O governo já tem pronto o regulamento de um novo fundo soberano, destinado a absorver o excesso de dólares no mercado, com o lançamento de títulos de longo prazo do Tesouro Nacional. A decisão de oficializar esse fundo não foi tomada, porém, porque nem o Ministério da Fazenda, onde foi elaborado o regulamento, nem o Banco Central têm segurança se seria conveniente haver um novo agente oficial no mercado de câmbio, além do BC. Tudo seria feito de comum acordo com a autoridade monetária. Trata-se de uma medida de precaução: se houver decisão, o governo não perderá tempo na elaboração de um modelo.
Essa ideia vem sendo alimentada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, desde o ano passado. Ele pretendia, no mesmo ato legal que fosse criar esse fundo, autorizar o Tesouro a comprar dólares no mercado doméstico. Hoje o Tesouro só pode comprar dólares no valor da sua dívida externa a vencer doze meses a frente e quem opera no mercado de câmbio é apenas o Banco Central. O ministro chegou a conversar com o presidente do BC, Henrique Meirelles, sobre esse assunto em maio de 2008.
Agora, o que é consenso no governo é a convicção de que os próximos meses serão de aumento progressivo de investimentos externos no País. Sem uma ação decisiva, a entrada desses dólares, estimada em até US$ 25 bilhões até dezembro, poderia criar uma “bolha cambial”, pressionando fortemente para baixo a cotação da moeda americana. Ao comprar os dólares que entram no País, incorporando-os às reservas cambiais, o BC aumenta a quantidade de reais no mercado que ele enxuga por meio das chamadas “operações compromissadas”, lançando títulos de dívida de curto prazo, a maior parte inferior a duas semanas.
O uso das compromissadas aumenta a dívida pública. Além disso, atrela o custo da dívida pública ao humor do mercado, ao depender de títulos de curto prazo para neutralizar os efeitos das compras de dólares sobre a oferta de dinheiro na economia. Títulos de prazo mais longo, emitidos pelo Tesouro sob a administração do novo fundo, permitiriam um planejamento maior e redução dos custos da política de “esterilização” das reservas cambiais.
Os mecanismos hoje atuantes são eficientes, mas podem perder a eficácia para absorver fluxos de centenas de bilhões de dólares, como se imagina para o Brasil nos próximos anos, comenta um integrante da equipe econômica.
A tranquilidade com que o mercado aceitou a decisão de se criar um fundo soberano para absorver a receita adicional com o petróleo das camadas pré-sal mostra, na avaliação de economistas do governo, que não se vê problemas em lançar títulos do Tesouro Nacional para absorver o afluxo de dólares adicional provocado pela exportação de commodities. A lógica que sustenta a ideia de um novo fundo é a de que o raciocínio aplicado às commodities pode perfeitamente ser aplicado aos ingressos de dólares provocados pela especulação com as boas perspectivas da economia brasileira.
Para o lançamento desse novo fundo, seria necessário ter regras claras de intervenção no mercado, e a segurança de que a autorização para o lançamento de títulos pelo Tesouro, ao lado dos emitidos pelo BC, não seria entendida como sinal de que o governo estaria disposto a manipular o câmbio arbitrariamente.
O governo tem realizado estudos para avaliar os efeitos da valorização sobre a economia real, que indicam não haver um patamar ideal para a moeda; tudo depende do ponto de partida do movimento de valorização ou desvalorização. A apreciação do real ajuda os investimentos ao baratear a aquisição de máquinas e insumos importados, mas, a partir de certo limite, desestimula investimentos e afeta a capacidade produtiva do país; a desvalorização do real protege as empresas da concorrência estrangeira, mas, a partir de certo ponto, prejudica a indústria por tornar inviáveis custos de insumos e equipamentos.
Ontem (08/10) o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que não gosta do real excessivamente valorizado e avisou que as compras de dólares continuarão “agressivas”. Depois de participar do 8° balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), comentou que o País está pagando o preço de ser uma economia sólida que saiu fortalecida da crise. Isso, na visão dele, atrai mais capitais e, no exterior, há entusiasmo com a segurança que o Brasil dá aos investimentos. Esse cenário pode trazer forte fluxo de recursos, mas isso ainda não ocorreu, na opinião dele. Segundo as informações do BC, as reservas internacionais chegaram a US$ 226,56 bilhões em 7 de outubro.