisso em enfrentar o desafio da resistência antimicrobiana e garantir a saúde humana, animal e a sustentabilidade do sistema de saúde global.