O governo conta com uma combinação de políticas para chegar ao fim deste ano com uma taxa de inflação menor do que a variação de 5,84% do IPCA no ano passado. Segundo fontes da área econômica, dificilmente o combate à elevação dos preços será centrado num só vetor. Os instrumentos ao alcance das mãos, hoje, são: mais renúncias fiscais decorrentes de desonerações da folha de salários e da cesta básica, menor reajuste do salário mínimo, expectativa de choques positivos advindos de uma boa safra e acomodação dos preços das commodities. No mercado de trabalho, a tendência é de uma certa estabilidade.
A variável chave para a inflação na última década, que foi a apreciação da taxa de câmbio, pode ajudar um pouco, mas o grau de liberdade que o governo tinha e usou nessa área, está se esgotando.
Assessores da presidente Dilma Rousseff asseguram que se for preciso elevar a taxa de juros (Selic), o Banco Central não está impedido de fazê-lo. O que não se tem é convicção de que essa seria a solução. Por enquanto, argumentam, a inflação e a atividade econômica estão sob “observação”. Se as pressões sobre os preços vêm da escassez da oferta, de pouco adiantaria aumentar os juros para combatê-la, até porque a expansão da demanda está moderada e a atividade ainda não mostrou sinais inequívocos de recuperação, alegam.
BC não está impedido de aumentar a Selic. Seria a solução?
As últimas informações levadas pela área econômica ao Palácio do Planalto são de que o comportamento do IPCA neste ano será similar ao que ocorreu em 2011. Os índices mensais de inflação não serão ruins, mas a taxa acumulada em 12 meses vai demorar a ceder. Em 2011 a inflação foi a 7,1% em setembro e só depois começou a cair. Neste ano, a taxa acumulada só deve recuar da casa dos 6% também no segundo semestre.
Após o desconforto do IPCA de janeiro, de 0,86%, porém, as expectativas começam a dar sinais ainda que tênues de alguma melhora. A última pesquisa Focus trouxe um alívio das projeções de inflação para o chamado “Top Five” – grupo de economistas que mais acertam seus prognósticos. Visto como um indicador antecedente do que será a mediana das projeções, o “Top Five” aumentou ligeiramente a estimativa para a inflação de fevereiro – de 0,40% para 0,43% – mas reduziu a de março de 0,38% para 0,31%. São índices bem mais comportados do que o de janeiro, mas não necessariamente duradouros. O IPCA para o ano também recuou, segundo essas projeções, de 5,69% para 5,60%.
Hoje é possível afirmar que os rumos da inflação preocupam mais o governo do que o próprio baixo crescimento econômico, asseguram fontes graduadas. Mas um elemento que atuou a favor do controle inflacionário nos últimos anos – a valorização da taxa de câmbio – estaria chegando ao seu limite sob pena de destruir o parque industrial do país.
Durante a vigência do regime de metas para a inflação (excluído o ano de 1999 porque a meta só foi fixada no meio do ano), é nítida a influência da apreciação cambial. Por 13 anos, de 2000 a 2012, a meta de inflação foi cumprida (no seu intervalo de tolerância) em nove anos. Desses, o câmbio teve valorização em oito anos. A exceção foi no ano passado, quando a taxa de câmbio média anual teve depreciação de 16,7% e a inflação ficou no intervalo da meta.
Os dados de 2005 para cá, segundo fontes do governo, mostram de forma mais evidente o efeito da apreciação do câmbio sobre o IPCA. A desvalorização do ano passado – a taxa média nominal saiu de R$ 1,67 em 2011 para R$ 1,95 em 2012 – não foi suficiente para depreciar o real na proporção que o setor privado demandava.
O câmbio continua valorizado e isso leva a um novo cenário: o governo não teria mais como contar com uma apreciação importante como houve no passado para conter a inflação e estimular o crescimento. Portanto, precisa encontrar outras alternativas e essas estão na combinação de um pouco de cada coisa, com alvo especial na redução do custo Brasil e, como meta de mais largo prazo, o aumento da oferta.
O repasse (pass through) da taxa de câmbio para a inflação, segundo cálculos de economistas privados, varia entre 4% a 6% e seus efeitos ocorrem no período de até dois anos. A desvalorização que começou no fim de 2011, portanto, teria um impacto total de até 1 ponto percentual na variação do IPCA ao fim desse período, com forte concentração no primeiro ano.
Assim, segundo avaliação de assessores do governo, o câmbio pode até dar uma pequena contribuição para conter a inflação deste ano, mas sua maior colaboração será a de ficar razoavelmente estável ao redor de R$ 2,00 e não pressionar os preços.
O foco de atenção da presidente Dilma Rousseff, segundo assessores, está em viabilizar investimentos que aumentem a oferta de bens e serviços na economia – por meio de concessões para obras de infraestrutura e de medidas que aumentem a competitividade do setor privado.
A inflação – produto do descasamento entre oferta e demanda – é a grande preocupação deste ano e a ampliação da oferta é uma iniciativa de mais longo prazo.
Até lá, o governo vai andar sobre “o fio da navalha” para não deixar o IPCA escapar das rédeas nem comprometer a recuperação da atividade, de olho em 2014.
Claudia Safatle é diretora adjunta de Redação e escreve às sextas-feiras
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