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Conjuntura

O Brasil e a crise

<p>Setores dependentes da exportação mantêm piores resultados. No Brasil pós-crise, consumo ajuda, mas produção ainda patina.</p>

Um ano depois do agravamento da crise global, parte do Brasil voltou ao que era antes da quebra do Lehman Brothers e parte ainda não recuperou as perdas. Cento e noventa e seis mil trabalhadores ainda não retomaram os empregos perdidos no mercado formal até julho, a indústria de automóveis produz cerca de 25 mil veículos a menos todos os meses, as concessões de empréstimos para as empresas estão 9% abaixo do registrado antes do agravamento da turbulência e 10,5 mil contêineres deixam de ser movimentados mensalmente no porto de Santos.

Por outro lado, as concessionárias de veículos venderam, em agosto, 13.300 carros a mais que um ano atrás, situação que se repete em outros segmentos do varejo. Menos afetado pela crise, o consumo interno de junho, medido pelo volume de vendas do IBGE, foi 2,6% maior que o de setembro do ano passado, na série livre de influências sazonais. No mercado de trabalho, a renda resistiu bem e o rendimento médio dos trabalhadores em junho ficou 3,4% acima do registrado no mesmo período de 2008, já descontada a inflação.

Mesmo com esses contrastes, há um processo consistente de recuperação da economia em curso. A retomada deve ficar evidente nos números do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, que o IBGE divulga hoje (11/09). A expectativa dos analistas é de uma alta entre 1,5% e 2% em relação ao primeiro trimestre, na série livre de influências sazonais. Confirmado o resultado, a economia deixará para trás a recessão, caracterizada por dois trimestres seguidos de retração.

Os analistas destacam o comportamento extremamente divergente da indústria e do comércio na resposta à crise. As vendas no varejo mantiveram o fôlego, sustentadas pela massa salarial e pelas medidas adotadas pelo governo, como a redução do Imposto sobre Produtos Industriais (IPI) para veículos e linha branca, diz a economista-chefe da Rosenberg & Associados, Thaís Marzola Zara.

Para completar, a redução dos depósitos compulsórios dos bancos pelo Banco Central (BC) ajudaram a restabelecer o crédito – a concessão de empréstimos para a pessoa física voltou a crescer com mais força, superando o volume registrado em setembro de 2008. A redução da taxa Selic de 13,75% para 8,75% ao ano também teve algum papel nesse processo, embora o impacto deva ser maior nos próximos meses. “Esse conjunto de medidas ajudou a manter a demanda interna num ritmo mais forte.” De janeiro a agosto, as vendas de veículo aumentaram 2,7% em relação a igual intervalo de 2008, indicando o sucesso da redução do IPI e também da melhora do crédito, já que boa parte das vendas de automóveis é feita por financiamentos.

Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, a renda teve de fato um comportamento melhor do que o esperado, mesmo com a piora do mercado de trabalho. “Houve um deslocamento do consumo, com a compra de produtos de menor valor, mas o volume de vendas seguiu num nível razoável”, afirma ele.

A situação na indústria, porém, foi bastante diversa. Quando a crise se agravou, a maior parte dos setores estava com estoques elevados, porque apostava que a demanda continuaria crescendo a um ritmo forte. Mas a demanda externa “tombou”, como lembra Thaís. De janeiro a julho, o volume de exportações caiu 12,6% na comparação com o mesmo período de 2008.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, também destaca o impacto negativo da retração da demanda externa sobre a indústria, ressaltando o efeito sobre os exportadores de manufaturados. Nesse segmento, o volume de exportações recuou 27,4% de janeiro a julho em relação a igual período de 2008, uma queda muito expressiva.

“A redução do investimento também produziu estragos na indústria, afetando o segmento de bens de capital”, acrescenta ele. As incertezas quanto à demanda futura, associadas à maturação de inversões feitas nos anos anteriores, derrubaram a disposição das empresas em apostar no aumento da capacidade produtiva. As estimativas apontam para um tombo superior a 10% na formação bruta de capital fixo (medida do que se investe na construção civil e em máquinas e equipamentos) neste ano.

Os exportadores de commodities sofreram menos, graças principalmente às compras da China, diz Vale. Nos sete primeiros meses de 2009, o volume de vendas externas de produtos básicos cresceu 6,5%.

O mau desempenho da indústria levou a um forte encolhimento de postos de trabalho no setor, especialmente no período entre novembro e janeiro, diz o economista Fábio Romão, da LCA Consultores. “O ajuste foi rápido e intenso na indústria.” A situação melhorou um pouco a partir de abril, segundo ele, com o encerramento do processo de fechamento de vagas, no saldo de contratados e demitidos. Em julho, já houve a criação de 19,9 mil empregos na indústria e Romão estima que foram geradas mais 40 mil em agosto, reduzindo o estoque de vagas perdidas.

No setor de serviços e na construção, o quadro foi bem mais positivo, o que garantiu que o mercado de trabalho não fosse tão ruim na crise, diz ele. No geral, o total de empregos formais no país recuou apenas 0,5% entre agosto de 2008 e agosto de 2009. “A taxa de desemprego médio deve ficar em 8,2% neste ano, pouco acima dos 7,9% de 2008. É um resultado bastante razoável, dado o tamanho da crise”, avalia Romão.