A moeda brasileira costuma derreter sob o impacto de turbulências econômicas mundiais – do crash de 1929 ao colapso da Rússia, em 1998. Foi o que ocorreu no início da atual crise, em setembro do ano passado, após a quebra do banco de investimentos Lehman Brothers: a cotação do dólar, que estava em R$ 1,55, pulou para uma faixa que variou entre R$ 2,30 e R$ 2,50. No entanto, entre maio e agosto passados, a moeda brasileira voltou a se valorizar em relação ao dólar, de R$ 2,21 chegou à cotação de R$ 1,84.
Como explicar esse movimento? Para o Banco Central brasileiro e analistas de bancos privados, ele decorreu da recuperação parcial do preço de commodities exportadas pelo país e de virtudes da política econômica altiva do governo. Mas um estudo inédito da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), aponta para outro motivo. Segundo o estudo, o real se valorizou porque os investidores internacionais teriam voltado a colocar dinheiro em títulos públicos atrás do diferencial entre o juro alto no Brasil e as baixas taxas estrangeiras.
O estudo baseia sua conclusão no fato de que o fluxo financeiro para títulos de renda fixa se acelerou nos meses em que a taxa de câmbio se apreciou, enquanto outros tipos de investimentos perderam o gás. Isso provaria a tese de que são eles um dos principais fatores por trás da apreciação da taxa de câmbio brasileira. O trabalho foi preparado pelo departamento de comércio exterior da Fiesp e vai constar do primeiro número de um boletim quinzenal de avaliação da taxa de câmbio.
Exportações – O estudo reconhece que o lado comercial foi responsável pela maior entrada de dólares na economia entre janeiro e agosto. Foram US$ 10,7 bilhões de saldo cambial comercial ante US$ 6 bilhões de saldo cambial financeiro. No entanto, segundo a Fiesp, em maio a conta financeira se tornou mais relevante do que a conta comercial na absorção de dólares na economia.
Afirma o estudo: “Nos últimos meses – entre maio e agosto, período em que a moeda brasileira apresentou maior valorização-, a tendência anterior se inverteu; isto é, a conta financeira passou a ser responsável pela absorção mais forte de dólares na economia”. Essa tendência continuou em junho, diz o estudo, quando os investimentos em renda fixa foram os únicos a apresentar aceleração em relação a maio (observados apenas os itens da conta financeira).
O saldo dos investimentos em renda fixa pulou de US$ 1,2 bilhão para US$ 1,89 bilhão. Os investimentos em ações tiveram saldo negativo de US$ 850 milhões. Já o saldo de investimentos diretos caiu de US$ 2,5 bilhões para US$ 1,45 bilhão. “O fluxo cambial para arbitragem na renda fixa desequilibra o mercado cambial e é o principal responsável da valorização cambial nos últimos três meses”, afirmou Roberto Giannetti da Fonseca, diretor do Departamento de Relações Internacionais da Fiesp. “Há uma forte correlação estatística entre esses dois fatos”.
Segundo a Fiesp, a constante apreciação do real promove simultaneamente o encarecimento das exportações e o barateamento das importações.
No dia 12 de agosto, esse tema prevaleceu durante a reunião do GAC (Grupo de Acompanhamento da Crise) -o grupo é composto por empresários e ministros de Estado.
Empresários do setor exportador reclamaram da taxa de câmbio. O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria) chegou a dizer que o Brasil pode se transformar em uma economia “commoditizada” [dependente da venda de produtos básicos] por conta da apreciação cambial.