Depois da Operação Carne Fraca, em 2017, quando os players frigoríficos foram flagrados adulterando produtos que chegavam ao mercado, sob suspeição também sobre a fiscalização federal, o autocontrole por parte das empresas agropecuárias ganhou mais força e chegou ao programa de governo levado pela ministra Tereza Cristina.
Partiu-se do princípio de que esse modelo de transferência total da responsabilização para as empresas, mesmo que não substitua as legislações vigentes das cadeias produtivas, as deixam mais cientes no acompanhamento sistemático dos possíveis gargalos em suas operações e do grau de consequência e problemas que geram quando não debelados. Para consumidores e seus caixas.
A Carne Fraca, por exemplo, levou a milhões de prejuízos às exportações brasileiras com os problemas gerados em unidades da JBS (JBSS3) e BRF (BRFS3), além de outros grupos menores.
Nesta segunda (14), a Câmara Federal promove audiência pública para discutir o Projeto de Lei 1293/21, que o Executivo tenta transformar em lei a partir de estudos e da defesa do autocontrole que o ex-secretário de Defesa Agropecuária (em duas ocasiões), Ênio Marques, coordenou no programa do então candidatado Jair Bolsonaro. E foi levado já no governo também com apoio do Instituto Pensar Agro (IPA), ligado à Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).
“O autocontrole não substitui as respectivas legislações vigentes e traz muitas vantagens para a indústria que o pratica, em especial por identificar, precocemente, possíveis desvios nas especificações previamente definidas”, comentou Marques a Money Times.
Bastante respeitado pelo mercado e tendo sido negociador brasileiro em várias pendências sanitárias que o Brasil já viveu com compradores internacionais, o médico veterinário não vê necessidade de a fiscalização tradicional, por auditores, por exemplo, ser feita nas corporações que têm meios de se auto monitorar.
Como várias passaram a fazer depois da Carne Fraca.
Adequações
Ele reconhece que o Brasil está longe de contar com empresas que tenham essas condições, por exigir treinamento e, até mesmo, a contratação de especialistas, mas para essas poderia haver um prazo maior de adequação. E seguiriam sendo fiscalizadas normalmente, “como hoje já o são”.
Essa prática já é adotada em larga escala nos países desenvolvidos e, na sua opinião, também é uma maneira de forçar os setores produtivos a se preocuparem em perseguir a boa imagem e reputação.
Além disso, “a probabilidade de um produto não conforme ir ao mercado é insignificante e, caso vá, a empresa substitui o produto defeituoso”, explica Ênio Marques, que foi assessor do então ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, hoje na secretária-geral da Presidência da República.
Em nota escrita por Ênio Marques, assim que a ministra Tereza Cristina, do Mapa, começou a falar no assunto na primeira reunião sobre a pauta, e reiterada agora, ele recorda que o autocontrole é obrigação antiga originária de Lei de Defesa dos Consumidores. Também compromisso internacional brasileiro na Rodada Uruguai do GATT, aprovado pelo Congresso e sancionado pela presidência da República em 1994.
E completa, destacando que a pressão a favor desse critério foi mais forte desde os anos de 1980, quando problemas sanitários se multiplicavam inclusive em nações desenvolvidas: “Para mudar a percepção dos consumidores houve-se por bem usar a ciência, em acordos e legislações abrangentes, com ações em todos os agentes ao longo das cadeias das fazendas as mesas dos consumidores.”.