Redação (26/06/2008)- As exportações de carne da Argentina foram as mais afetadas pelo protesto dos produtores agropecuários, que pararam o país durante 101 dias, de março até o dia 20 deste mês. As vendas de carnes frescas caíram quase 75%, de 18,7 mil toneladas em março para 4,8 mil em maio, segundo dados do Serviço Nacional de Qualidade e Sanidade Agroalimentar (Senasa), órgão ligado à Secretaria da Agricultura, divulgados ontem. No mesmo período, as exportações de carne processada baixaram de 1,8 mil para apenas 294 toneladas.
Em contrapartida, a perda de receitas em dólares foi proporcionalmente menor, com uma queda de 50% no período, já que os preços internacionais da carne continuaram em alta. Somando o que o país faturou com a venda de carnes frescas, processadas, Cota Hilton e miúdos, principais itens da pauta de exportações de carne bovina, foram US$ 67 milhões em maio, comparado a US$ 133 milhões em março.
O protesto dos agricultores paralisou as estradas e impediu o transporte dos produtos até os portos. Porém, aos protestos se somaram as restrições do governo à exportação de carnes. Além do limite de cotas para vendas ao exterior, atualmente em 55 mil toneladas mensais, há meses as autoridades responsáveis pela liberação de registros de exportação tornaram o processo mais difícil e demorado.
O governo começou a restringir as exportações de carne bovina em 2005, com o objetivo de garantir o abastecimento interno do produto e forçar a queda dos preços. A carne é prato básico da alimentação dos argentinos, que lideram o ranking de consumo mundial do produto, cerca de 70 kg por habitante/ano.
As intervenções governamentais não se restringem às exportações, mas estendem-se aos preços que são controlados para uma lista de 13 cortes mais populares. Para o economista Tulio Ceconi, pesquisador do Instituto de Estudos da Realidade Argentina e Latinoamericana (Ieral), especialista no mercado de carne, as intervenções oficiais têm se mostrado prejudiciais à produção e não tiveram o efeito esperado. O motivo, diz, é que há uma enorme informalidade no setor de carne bovina argentino que impede a quantificação exata da oferta e o controle da cadeia de produção e comercialização.
Um estudo realizado por ele e as pesquisadoras Jorgelina Ceconi, Adriana Castro e Virginia Cecarelli, intitulado "Efeitos das Políticas Públicas Sobre o Mercado de Carne Bovina", mostra que as intervenções oficiais provocaram um recuo de 22% das exportações do período 2006 e 2007, comparado com o período 2004/2005 (veja gráfico). A Argentina vinha exportando uma média de 700 mil toneladas em 2004 e 2005, praticamente o dobro da média exportada nos 12 anos anteriores. Em média, entre 2006 e 2007 a exportação caiu para 552 mil toneladas, ainda assim 53,4% mais que no período compreendido entre 1991-2003. Nos anos 90, a Argentina exportava em media 13,4% de sua produção. Entre 2004 e 2005 essa participação subiu para 22,75%, mas depois das restrições caiu para 18%.
O estudo também chama a atenção para o aumento do abate de vacas, sugerindo que seja resultado do desestímulo ao investimento pela falta de uma política governamental clara para o setor. Nos últimos dez anos o abate de fêmeas passou de 42% para 50% do total abatido. "Um abate entre 20% e 25% de vacas é considerado reposição, que é quando se descartam as que não servem e se renova o plantel com crias que vão nascendo, ou que se comprou fora. Mas se o abate de fêmeas já passa dos 40% estamos falando de um processo de liquidação de ventres", afirmam os autores do estudo.