Um ano após enviar um projeto de lei ao Congresso, o governo fechou acordo com empresas seguradoras, resseguradoras e ruralistas para criar um Fundo de Repartição de Perdas (FRP) que garantirá as operações do seguro rural em casos de catástrofes nas lavouras do País, como estiagens, geadas, enchentes e trombas d’água.
O relator do projeto na Câmara dos Deputados, Moacir Micheletto (PMDB-PR), substituirá a proposta inicial do governo por um novo texto a ser apresentado em 5 de agosto. A proposição para garantir solvência ao sistema de seguro rural deve ser votada em plenário até o próximo mês de setembro.
Alinhavado em conjunto com os ministérios da Fazenda e da Agricultura, o texto permitirá ao governo emitir títulos do Tesouro Nacional e colocar recursos do Orçamento da União no “fundo de catástrofe”. A medida, prevista para entrar em vigor no próximo ano-safra 2010/11, complementará o atual modelo de seguro, composto pelo subsídio à metade do prêmio pago pelo produtor e o zoneamento agrícola – instrumento de orientação obrigatória sobre as melhores épocas e regiões de plantio.
A União terá 90% das cotas do fundo neste início de operação. Com o tempo, sairá do negócio aos poucos, deixando o mercado fazer seu trabalho. A negociação, ainda em andamento, prevê um aporte de R$ 3 bilhões a R$ 5 bilhões em recursos da União. Assim, o governo espera estimular os negócios e elevar a cobertura do seguro rural dos atuais 3% para 70% dos produtores nos próximos 20 anos.
O desafio do setor será convencer os produtores de baixo risco, sobretudo do Centro-Oeste, a aderir ao novo sistema. Além disso, a cobertura precisará ser estendida aos segmentos florestal, pecuário e aquícola da produção. “A agricultura será outra depois desse fundo. Chega de renegociações e rolagens de dívida. O fundo vai dar consistência ao seguro”, prevê Micheletto. O FRP será, segundo ele, “autossuficiente” após dez anos de operação.
O novo fundo será instituído por meio de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), gerida em sistema de parceria público-privada. Ao contrário do que ocorre hoje com o Fundo de Estabilidade do Seguro Rural (FESR), o dinheiro do novo fundo não poderá ser bloqueado pelo governo. Assim, a seguradora obterá rapidamente os recursos para cobrir eventuais perdas e indenizar o produtor. “O sistema vai ganhar credibilidade e mais gente vai querer entrar”, afirma Micheletto.
Para deslanchar as operações, as seguradoras poderão adquirir uma cobertura suplementar como proteção extra. Nesse modelo, as empresas contratariam até duas ou três vezes o valor do prêmio cobrado dos produtores. São os chamados contratos “stop-loss”. As seguradoras concordaram em pagar um prêmio ao fundo que seria proporcional ao risco da carteira e equivalente ao cobrado dos produtores. Esses recursos servirão para realimentar o “fundo de catástrofe” e evitar eventual dilapidação do patrimônio. O fundo socorrerá as seguradoras quando houver um “sinistro” acima de 1,5 vezes o valor segurado.
O FRP também poderá fazer o resseguro dessas coberturas suplementares. Pelo texto, as companhias seguradoras ficam impedidas de fazer a chamada “seleção adversa” para evitar a retenção de apólices de baixo risco em detrimento dos clientes de riscos mais elevados. O modelo será um “incentivo implícito” para ajuste das seguradoras. Hoje, poucas seguradoras operam com seguro rural. “E o patrimônio delas é insuficiente para eventuais catástrofes”, diz o deputado. A Aliança do Brasil, vinculada ao Banco do Brasil, tem 60% do mercado. “Hoje, falta oferta de seguro e o fundo será um ‘colchão’ para estimular isso”.
Faltam, ainda, duas questões para resolver no desenho do novo fundo. As seguradoras querem isenção de PIS-Cofins em suas contribuições ao fundo. E também pedem a dedução desses aportes no Imposto de Renda. Os detalhes serão tratados na regulamentação da lei e no estatuto do fundo. O texto da lei permitirá ao governo bancar a criação do Núcleo de Estudos do Seguro Rural em parceria com seguradoras, o que ajudará a formar mão de obra no setor, além de padronizar critérios de avaliação de perdas e determinação do valor do prêmio a ser cobrado.