Apesar das exportações em queda em relação a 2014, a previsão do governo e do setor privado é de que a balança comercial encerrará 2015 com superávit. Para analistas de comércio exterior, isso ocorrerá, porque as importações também estão caindo, e em ritmo mais intenso do que as vendas externas. Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram que, de janeiro a junho deste ano, houve queda de 14,6% das exportações em comparação com igual período de 2014. Do lado das importações, a queda no mesmo período de comparação foi mais acentuada, de 18,5%.
“Se olharmos o desempenho no primeiro semestre, veremos tanto queda de exportação quanto de importação. Isso deve ajudar a fazer superávit”, diz Welber Barral, da Barral M Jorge Consultoria em Comércio Exterior. Segundo ele, a contração na economia é a responsável pelo fato de o Brasil estar importando menos. “O motivo para a queda das importações é a queda da atividade e do investimento em capital produtivo”, diz. De acordo com Barral, há ainda a queda na importação de bens de consumo, que são aqueles usados por indivíduos ou famílias. “Há uma queda de capacidade de compra no Brasil. Um dos setores que mais tiveram queda (nas importações) é o de automóveis. Você tem uma postergação da decisão de compra pelo consumidor”, destaca.
O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, faz avaliação semelhante. A entidade prevê superávit de US$ 8 bilhões para a balança neste ano. “Claramente, só haverá superávit por isso (importações). Pela nossa previsão, as exportações vão cair 15% neste ano. Como as importações devem cair 20%, elas é que devem gerar superávit. Neste ano, vamos ter um ‘superávit negativo’, que não é gerado por fatores positivos, como aumento de exportação”, ressalta.
Castro atribui a diminuição das importações, em primeiro lugar, à retração econômica e, em segundo, ao dólar valorizado. “Até maio, o motivo das importações menores era a retração econômica. A partir daí, teve a taxa de câmbio”, afirma, ressaltando que há uma demora entre a valorização da moeda norte-americana e seu impacto nas importações. “Quem já fez a encomenda vai receber o produto. Mas, a partir do momento em que o cenário vai piorando (com o dólar mais caro), deixa de fazer a encomenda”, explica.
A economista Lia Valls, pesquisadora da Fundação Getulio Vargas (FGV), também considera a contração da economia a principal razão para a retração das importações em 2015. “Está despencando a compra de bens intermediários e a de bens de capital, feita pela indústria”, comenta. Para ela, o efeito do dólar valorizado é secundário. Em se tratando das exportações, o principal motivo para o Brasil estar capitalizando menos é a queda de preços das commodities (produtos primários com cotação internacional), fenômeno em curso desde 2014. “A maior parte da pauta são commodities, e os preços continuam caindo. O preço do minério, do petróleo, despencou. Aí a gente fica dependendo dos manufaturados, que têm como principal mercado o argentino, mas a Argentina está em crise. Tem também os Estados Unidos, mas lá já temos uma concorrência”, comenta Lia Valls.
Na avaliação de Welber Barral, os produtos manufaturados brasileiros podem estar mais competitivos no mercado externo em 2016 por influência do dólar alto. Isso, diz, deve garantir, também no ano que vem, uma balança superavitária. Mas, para ele, os superávits neste ano e no próximo, se acontecerem, não podem ser classificados como sustentáveis. “O Brasil não é competitivo. Simplesmente uma redução do valor das commodities ou uma elevação do dólar não são suficientes, porque o custo de produção no Brasil é muito alto. Dá para dizer que o superávit que nós vamos ter não é sustentável”, avalia.
O consultor ressalta que o Brasil tem problemas tradicionais que diminuem a competitividade das exportações. Ele destaca que, além do custo de produção, a infraestrutura é deficiente para o escoamento. Para ele, o Plano Nacional de Exportações, lançado em junho pelo governo, é um passo válido. “É importante para coordenar as ações do governo e dar indicações para o setor privado. Tem partes interessantes no que se refere a medidas de facilitação de comércio e desburocratização. O que faltam são medidas na área tributária, o que não vai acontecer neste ano, até por causa das restrições (medidas de ajuste) fiscais.”
Crise leva 27% dos brasileiros a limitar gastos com carne bovina
A crise econômica no Brasil levou consumidores a cortar gastos com a carne bovina no segundo trimestre de 2015, de acordo com levantamento realizado pela dunnhumby, consultoria britânica que estima que 27% dos brasileiros tenham limitado gastos com produtos de origem bovina entre abril e junho em relação ao mesmo período do ano passado. A análise foi feita com base em dados de compras de 22 milhões de consumidores, obtidos por meio de parcerias no varejo nacional. Destes, 3,6% deixaram de comprar a carne bovina no período.
O consumidor tem preferido outras proteínas animais, mais baratas, ou optado por categorias de maior praticidade. A dunnhumby estima que 24% dos brasileiros tenham migrado para outras categorias no segundo trimestre, como suínos, que ficaram com 41,5% da troca. Os pratos prontos congelados ficaram em segundo lugar, com 19,8%, seguidos pelas aves resfriadas (14,3% da troca).
O efeito de substituição entre as carnes foi impulsionado pela menor competitividade da carne bovina no segundo trimestre. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq-USP), em abril, o preço do quilo da carne de frango chegou a valer apenas 34% da carne bovina. Os analistas do Cepea também ressaltaram que a arroba do boi gordo atingiu em março a diferença recorde de R$ 79,06 em relação à arroba do suíno em São Paulo. Nos meses seguintes, os preços da carne bovina continuaram em patamares significativamente superiores aos registrados pelo suíno.
“Acho que há dois grandes fenômenos contribuindo para essa migração. Um é a inflação da carne, que ganhou força nos últimos 12 meses, e o outro é uma tendência específica que observamos na crise econômica”, afirma o diretor-geral da dunnhumby no Brasil, Adriano Araújo.