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Sem diálogo, crise rural argentina se agrava

Produtores, por sua vez, vão manter locaute; na noite de ontem, Buenos Aires voltou a ser palco de panelaços contra Cristina.

Redação (27/03/2008)- Duas semanas após o início do locaute de produtores do campo na Argentina, não há sinal de diálogo entre o governo e o setor agropecuário. A situação levou ontem, pela segunda noite seguida, a "panelaços" da população de Buenos Aires contra o governo de Cristina Fernández de Kirchner.
O locaute foi uma reação à decisão do governo, anunciada no último dia 11, de elevar os impostos às exportações de grãos e gerou a primeira grave crise interna enfrentada por Cristina, há pouco mais de três meses no poder. Ontem os dois lados do conflito continuaram intransigentes. O ministro da Economia, Martín Lousteau, disse que "haverá soluções quando voltar a cordura", diante dos bloqueios promovidos pelos produtores em estradas, que impedem a passagem de caminhões com alimentos.
Os produtores agropecuários afirmaram que vão manter o protesto até que o governo volte atrás no aumento dos tributos sobre as exportações.
Ontem a morte de um homem de 64 anos, na Província de Córdoba, foi atribuída aos bloqueios rodoviários. A ambulância que o levava teve que mudar de trajeto porque a passagem por onde ia estava impedida. O locaute também gera desabastecimento de carne e laticínios em açougues e mercados de Buenos Aires.
O ministro da Justiça, Aníbal Fernández, disse que o governo irá cuidar para que seja desbloqueado o caminho dos produtos que estão em falta e "quem não entender irá preso". Ele afirmou, porém, que não haverá repressão policial.

Panelaços
Na noite de terça-feira, um discurso de Cristina inflamou as tensões. Ela chamou o locaute de "piquete da abundância”" e disse que não iria ceder a nenhuma extorsão. O discurso gerou um grande panelaço, que tomou as ruas de Buenos Aires. O protesto se concentrou na praça de Maio, em frente à Casa Rosada, sede do governo, e se estendeu até que chegou ao local uma marcha liderada pelo líder piqueteiro Luís D”Elía, aliado de Cristina.
Houve confrontos entre o grupo de manifestantes e os piqueteiros, que acabaram por dominar a praça. D”Elía agrediu um manifestante que o chamou de "mercenário". Houve também "panelaço" na frente da residência presidencial e em cidades do interior.
Na noite de ontem, quando novos panelaços foram convocados por mensagens de celular e e-mail, piqueteiros e gente que protestava contra o governo voltaram a se confrontar na praça de Maio. "Veja o que jogaram na gente", disse a universitária Josefina Fortte, 21, exibindo um objeto de madeira. "Agrediram-nos e tivemos que vir para o Obelisco. Isso não é democracia." Entre os piqueteiros o estudante Jorge Romero, 26, dizia que estavam só "cuidando da praça". "O que essa gente pede é falta de respeito. Com tantos passando fome, eles querem ganhar ainda mais do que têm."

Protestos espontâneos
A imprensa e os opositores do governo insistiram em comparar o panelaço da classe média de anteontem com o que antecipou a queda do presidente Fernando de la Rúa em 2001. Para o analista político Julio Burdman, a situação é completamente diferente, mas tem um ponto em comum. "Foram protestos espontâneos de setores que sentem um mal-estar com o governo e não se sentem representados pela oposição."
Para ele, o protesto foi liderado por pessoas do campo que vivem em Buenos Aires e que teriam se ofendido com o discurso. Segundo Burdman, o conflito pode gerar uma "crise de imagem" para a presidente, já que "muita gente acha que ela não tem o poder nas mãos".
O governo negou que o protesto tenha sido espontâneo. "É uma enorme mentira que o protesto tenha sido motivado pelo discurso; havia gente com camisas impressas e cartazes escritos no computador", disse o ministro Fernández.