Redação (17/02/2009)- O aquecimento das exportações brasileiras de grãos e açúcar e o maior apetite chinês por alimentos começaram a movimentar o mercado de fretes no país e no exterior. "Os negócios tinham parado completamente em outubro, com a demanda superenfraquecida por conta da crise financeira global", diz Nelson Carlini, diretor do Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave).
Durante a crise, os negócios estancaram porque os países importadores decidiram consumir seus estoques, explica Carlini, cuja entidade foi fundada em 1907 e reúne os armadores com trânsito na costa brasileira. "Agora, as movimentações foram retomadas, sobretudo para cargas a granel", afirma o executivo, que atua há quase 40 anos no setor de navegação marítima e ocupa também o cargo de diretor-geral da CMA CGM, uma das maiores empresas do setor.
Depois de atingirem os menores patamares históricos em outubro, os fretes marítimos voltaram a subir no mercado internacional. Carlini observa que as commodities agrícolas se destacam dos metais neste momento. "Mesmo na crise, as pessoas continuam comendo", diz. O Baltic Dry Index (BDI), que acompanha o comportamento dos fretes de cargas secas para três tipos de navios (capesize, panamax e postpanamax) das principais rotas internacionais, registra queda de 72% desde setembro, pico da crise. Em 2008, acumulou desvalorização de 91,5%. Mas, no acumulado deste ano até sexta-feira, já registra forte recuperação: alta de 146,5%.
Com a retomada dos negócios, que em parte depende da manutenção do apetite chinês, as operações não ficam restritas ao mar. Os fretes rodoviários e ferroviários no país também voltaram a se aquecer. "Houve um desaquecimento generalizado por fretes durante a crise e que já começa a ser retomado no mercado interno", diz José Eduardo Holler Branco, especialista em frete do Sistema de Informações de Fretes (Sifreca), ligado ao Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq).
No mercado interno, os negócios também começam a ganhar corpo com a retomada dos embarques de soja e açúcar. E no caso do açúcar, a valorização do dólar sobre o real é determinante para que as exportações estejam se mantendo aquecidas mesmo durante a entressafra no Centro-Sul do país. Desde setembro, a moeda americana acumula valorização de 39% (PTax). No ano passado, as usinas realizaram exportações para cumprir seus contratos. No início deste ano, com estoques altos, os negócios continuam aquecidos.
No caso do álcool, a transferência do combustível do Centro-Sul para o Norte e o Nordeste do país está reaquecendo os negócios rodoviários para o produto, diz Marcelo Andrade, da divisão de logística da Ecoflex Trading, com sede no Rio. Durante a crise, os preços permaneceram inalterados, com o agravante da maior oferta de caminhões disponível no mercado.
Para Francisco de Lavor, presidente do Grupo União, as recentes altas dos preços dos fretes ocorrem por conta da retomada dos negócios, mas as cotações no mercado internacional sobretudo não deverão ser tão altas, como o observado no início de 2008, ainda antes da crise se agravar. "A retomada agora faz parte também de um movimento sazonal de cada cultura".
Ainda que sob a perspectiva de produção menor que a do ciclo 2007/08, que teoricamente reduziria a demanda por transporte – e, portanto, seu custo – o escoamento da safra de grãos em Mato Grosso começou com o pano de fundo de uma nova onda de altas dos gastos com transporte. "O frete atingiu picos de custos em 2008. Ainda não estamos vendo novos picos, mas eles devem se repetir", diz Seneri Paludo, superintendente do Instituto Mato-Grossense de Economia Agrícola (Imea).
Segundo dados da entidade, o custo médio para o frete rodoviário de soja entre Sorriso (MT) e Paranaguá (PR) chegou a R$ 185 por tonelada em 13 de fevereiro, uma alta de 16% no mês. "No ano passado, o pico foi de R$ 220 por tonelada em março, auge do escoamento da safra. Esse patamar pode se repetir este ano", afirma Paludo. Entre Rondonópolis (MT) e Paranaguá, a alta no mesmo intervalo foi de 22%, para R$ 140 por tonelada.
Mesmo com a perspectiva de queda na produção, há espaço para alta do custo do frete, avalia o superintendente, porque as margens de comercialização da soja estão maiores no momento do que estavam na mesma época da safra 2007/08. "É lei de oferta e demanda", diz. "Se a margem do produtor está maior, o transportador sabe que pode cobrar um pouco mais".
Mesmo que a receita com frete suba ao longo do escoamento da safra, a margem dos transportadores continua apertada, em especial por conta dos gastos com manutenção exigidos com a deterioração das rodovias, segundo Miguel Mendes, diretor-executivo da Associação dos Transportes de Carga do Mato Grosso (ATC). "Em muitos locais, o transporte é feito abaixo do preço de custo", diz.
Se a projeção de alta do frete rodoviário se confirmar no escoamento da safra, o custo do ferroviário seguirá o mesmo caminho. Os contratos são fechados com base no preço praticado no transporte rodoviário. Em 2008, o custo do transporte ferroviário por quilômetro foi de 70% do rodoviário, mas, se adicionados os gastos com transbordo, a diferença real fica entre 10% e 20%, diz Paulo Fleury, diretor geral do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos) e professor titular de logística da UFRJ.
Fleury acredita em alta dos custos dos fretes rodoviário e ferroviário nesta safra depois das fortes baixas do segundo semestre de 2008. Os patamares, no entanto, não deverão repetir os recordes registrados há um ano. "A crise econômica reduziu a demanda por transporte", avalia.