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Farelo e óleo ganham força, mas foco do país segue na soja em grão

As cotações da soja em grão alcançaram máximas históricas na bolsa de Chicago e se encontrem atualmente nesse patamar.

Redação (21/02/2008)- Em 2007, depois de anos de marasmo, as esmagadoras de soja voltaram a anunciar, "em bloco", novos projetos de fábricas de processamento no país, que nos últimos tempos perdeu muito espaço nesta frente para a Argentina sobretudo em decorrência do desestímulo tributário originado pela Lei Kandir, de 1996. 

Tal desestímulo, provocado pela cobrança de ICMS no transporte interestadual do grão destinado à produção de farelo e óleo, perdura, mas a retomada dos aportes em unidades esmagadoras reflete a nova realidade de um mercado superaquecido e com preços internacionais e domésticos em elevado patamar. 

Ainda que as cotações da soja em grão tenham alcançado máximas históricas na bolsa de Chicago e se encontrem atualmente nesse patamar – o que fortalece as exportações brasileiras da matéria-prima -, o óleo subiu ainda mais com as boas perspectivas para o mercado global de biocombustíveis, empurrado também no Brasil pela estréia da mistura compulsória de 2% de biodiesel no diesel. 

Mas, como o esmagamento do grão resulta em proporção desigual de seus principais derivados (20% de óleo e 80% de farelo, a grosso modo), para justificar o processamento é preciso demanda para o farelo, e internamente esse apetite voltou a aumentar com as boas vendas de carnes, destinadas ao revigorado mercado doméstico e para embarques. 

Não por acaso, observa Fabio Trigueirinho, secretário-geral da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), o atual movimento de expansão do processamento de soja está no Centro-Oeste . "Está ocorrendo uma migração da produção de frango e, principalmente, suínos para a região. Parte da idéia da construção das unidades no Centro-Oeste tem a ver com a produção de carnes, já que 80% do que se obtém da soja é farelo", diz. "É um modelo novo de agregação de valor com as carnes". 

Das três novas novas fábricas projetadas, a do Grupo André Maggi em Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, já está aquecendo as turbinas. Orçado em cerca de R$ 130 milhões, entre a indústria em si e aportes em armazenagem e reflorestamento, o projeto elevará a capacidade de processamento da empresa, que tem outras duas plantas do gênero, em 3 mil toneladas por dia, para cerca de 6,5 mil. 

A gigante americana Cargill, por sua vez, está investindo R$ 210 milhões na construção de uma esmagadora em Primavera do Leste, também no Mato Grosso, e igualmente com capacidade para 3 mil toneladas diárias. Trata-se da sexta planta do gênero da multinacional no Brasil, e ela representará 480 mil toneladas de farelo e 120 mil de óleo por ano em aumento de capacidade. Ainda em território mato-grossense, mas em Nova Mutum, a Bunge construirá sua nona esmagadora no país, a segunda no Estado. 

Apesar de representarem uma retomada de investimentos, o perfil das três unidades demonstra que a perda de espaço do Brasil nas exportações globais de farelo e óleo não será revertida, especialmente se for levado em consideração que entre os últimos projetos inaugurados na Argentina ou na China, incluindo os da Cargill e Bunge, estão complexos gigantes com capacidade para esmagar 12 mil toneladas de soja/dia ou mais.

"A Argentina mantém um diferencial tributário que nós não temos. É preciso o governo achar a questão importante para que esse cenário mude", diz um executivo de uma das várias indústrias do segmento que não têm investimentos em novas unidades em curso. "Além do mais, a Argentina tem uma taxa de câmbio bem mais favorável para as exportações do que a nossa", arremata. 

Na comparação com a Argentina, observa Trigueirinho, da Abiove, a problemática logística brasileira é outro entrave. "A Argentina ainda tem um grande diferencial competitivo, porque as plantas em operação no país ficam perto do porto", afirma. 

Na safra 1995/96, conforme estatísticas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), os americanos lideraram as exportações mundiais de soja em grão, com fatia de 72,5% do total, mas o Brasil liderava os embarques globais de farelo e óleo, com participações de 35,4% e 30,2%, respectivamente. Na atual temporada (2007/08), o Brasil deve confirmar a ponta nos embarques de grão (39,2% do total) e perder para seus principais concorrentes nos derivados. 

É verdade que, em termos absolutos, as exportações brasileiras do chamado complexo soja (grão, farelo e óleo) não pararam de crescer mesmo com a mudança consolidada a partir da Lei Kandir. Em 2008, prevê a Abiove, a receita total deverá alcançar US$ 16,5 bilhões, ante os US$ 4,5 bilhões de 1996. Mas, no mercado, não faltam especialistas que afirmem que, com o valor agregado dos derivados, poderia ser muito melhor. 

Apenas por curiosidade, em 1996 o volume de farelo de soja exportado pelo Brasil foi três vezes superior ao de soja em grão. Este por sua vez, 2,7 vezes maior que o de óleo, conforme a Abiove. Com preços e volume total estimados pela entidade para 2008, se essa proporção fosse mantida as exportações do complexo renderiam quase US$ 16 bi, US$ 500 mil a menos que o estimado com as proporções reais. Na balança deste ano, assim, não haveria grandes perdas, mas a produção de derivados tem um efeito multiplicador ao longo da cadeia – difícil de ser estimado – maior que o da simples exportação do grão, e as margens de lucro do óleo são melhores para as indústrias. 

Só que a Abiove projeta para 2008 um preço médio para a exportação de óleo, por exemplo, de US$ 950 por tonelada, enquanto no mercado, hoje, o valor se aproxima de US$ 1.600, segundo Renato Sayeg, da Tetras Corretora. Para ele, é a disparada do óleo a grande locomotiva dos investimentos em curso no Brasil. 

Conforme cálculos do Valor Data, os preços do óleo subiram mais de 100% na bolsa de Chicago nos últimos 12 meses, enquanto as cotações do grão aumentaram cerca de 80% e as do farelo, menos de 60%. "Esse movimento dos preços foi mais forte [para os investimentos] do que o incentivo ao consumo interno", afirma Sayeg. 

"O óleo de soja estava no pedestal nos anos 70, perdeu seu status de nobreza ao longo dos 80 e dividiu a importância com o farelo na década de 90. Agora, com os programas de biocombustível, voltou a ter peso mais forte". A agroenergia pode impulsionar os investimentos, mas Sayeg reforça que ainda não é possível classificar os aportes em esmagamento em território nacional como uma tendência. "Há muita aposta no movimento da agroenergia. Em muitos casos, é uma aposta cega".