Os preços dos produtos agropecuários subiram 5,13% em março, de acordo com a segunda prévia do Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), divulgada ontem pela Fundação Getulio Vargas, e indicam que o choque de preços de alimentos não está restrito apenas aos produtos in natura. Preocupações com a estiagem no Brasil e nos Estados Unidos e questões geopolíticas, como a crise na Ucrânia, têm levado a altas fortes das cotações de produtos como soja, milho, café e trigo, movimento que já apareceu na inflação no atacado, mas ainda pode se intensificar nas próximas leituras, avaliam economistas. Entre fevereiro e março, a segunda prévia do IGP-M passou de alta de 0,24% para um avanço de 1,41%, maior variação do índice nesta comparação desde julho de 2008, mas economistas ainda avaliam que há espaço para que, no mês cheio, o indicador acelere e fique mais próximo de 1,5%, para só depois começar a ceder, ainda que lentamente.
A alta das commodities no mercado internacional, principalmente do trigo, é mais um fator de risco para a inflação ao consumidor, no qual o impacto da elevação dos preços in natura já é visível. Na segunda prévia, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC-M) teve leve desaceleração, de 0,64% para 0,63%, mas o grupo alimentação deixou alta de 0,29% em fevereiro e subiu 1,21% neste mês. A maior influência positiva foi o tomate, que disparou 35,91% no período, enquanto a batata inglesa subiu 22,32%
O Índice de Preços ao Consumidor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (IPC-Fipe) mostrou resultado semelhante. Embora tenha desacelerado de 0,73% na segunda quadrissemana de fevereiro para 0,68% em igual período deste mês, esta foi a maior variação para a segunda semana de março desde 2003, nota Daniel Moreli Rocha, economista do BI&P.
No caso dos alimentos, a alta de 1,41% no período foi a maior, na mesma comparação, desde 1999. “O IPC da Fipe já mostrou forte impacto dos alimentos in natura, mas ainda é prematuro afirmar que todo o efeito ficará concentrado em março”, afirma.
Isso porque, no atacado, as altas dos preços de produtos agropecuários ainda podem se intensificar, avalia. De acordo com o índice da FGV, os alimentos in natura deixaram deflação de 1,37% no atacado em fevereiro para subir 13,86% nesta divulgação. Para Rocha, no entanto, outras pressões que podem ser até mais relevantes para o varejo ainda não foram totalmente captadas no atacado. É o caso do trigo, que já subiu cerca de 10% em março, na média, em relação ao observado no mês anterior, quando a cotação do cereal já havia avançado 4%. No caso do trigo, além das preocupações com os embarques ucranianos do cereal, há ainda o clima adverso nos Estados Unidos, com estiagem e ventos fortes, que podem prejudicar o desenvolvimento do grão.
Para Rocha, o comportamento do preço do trigo é uma preocupação porque altas do item têm reflexos mais intensos e diretos na inflação ao consumidor do que avanços de cotações de outros grãos, como milho e soja, que também estão subindo na bolsa de Chicago. “Se os preços se mantiverem neste nível, há uma parte da alta que ainda não apareceu nos IGPs”, afirma, o que poderia levar o IGP-M fechado de março para algo em torno de 1,5%.
Ainda assim, alguns esses itens já registraram altas relevantes na segunda prévia do índice, como o café, que subiu 28,34% no período, enquanto a soja em grão avançou 4,25% e o milho, 9,32%, sempre em relação a igual período do mês anterior.
“Não são apenas os alimentos in natura que estão pressionando a inflação”, também afirma José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. A alta dos grãos no mercado internacional pode ser um terceiro choque de oferta de produtos agrícolas em pouco mais de três anos. “Tivemos um choque no início de 2011, outro em meados de 2012 e o atual. Os produtos agrícolas no atacado têm acompanhado esse movimento”, diz.
Para Rocha, do BI&P, é possível que o atual movimento de alta de commodities tenha magnitude equivalente a um terço do forte movimento de valorização desses produtos em 2012, quando a seca prejudicou lavouras no meio-oeste americano.
“Certamente a parte agrícola vai continuar pressionando o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) neste mês”, disse Salomão Quadros, superintendente adjunto de Inflação da FGV. Por outro lado, como o regime de chuvas já se normalizou em algumas regiões agrícolas, a maior pressão da inflação de alimentos nos IGPs deve ser percebida em março. “Em abril há espaço para recuar”, disse Quadros.
Para Basiliki Litvac, economista da MCM Consultores, é possível que essa inflexão comece no IGP-DI, quando os preços agropecuários poderiam voltar a casa de 4,70%. “Mas ainda é um nível bastante elevado e depende da ausência de novidades negativas no meio do caminho”, afirma.