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Crise financeira interrompe valorização de terras no País

<p>Investidor permanece apreensivo em realizar aquisição de terras, investimento de baixa liquidez.</p>

Redação (25/11/2008) – Depois de 24 meses de forte valorização, o preço das terras no Brasil parou de subir. Relatório da consultoria AgraFNP mostra que este mercado estagnou e que a tendência é de que essas cotações comecem a declinar daqui em diante. A boa notícia é que, diferentemente do que ocorreu na última forte crise da agricultura, na safra 2003/04, esse recuo não deve ocorrer na mesma proporção da derrocada dos preços da soja, que desde junho retraíram-se 34% no mercado internacional.

Em setembro e outubro, o preço dos imóveis rurais não recuou, mas o forte movimento de alta que vinha sendo observado começou a desacelerar, conforme explica Jacqueline Bierhals, analista do mercado de terras da consultoria. No bimestre, o valor médio do hectare foi de R$4,341 mil, praticamente estável em relação ao bimestre anterior (julho-agosto), quando o hectare valia, em média, R$ 4,334 mil.

Apesar de prever um desaquecimento, a especialista não aposta em quedas acentuadas nos preços de terra como ocorreu a partir de 2004 até meados de 2005. Naquele período, o valor médio do hectare no Paraná (Cascavel) recuou 46%, de R$ 21,2 mil para R$ 11,3 mil, muito próximo da retração do preço da soja nesse período, quando a média da saca no Brasil caiu 45%, de R$ 62,75 para R$ 34,43.

"Temos agora fundamentos mais fortes, tanto de demanda mundial, marcada pela presença da China, como no próprio mercado de terras do Brasil", explica Jacqueline. Ela se refere ao fato de o Brasil ainda ser um dos poucos países no mundo onde há ainda terras para expandir cultivo. "A percepção dos fundamentos está um pouco diferente agora, do que na crise da safra 2003/04. A economia dos países emergentes está mais estruturada", acrescenta. Além disso, os países que produzem muito alimento estão no limite de sua ocupação de terras, na avaliação de Jacqueline. "E o Brasil é um dos poucos lugares no mundo onde há áreas que podem ser usadas para agricultura e pecuária".

No entanto, a estagnação dos preços – e do mercado – neste momento mostra também a apreensão do investidor (mesmo os mais capitalizados) em realizar aquisições de terras, investimento de baixa liquidez. "Por um lado você tem o investidor que não quer engessar o dinheiro em uma grande fazenda. De outro, o dono dos imóveis que, ainda, não estão superpressionados para vender, apesar da crise", explica Jacqueline.

O aumento da inflação, outro reflexo da crise, também vem retirando um pouco da atratividade desse investimento. Nos últimos 12 meses, a valorização média de terras no País foi de 12,5%. Descontando-se a inflação, houve ligeira queda de 0,1%, o que significa que já começa a haver perda de patrimônio, segundo Jacqueline. Na comparação com os últimos 36 meses, quando um hectare valia no Brasil, em média, R$ R$ 3.082, a valorização foi de 40,9% que, descontada a inflação acumulada de 23,6% no período, resulta em ganho real de 5,4%.

Fusões rurais

A grande movimentação de compra e venda de terras é esperada para o ano que vem. Mais especificamente, após a efetivação da colheita, na avaliação de Jacqueline. "No momento em que a safra for colhida e os prejuízos consolidados, esse mercado vai se aquecer com muitos produtores, sobretudo do Centro-Oeste, se desfazendo de suas terras para quitar débitos". Em Mato Grosso esse movimento começou, ainda com pouca intensidade e, entre grandes produtores rurais, deve resultar em fusões, inclusive com sócios estrangeiros, sem experiência agrícola.

O produtor Orcival Guimarães, vendeu duas fazendas em Lucas do Rio Verde (MT) e está colocando 50% do seu patrimônio à venda para levantar capital para quitar débitos de safras passadas. "O comprador das fazendas será meu sócio na próxima safra, que será cultivada em 2009. Não posso revelar o nome, mas o capital será estrangeiro e equivalente a 50% do negócio. É esse modelo que vejo como alternativa para conseguir sobreviver na atividade", avalia Guimarães.

As duas propriedades que vendeu – uma de 3,8 mil hectares e outra de 700 mil hectares – foram negociadas há 90 dias para pagamento de parte dos débitos e para custear 30% da safra. "O restante da lavoura foi financiado por bancos e negociação com os parceiros da área de insumos. Tive que vender porque estava pagando juros muito altos de débitos em atraso. Além disso, atrasar pagamentos traz perda de credibilidade no mercado e chega hora que a melhor alternativa é vender patrimônio", conta Orcival.O produtor, que também é concessionário de uma empresa de máquinas agrícolas, vai ficar com outras duas fazendas – uma de 10 mil hectares e outra de 12 mil. "Isso até a hora que aparecer oportunidade de venda. Quero reduzir meu imobilizado, preciso aumentar meu capital de giro, ficar independente de dinheiro de terceiros", afirma.

Para esta safra, Guimarães vai cultivar 34 mil hectares de soja, 6,2% a mais que no ciclo anterior e 18 mil hectares de milho safrinha, 20% mais. Como contrapartida, não plantará mais algodão, cuja área foi de 14 mil hectares (safrinha) na safra passada.

Para Guimarães, esse modelo de fusão deve se expandir em Mato Grosso, pois o produtor poderá quitar seus débitos, sem sair da atividade, capitalizando em cima de seu know how no cultivo. "O descasamento entre o câmbio de plantio e de colheita das últimas safras foi catastrófico para a agricultura, mas temos que reconhecer que quando o dólar estava em R$ 3,80 pisamos demais no acelerador, fazendo muitos investimentos. Não faria tudo de novo", afirma.

Aperto na fiscalização, valoriza áreas para reserva legal
A maior rigidez nas leis ambientais e o aperto na fiscalização provocaram forte alta em preços de terras em regiões com bioma amazônico, onde a lei obriga a manutenção de reserva legal de 80% da área. De acordo com levantamento da AgraFNP, o valor médio de um hectare em algumas dessas regiões chegou a aumentar cinco vezes em 12 meses. É o que ocorreu em Paragominas (PA).

Jacqueline Bierhals, especialista da consultoria, conta que um hectare nessa região – considerada mata de fácil acesso – saiu de R$ 240 há um ano para R$ 1 mil no bimestre de setembro e outubro deste ano. "Essa região é forte produtora de grãos no Pará e lá somente 20% da área pode ser ocupada com atividade agropecuária. Assim, os produtores compram terras vizinhas para manterem com floresta, para compensarem o desmate acima do permitido na área ao lado", explica Jacqueline.

A valorização também foi intensa em outras regiões de mata, como em Macapá, onde o hectare saiu do patamar médio de R$ 15 para R$ 200. "São áreas que valem mais com mata em pé do que com a floresta derrubada. Trata-se de um mercado que se valorizou bastante, mas deve estar perto de seu limite", avalia a especialista.

Outros nichos
Nos últimos doze meses, também houve forte valorização nos preços de terras em Santa Catarina, puxada pela, até então, alta nos preços do grãos e pela forte presença de grandes indústrias integradores de aves e suínos. De acordo com o levantamento da AgraFNP, o hectare médio em Santa Catarina saiu do patamar de R$ 4,9 mil há 12 meses para R$ 13 mil neste ano.