Segundo os dados disponibilizados, o aumento nos preços nos últimos 12 meses no mercado interno até a semana passada foi: arroz (22,59%), feijão (155,24%), trigo (61,46%), soja (40,79%) e milho (36,92%). Já no mercado internacional foi: arroz (143,8%), trigo (86,64%), soja (65,26%) e milho (62,84%). O feijão não é negociado internacionalmente. Os valores dizem respeito às principais praças onde essas commodities são negociadas.
Esse cenário não significa que o Brasil digeriu bem o impacto do aumento dos preços, mas sim que os repasses ainda não terminaram de serem feitos no mercado doméstico. "Somos tomadores de preços no mercado internacional, então o que acontece lá fora reflete no mercado interno", diz Paulo Morceli, superintende de gestão de oferta (Conab).
Os números apresentados pela Conab para a safra 2007/2008 de grãos são animadores e mostram aumento de produção e produtividade para as cinco commodities pesquisadas, mas o reflexo desses números só deverá ser sentido no segundo semestre. "Com a colheita dessa safra (2007/2008) o que se pode esperar é uma acomodação dos preços dos produtos agrícolas, sem acelerações como as observadas nos primeiros meses do ano", avalia. Morceli.
Assalariado sofre mais
Segundo o novo Índice de Preços ao Consumidor-Classe 1 (IPC-C), calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), com base nas despesas de consumo das famílias com renda de 1 a 2,5 salários mínimos mensais (s.m), o peso do grupo Alimentação é o que apresenta o maior aumento de ponderação, quando se restringe a faixa de renda. "Enquanto para a população objetivo do IPC-BR o peso do gasto com alimentação é de 27,49%, na faixa de 1 a 2,5 s.m. a proporção sobe a 39,62%", afirma o relatório.
Reação da indústria
Por hora, após a indústria alimentícia sentir o peso do aumento internacional nos preços das commodities agrícolas, chegou a vez do consumidor brasileiro sofrer de perto os efeitos dessa nova tendência mundial. Ontem, como havia antecipado o DCI, três entidades de diferentes nichos do setor de alimentos já se manifestaram quanto aos repasses que se intensificaram no mês de abril, e devem continuar durante todo o primeiro trimestre: Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (Abip), Associação Brasileira das Indústrias de Massas Alimentícias (Abima) e Associação Nacional das Indústrias de Biscoito (Anib).
De acordo com representantes das três associações a partir deste mês, devido às pressões provocadas pelo aumento dos custos dos insumos, os preços de biscoitos e massas alimentícias sofrerão um reajuste de 10 a 15%. Nos últimos 12 meses encerrados em março os dois segmentos já acumulavam uma alta de 21% e 25%, respectivamente.
Além da farinha de trigo, que participa do reajuste dos preços em 30%, outros produtos agrícolas também forçaram esta reavaliação dos preços dos biscoitos e massas como a soja que resultou num incremento de 35% no valor da gordura hidrogenada e o cacau que participa com 15%.
De acordo com Cláudio Zanão, presidente da Abima, a farinha representa 70% do custo das massas e esse é o principal motivo para que no primeiro trimestre os preços desses produtos aumentaram 15% e no próximo trimestre irão aumentar pelo menos mais 15%. "Vamos ter novas altas ao longo do mês de abril e novos reajustes até junho", afirma.
Ele ressaltou, no entanto, que no segundo semestre com a entrada das safras brasileira e norte-americana essa aceleração poderá ser refreada.
José dos Santos Reis, presidente da Anib, explica que a indústria do segmento adquire a farinha de trigo mensalmente não tendo tempo para manter longas negociações o que pode resultar em acordos nem sempre vantajosos. "Não há como ter a estratégia de comprar antecipadamente porque nesse momento o moinho não quer contratos longos, eles honram as programações e em seguida determinam novos preços", afirma.
Reis destaca ainda que no caso da indústria dos biscoitos a crise que é momentânea pode se estender por mais tempo já que quando há aceleração nos preços o consumidor deixa de comprar o produto. "Pelo menos 8% de aumento não vamos repassar, vamos segurar porque senão a gente pode perder o consumidor ou o supermercado deixa de negociar com a gente". "Na queda de braço entre indústria de alimentos e varejo os supermercados estão se dando melhor", acrescenta.
Pão terá novas altas
Anunciando o maior aumento para o mês de abril, 12%, Alexandre Pereira da Silva, presidente da Abip, acredita que o aumento no preço será diretamente proporcional à queda no consumo. "A padaria está na ponta do consumo, temos impacto direto". Os dados do último Índice de Preços ao Consumidor – Semanal (IPC-S), divulgados pela FGV, mostra que o aumento nos preços dos panificados e biscoitos foi de 2,86% para 4,11% entre os dias sete e quinze de abril. O pão francês sozinho variou de 4,05% para 6,20%.
Silva destaca que a crise da panificação é mais grave ainda na Região Nordeste porque é onde se paga a farinha mais cara – hoje a saca de 50 quilos chega a R$ 120 enquanto a saca no Sudeste está em, em média R$ 95 – e, em função do poder aquisitivo, o pão é mais barato.
O quadro se agrava pelo fato do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) na região ser 37%. "É um absurdo a arrecadação de um estado dobrar em cima da crise de um único setor".
A Associação Brasileira da Indústria do Trigo, que por sua vez irá se reunir na próxima quarta-feira, 23, com a Comissão Bilateral Brasil-Argentina, em Buenos Aires, mantém sua pressão sobre o governo federal para que este aprove a isenção da Tarifa Externa Comum (TEC) para a importação de mais 3,5 milhões de toneladas de trigo, suspensão do Frete Adicional para Recuperação da Marinha Mercante (AFRMM) e desoneração do ICMS sobre o trigo e seus derivados, imposto que pode representar até 36% do custo do produto final, segundo a entidade.