Redação (06/06/2008) – Falta menos de um mês para o anúncio das medidas governamentais de apoio à nova safra de verão. E esta é uma safra particularmente importante, porque, dependendo do seu resultado em termos de volume de produção, poderá ser o grande salto brasileiro na direção de conquistar definitivamente espaços significativos no mercado agrícola mundial neste momento de grande desequilíbrio entre a oferta e a procura de alimentos, com aumento dos preços em geral.
Portanto, medidas adequadas podem ajudar o setor privado a lançar-se nesta nova plataforma. E, entre elas, está a recorrente questão do crédito rural.
Uma das características do produtor brasileiro é não dispor de recursos próprios suficientes para seu custeio agrícola, que tem a ver com o preparo do solo, com operações de plantio, tratos culturais e colheita, e com a compra de insumos indispensáveis, como sementes, fertilizantes, corretivos, defensivos, combustíveis, etc. Há ainda os gastos com compras ou aluguel de máquinas e equipamentos, contratação de mão-de-obra e arrendamento de terras.
E, por fim, entre a compra dos insumos e a venda final de produto colhido, decorre um longo tempo, de quase um ano, o que exige capital de giro, outro capital de que os agricultores não dispõem.
É por esta insuficiência de recursos próprios que foi criado o Sistema Nacional de Crédito Rural, que é o crédito concedido pelos bancos a taxas de juros positivas, embora menores que as do crédito em geral. Por outro lado, há um "sistema privado de financiamento" operado pelos fornecedores de insumos, pelas tradings e pela agroindústria, com operações a taxas de mercado. Estima-se que cada uma destas fontes (recursos próprios, crédito rural e "mercado") responde por 1/3 das necessidades totais de dinheiro.
Agora, às vésperas da decisão do que vão plantar, os agricultores se defrontam com aumentos de custos de produção (só o fertilizante subiu mais de 140% da safra passada para esta), do petróleo (que interfere em todas as fases, desde o plantio até o transporte da colheita) e com a possibilidade de redução da principal fonte de crédito rural e a conseqüente ameaça de o volume de recursos ser menor que o do ano passado.
Esta principal fonte é a chamada "exigibilidade bancária", correspondente a 25% dos depósitos à vista que os bancos são obrigados a aplicar no setor rural, com juros favorecidos, embora sempre maiores que a inflação. Com o fim da CPMF, os clientes dos bancos, livres do pagamento de 0,38% sobre os cheques, passaram a aplicar seus recursos em fundos de renda fixa, pois isto é melhor do que deixá-los na conta corrente sem remuneração.
Calcula-se que, desde janeiro, houve uma redução de R$ 8 bilhões no total dos depósitos à vista nos bancos, o que equivale a uma diminuição de R$ 2 bilhões para o crédito rural, até agora. E os depósitos à vista continuam diminuindo. Com isso, o volume de recursos das exigibilidades está despencando: em janeiro estavam em R$ 34 bilhões, e devem ter fechado maio perto dos R$ 27 bilhões, uma expressiva redução de 20%.
Adicionalmente, a renegociação recém-anunciada das dívidas vai "engolir" R$ 2 bilhões dos recursos obrigatórios.
Ora, a equação é complicada, e o governo está estudando como resolvê-la com a elevação dos custos de produção, há demanda de maior limite de crédito individual aos agricultores, enquanto a fonte oficial está diminuindo. E esta safra é das mais importantes da nossa história recente, até para ajudar a reduzir a pressão inflacionária no mundo; precisamos aumentar o volume exportado para compensar a valorização do real e manter positivas as contas do comércio exterior.
Mas o mais importante é garantir a renda ao produtor rural, para ele resgatar seus compromissos e voltar a investir para melhorar sua competitividade.
Assim, para viabilizar o financiamento da safra, será preciso garimpar dinheiro nas mais diversas origens – depósitos à vista, poupança, fundos constitucionais, Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), Tesouro Nacional, etc. -, mesmo que com maiores desembolsos para o Tesouro Nacional. Afinal, os subsídios praticados no Brasil são infinitamente menores que os dos Estados Unidos, Europa e Ásia. E não se trata de custo fiscal, mas de investimento na geração de empregos e dinamismo econômico.
Também não basta aumentar os recursos. É preciso recuperar o crédito do produtor junto a bancos e empresas. A velocidade de recuperação da renda do setor não está sendo acompanhada da recuperação do crédito.
Roberto Rodrigues* – Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior de Agronegócio da Fiesp e professor de Economia Rural da Unesp/Jaboticabal. Ex-ministro da Agricultura)