Na série especial que o Globo Rural exibe esta semana, você vai ver o que as entidades que representam as cadeias produtivas do boi, do suíno e do frango estão discutindo na questão do bem-estar animal (vídeo aqui)
No porto de Belém, no Pará, imagens mostram o flagrante do embarque de gado vivo, num navio, para o Líbano, no Oriente Médio. Uma viagem de quase 20 dias dentro de porões, em condições que provocam estresse e problemas de saúde nos animais. A denúncia é da Organização Não-Governamental (ONG) WSPA, a Sociedade Mundial de Proteção Animal.
As condições precárias no transporte de animais para o abate, tanto nos navios, como nos caminhões, preocupam a ONG.
“O produtor cria um boi durante dois anos. Na hora que ele está pronto para ser vendido, é transportado de forma errada. O boi chega ao frigorífico cheio de lesões, que vão ser perdidas, cheio de hematomas e com sinais muito claros desse tipo de estrago na carcaça. Isso tudo é perda”, diz Antônio Augusto, diretor da WSPA.
No Brasil, não existem leis que obriguem o cumprimento de regras de bem-estar animal. Há apenas uma instrução normativa com recomendações de manejo cuidadoso, alimentação saudável, instalações seguras que não ofereçam riscos aos animais. A adesão à norma é voluntária, mas se torna praticamente obrigatória para criadores que querem conquistar um mercado cada vez mais exigente, como a União Europeia (EU).
Os europeus querem que as medidas de bem-estar façam parte das regras de comércio internacional. Novas normas para a avicultura entram em vigor em 2012. Para a produção de frangos de corte, um dos itens exigidos é a padronização no tamanho dos galpões, e na produção de ovos, o fim das gaiolas para poedeiras.
A União Brasileira de Avicultura (UBA), que tem na Europa o seu principal mercado, adotou uma série de medida na criação de frangos e aves de postura para atender às exigências dos compradores. “O que vai entrar em vigor o Brasil tem condições de atender. A maior dificuldade vai ser no setor de postura, de poedeiras comerciais. Nós trabalhamos com gaiolas que vão ser banidas da União Europeia em 2012. Estamos, agora, em uma fase de discussão. Temos um protocolo para a postura comercial, mas estamos em um trabalho mais intenso para o setor de poedeiras. Em frangos de corte, nenhuma dificuldade”, diz Ariel Mendes, presidente da UBA.
Rui Vargas, diretor de mercado externo da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), afirma que as boas práticas no trato animal podem trazer aumento no custo, mas são importantes para garantir acesso ao mercado. “Nós temos a União Europeia como um grande bloco comprador de carnes e o suíno caminha rapidamente para tentar atingir esse mercado. Nós achamos importante ter a aprovação desse mercado, porque ele é referência”, comenta Rui Vargas.
Já o setor de bovinos é mais resistente à idéia de adaptar a cadeia produtiva às novas exigências europeias. “A gente não pode aceitar que um bloco ou um país imponha regras unilateralmente e diga: ‘Você tem que cumprir isso’, mas a gente sabe também como o mercado funciona. Se a gente quiser entrar lá, vai ter que se adaptar. Então, num segundo momento, a gente tenta um diálogo e num terceiro momento, pedir a equivalência entre os processos produtivos entre Brasil e União Europeia ou outro país ou bloco qualquer. Nós temos que ter bom senso, aceitar o que é aceitável e regulamentado pelos órgãos internacionais”, diz Otávio Cançado, diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Carne (Abiec).
A Abiec confirma que o setor bovino é o mais atrasado na adoção das boas práticas. “Se você comparar com os suínos e com as aves, eles estão muito mais organizados, por conta da verticalização. Com os bovinos é mais difícil. Você tem milhões de produtores para arregimentar, explicar, ensinar. As pessoas, geralmente, que cuidam da fazenda, tem uma instrução, uma escolaridade muito baixa”, diz Otávio Cançado.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) tem promovido treinamento para fiscais agropecuários, funcionários de frigoríficos e de fazendas. Andréa Parrilla, coordenadora da Comissão Técnica Permanente de Bem-Estar Animal do Mapa, fala sobre as vantagens para o criador em adotar práticas de bem-estar animal. “Além da parte de ética, as vantagens da adoção dos princípios de bem-estar animal para o produtor são o acesso a mercados e consolidação desses mercados mais exigentes. Quando se fala em mercados mais exigentes, são aqueles que pagam mais pelo produto de boa qualidade e que estejam dentro de certas regras de bem-estar animal”, diz.
Andréa explica que o governo só vai obrigar os criadores a adotar essas práticas depois que elas forem adaptadas à realidade brasileira. “As pesquisas desenvolvidas no Brasil, para as condições Brasileiras, ainda não são suficientes para sejam desenvolvidas legislações impositivas, obrigatórias”, diz.