A inflação no atacado recuou pela primeira vez desde o início do ano. Entre o fim de fevereiro e a primeira dezena de março, o Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M) acumulou alta de 0,91% na segunda prévia de março, em queda frente ao 1,1% apurado no mesmo período de fevereiro. À exceção das matérias-primas brutas, que sustentaram a alta do índice cheio, todos os itens pesquisados pela Fundação Getulio Vargas (FGV) desaceleraram. Da mesma forma, no Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que compõe cerca de 30% do IGP-M, apenas dois dos sete itens ainda apresentaram alta. A segunda prévia do mês de março também mostra recuo frente à primeira leitura – 0,95%. A queda nas duas comparações reforça a ideia de que a alta sazonal do início de ano começou a perder força.
No primeiro bimestre, fatores sazonais aliados a choques imponderáveis explicaram boa parte da alta de preços observada no atacado e no varejo. O reajuste das tarifas de transporte público em capitais como São Paulo e Salvador em janeiro pressionaram o sub-item transportes no IGP-M, que passou de 0,2% em dezembro para 2,7% em fevereiro. Na segunda prévia de março, divulgada ontem, transportes variaram 0,6%. Outra pressão sazonal, de material escolar, passa por processo semelhante. O item passou de inflação de 2%, em janeiro, para 0,1%, na segunda prévia de março. Segundo os analistas, as altas sazonais, que antes pressionavam os preços, agora estão “devolvendo a pressão”.
A perda de força dos itens transporte e educação, no entanto, era ainda contrabalançada pela alta de itens específicos. Em igual período do mês passado (a segunda prévia de fevereiro), dois subitens do Índice de Preços por Atacado na indústria (IPA-industrial) pressionavam a inflação. Entre os bens finais, os alimentos processados tiveram alta de 4,3% no mês passado. Já entre os bens intermediários, o item material e componentes para manufaturas, basicamente commodities e insumos, acumulava alta de 2,1%. Neste mês, por sua vez, esses itens registraram elevações menos intensas: 0,3% e 1,1%, respectivamente.
“Há expressiva devolução do álcool também, que vinha forte no começo do ano”, afirma Fábio Ramos, economista da Quest Investimentos. Em um mês, o álcool anidro saiu de 16,5% para -5,2%, e o hidratado tombou de 13,7% para deflação de 5,3%.
A elevação nos preços das matérias-primas brutas, entre igual período, sustentou a alta no atacado, avaliam os analistas consultados pelo Valor. A alta de 1,6% verificada nos dados divulgados ontem pela FGV – muito superior aos 0,3% registrados em fevereiro – arrefeceram na margem, uma vez que na primeira prévia de março as matérias-primas bateram em 2,1%. Para Felipe Insunza, economista da Rosenberg & Associados, o item, no entanto, deve continuar pressionando o atacado.
“Em abril, teremos o reajuste do minério de ferro, que pode chegar a 100%. Será uma pancada que, aos poucos, vai repercutir em uma série de setores”, avalia. Segundo Insunza, a remarcação de preços do minério atingirá o setor siderúrgico logo em maio, tornando o custo de produção do setor metalúrgico maior. “O impacto em carros, liquidificadores e bens de consumo de modo geral será sentido no varejo já no fim do ano”, afirma.
Por outro lado, os preços administrados devem funcionar como fator de equilíbrio entre o segundo e o terceiro trimestre. No mês que vem começam a ser reajustados os contratos de energia elétrica, que são calculados usando o IGP-M do ano anterior e o câmbio do período. Em 2009, o IGP-M fechou com deflação histórica de 1,7% e a taxa de câmbio hoje é mais favorável que em igual período do ano passado – passou de R$ 2,10 para R$ 1,75. As contas de telefone também terão queda, pois o IGP -M é um dos itens da cesta que compõe o Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), usado para o cálculo do reajuste.
A alta nos IGPs, ao longo do ano, devem impactar as contas em 2011. Ramos, da Quest, avalia que haverá, ainda neste ano o “efeito gravidez” no varejo, que aos poucos vai incorporar a recuperação do atacado, que deixou para trás a fase deflacionária de 2009. Insunza calcula que o IGP-M deve fechar o ano em 9,2%, taxa próxima a verificada em 2008, quando o Produto Interno Bruto (PIB) também crescia a taxas aceleradas.