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Economia

Fundo deverá garantir venda a argentinos

O governo prepara mudanças no Fundo de Garantia à Exportação (FGE) como parte da engenharia financeira para "salvar" o comércio entre Brasil e Argentina. O fundo deverá atuar como "garantidor de última instância" aos bancos responsáveis por financiar os exportadores brasileiros.

Flag of Argentina — Image by © Royalty-Free/Corbis
Flag of Argentina — Image by © Royalty-Free/Corbis

O governo prepara mudanças no Fundo de Garantia à Exportação (FGE) como parte da delicada engenharia financeira de “salvamento” do comércio entre Brasil e Argentina. Esse fundo deverá servir como uma espécie de “garantidor de última instância” aos bancos comerciais responsáveis por financiar os exportadores brasileiros. A ideia do governo, já levada a Buenos Aires e que deve ser fechada na próxima semana, é destinar cerca de R$ 1 bilhão do FGE à cobertura dos riscos de calote pela Argentina.

A proposta tenta desatar o principal nó que ainda impede um acordo detalhado em torno do financiamento ao comércio bilateral: as garantias financeiras. Dessa forma, caberá ao fundo – que é vinculado ao Ministério da Fazenda – o papel de blindagem dos bancos contra a possibilidade de inadimplência do país vizinho, tirando qualquer risco do Banco Central. Com isso, a expectativa do governo é destravar o financiamento dos bancos e devolver a normalidade ao intercâmbio comercial, que foi duramente atingido pela crise cambial argentina. No primeiro trimestre, as exportações de produtos manufaturados “made in Brazil” ao principal parceiro do Mercosul tiveram recuo de 26%.

As empresas instaladas no Brasil, principalmente montadoras, relataram ao governo que vêm tendo dificuldades muito grandes em fechar operações bancárias – como adiantamentos de contrato de câmbio – porque as taxas subiram demais quando envolvem a Argentina. Para mitigar esse risco e dar tranquilidade às instituições financeiras, as autoridades devem recorrer ao FGE.

Hoje, o fundo atua como um “seguro” às exportações de longo prazo, com financiamento superior a dois anos: basicamente vendas de aeronaves da Embraer e serviços de engenharia (contratos das empreiteiras brasileiras no exterior). Para permitir que esse seguro seja estendido a operações de curto prazo, como é o perfil dos embarques à Argentina, uma resolução da Câmara de Comércio Exterior (Camex) deverá ser aprovada para concretizar formalmente tal mudança.

Embora seja capaz de driblar a resistência dos bancos, fazendo com que eles voltem a antecipar aos exportadores os dólares de suas vendas à Argentina, o FGE será usado apenas na hipótese – inesperada – de inadimplência do país vizinho. Os argentinos, conforme as negociações em andamento entre os dois governos, terão até 120 dias para pagar as importações de produtos brasileiros. Isso dá um prazo para que o Banco Central da Argentina e os importadores locais providenciem os dólares necessários para transferir ao Brasil.

Uma das possibilidades cogitadas pelo governo argentino é emitir títulos em pesos aos importadores, com correção cambial, em prazos compatíveis com o das operações de financiamento pelos bancos. Assim, caso ocorram novas desvalorizações do peso, as companhias na Argentina podem preservar integralmente sua capacidade de pagamento.

Toda essa engenharia financeira, apesar de ter sido aparentemente de agrado da Casa Rosada, ainda não foi fechada por causa da resistência do país vizinho em fechar um acordo que só resolva a vida dos exportadores brasileiros. O ministro da Economia, Axel Kicillof, e a ministra da Indústria, Débora Giorgi, deixaram claro o interesse em buscar maior equilíbrio do comércio bilateral e não apenas eliminar obstáculos à importação de produtos do Brasil. Para fechar um acordo, na semana que vem, Kicillof e Giorgi querem um compromisso explícito das montadoras com o uso de mais autopeças fabricadas na Argentina. Justamente por isso, as montadoras foram chamadas a participar de uma nova reunião entre os dois governos, a ser realizada no escritório do BNDES em São Paulo, terça ou quarta-feira.

Um levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que automóveis, autopeças e motores representam 60% da queda nas vendas de manufaturados à Argentina entre janeiro e março. “Temos relatos de empresas da indústria automobilística que não conseguiram exportar um veículo sequer neste ano”, diz o diretor de desenvolvimento industrial da CNI, Carlos Abijaodi.

Para o empresário, que elogia o “espírito de colaboração” do Brasil com a Argentina, é fundamental atrelar essa solução nas questões de financiamento a um compromisso de remoção das barreiras protecionistas aos produtores brasileiros na fronteira argentina. O memorando de entendimentos assinado entre os dois países no fim de março, na Costa do Sauípe, fala em garantir “agilidade aos trâmites administrativos e aduaneiros” no comércio bilateral. É uma referência às DJAIs, declarações juramentadas de importação que são liberadas pelas autoridades em Buenos Aires sem regras nem prazos claros, servindo de obstáculo aos fluxos comerciais. Elas são a grande preocupação do governo e da indústria.