Redação AI (15/02/06) – O comportamento do dólar deixou de ser a maior preocupação dos frigoríficos exportadores de frango brasileiros. Agora, a grande prioridade é saber como administrar a oferta e a demanda de aves num mercado sacudido pelo avanço da gripe aviária. A Sadia, que divulgou seus resultados na segunda-feira, admite que seus estoques estão acima do volume esperado para esta época do ano e já busca saídas para administrar a queda do consumo de frango na Europa por causa da gripe aviária. O continente respondeu por 24% das exportações da Sadia, que somaram R$ 4,1 bilhões ano passado.
A empresa foi o primeiro frigorífico a divulgar resultado – lucro de R$ 657 milhões em 2005 – após a notícia de que o vírus letal da gripe aviária, o H5N1, chegou à Itália. Ontem, a doença também foi detectada na Áustria e no Irã, segundo a Reuters.
“Neste momento, a prioridade é administrar a oferta e a demanda de aves”, disse ontem Luiz Gonzaga Murat, diretor financeiro da Sadia, durante reunião com analistas de mercado. Segundo ele, as incertezas em relação à demanda – que já cai também no Oriente Médio, o maior cliente da Sadia, com 26% das exportações – dificultam fazer previsões sobre preços e o volume de exportação. Ele admitiu ainda que as margens da empresa devem ser afetadas no primeiro semestre por causa da retração do consumo de frango em alguns países.
Para driblar a restrição na demanda por frango, a Sadia vai se adaptar para ampliar a oferta de itens processados para o mercado externo, segundo Murat. Os produtos substituíriam o frango in natura. Há ainda outras alternativas. “Se não pudermos oferecer aves, vamos oferecer carne bovina e massas”, afirmou. Ele acrescentou que a empresa tentará acelerar a abertura de alguns mercados. As regiões que a Sadia considera promissoras são Índia e China.
Em tom irônico , Murat disse que “a Itália só está comendo macarrão”. Mas, em tom mais sério, avaliou que existe uma “reação incontrolável, fora de qualquer previsão” às notícias sobre a gripe aviária na Europa. O executivo acredita, porém, que acontecerá na Europa o mesmo que ocorreu na Ásia, onde o consumo recuou como efeito do surgimento da gripe aviária em 2003, mas agora já voltou aos níveis normais.
Em recente entrevista ao Valor, Wang Wei Chang, vice-presidente financeiro da Perdigão, também reconheceu que as exportações de carne de frango deverão cair neste trimestre por conta da gripe aviária. Ele observou que quando a doença surgiu na Ásia, a Tailândia passou a vender produtos cozidos porque perdeu espaço para os produtos in natura e congelados.
Wang também reconheceu que a menor demanda externa deve elevar a oferta doméstica de frango, deprimindo os preços. Murat previu um momento difícil para pequenos frigoríficos. “A Sadia consegue vender frango com prejuízo por dois meses seguidos porque temos outros produtos. Quem só tem frango, pode ter que parar”.
Apesar do quadro sombrio, a Sadia ainda não planeja reduzir a produção. Segundo Murat, a empresa acompanhará o que for decidido pelas lideranças do setor. Associações já falam em redução para enfrentar a crise de demanda.
Mas Murat acredita que o consumo de proteínas deve crescer no mercado interno com o aumento do salário mínimo este ano. Além disso, ele avalia que o vetor para os preços dos grãos é de baixa, ainda mais se a gripe afetar a produção de frango.
Dianta de analistas claramente preocupados com os efeitos da gripe aviária no desempenho da empresa, Luiz Murat criticou a lentidão do governo em implementar um plano de prevenção contra a gripe aviária no Brasil. “O Brasil tem sido abençoado [porque não registrou a cepa mais patogênica do vírus da gripe]”. Segundo o executivo, a chegada da gripe ao país poderia significar o emprego de dois milhões de pessoas que trabalham no setor de frigoríficos.
Apesar do quadro difícil no curto prazo, a Sadia irá manter o cronograma de investimentos para este ano. “Não podemos ficar congelados por causa de problemas de curto prazo”, afirmou Murat.
Em tempo: o dólar deixou de ser uma das maiores preocupações da Sadia porque a empresa está recorrendo a operações de hedge com derivativos financeiros para se proteger da desvalorização. Isso permitiu à empresa ampliar sua margem líquida para 9% em 2005 ante 7% em 2004. (Colaborou MS)