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Justiça Agrária: não tenham medo - por Ronaldo de Albuquerque

A Justiça é cara, lenta e não está ao alcance da população. O Poder Judiciário merece reorganizar-se, desde que haja vontade política. Leia artigo do diretor do SNA.

A Justiça é cara, lenta e não está ao alcance da população. Magistrados, advogados, professores e cidadãos lutam por conseguir uma Justiça eficiente e rápida – esse é o pensamento dominante entre quantos se compenetram de que, da firmeza e rapidez dos julgamentos, depende a própria estabilidade do Estado. O Poder Judiciário merece reorganizar-se, desde que haja vontade política. O primeiro passo é ter independência financeira, para proporcionar a facilitação do acesso do cidadão à Justiça, e para que sejam criadas justiças especializadas, a exemplo do que sucede com a área trabalhista.

A implementação da Justiça Agrária parece uma ideia nova no Brasil, mas não é. Em 1922, o então presidente de São Paulo, Washington Luís, sugeriu à Câmara dos Deputados um projeto sobre o assunto. Em 10 de outubro do mesmo ano, foi regulamentada a Lei nº 3448. Em 1937, 15 anos depois, Joaquim Luís Osório, catedrático de Direito Constitucional da Faculdade de Pelotas, autor do primeiro projeto do Código Rural Brasileiro, publicou um trabalho sobre Direito Rural. Ele preconizou a Justiça Agrária como indispensável ao desenvolvimento e ao progresso do setor primário do país.

As divergências entre o capital e o trabalho, no meio rural, encontram no juiz agrário o intérprete do Direito Agrário, visando a alcançar equilíbrios duráveis e justos para o bem comum. As demandas no campo não podem ser resolvidas por uma Justiça em que ainda predomine qualquer tendência tradicional, de natureza civilista, subjugada por padrões e definições totalmente ultrapassadas pela realidade agrária.

O Direito Agrário patrocina, em todos os países de civilização cristã, a personalidade da exploração agrícola, em sua realidade econômico-jurídica, na continuidade técnico-administrativa e em seu valor social e humano. Para isso, o papel que cabe ao profissional do direito é muito importante na procura de soluções justas e convenientes, a fim de possibilitar ao mundo agrário a sua elevação material, moral, cultural e espiritual.

O Instituto dos Advogados do Brasil tem como um de seus objetivos a produção de conhecimento em diversas áreas jurídicas; por isso, criou a Comissão de Direito Agrário. Como primeira medida, apresentou proposta ao Ministério da Educação para a instituição, obrigatória, nas Faculdades de Direito, de uma cadeira de Direito Agrário. Outros assuntos, como a criação da Justiça Agrária no país, estão sendo discutidos nesta comissão.

Por que esse medo da Justiça Agrária? Medo da Lei, do Direito e da Justiça. Paira sobre a Justiça Agrária um clima de descrédito e prevenção, pois anunciam que, com a criação da instituição, ela se converteria em um órgão tutelar da conveniência dos pequenos lavradores e do MST, fugindo, assim, aos seus desígnios. Idéia inexata. Não se justifica, também, a alegação de falta de verbas ou de grandes despesas que se faria em face da implantação da Justiça Agrária.

Oportuna a afirmativa de C. J. Assis Ribeiro, em monografia apresentada ao Instituto dos Advogados Brasileiros, em 1976: “Acontece, porém, que o problema da organização e do funcionamento do Poder Judiciário não pode ser apreciado em termos tais, isto é, em termos de despesas. O destino da comunidade nacional, em grande parte, para constituir elemento de vida do organismo do Estado, depende do harmônico funcionamento do Poder Judiciário e essa harmonia decorre, inegavelmente, da especificação da Justiça…”

Ela seria um fator de estabilidade e prestaria ao país contribuição inestimável, preservando a sua autoridade, criando no campo um ambiente de pacificação e de ordem. Preconceitos absurdos, que tenderiam a desaparecer à medida que a Justiça Agrária fosse impondo, com o tempo, a confiança pública.

Acreditem na prudência, no bom senso, na honorabilidade, no espírito de justiça, nas decisões dos magistrados incumbidos de aplicar o Direito Agrário. Além de sua função julgadora, tem a missão, através da mediação, de ajudar a resolver conflitos com a pacificação das partes envolvidas. É lícito presumir que a Justiça Agrária contribuirá para a preservação de um clima de ordem e paz no campo, em benefício do Brasil. É uma lida contínua de ideias que se agitam num ambiente de cultura, elevação moral e patriotismo.

*Ronaldo de Albuquerque é diretor da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA)