Bandeira do governo Lula desde o início do segundo mandato do presidente, em 2007, o plano de conquistar a autossuficiência nacional em fertilizantes em um período de três anos é tão ambicioso quanto impossível de ser cumprido, segundo avaliação de analistas e executivos ouvidos pelo Valor.
Ambicioso, porque é historicamente elevada a dependência brasileira de produtos importados, ainda hoje responsáveis por atender, em média, a cerca de 65% da demanda nacional. Impossível, porque os projetos na área têm prazo de maturação de quatro ou cinco anos, e isso sem intempéries financeiras ou ambientais, o que é difícil em uma área intensiva em capital e que envolve mineração.
Do ponto de vista financeiro, afirmam especialistas, os incentivos fiscais prometidos certamente serão necessários. Planos já “precificados” de exploração de novas jazidas de potássio ou de fosfato no país deverão exigir aportes da ordem de R$ 2 bilhões. E são projetos anunciados há anos, que até agora pouco evoluíram, apesar do aumento da pressão do governo.
No caso do potássio, o projeto em questão está nas mãos da Petrobras e envolve uma jazida na Amazônia, às margens do rio Madeira. A canadense Falcon também faz pesquisas em área próxima. A Vale, que preferiu não conceder entrevista, está ampliando a capacidade de produção de cloreto de potássio em Sergipe, de 800 mil toneladas para 2 milhões de toneladas. O projeto deve ser concluído em três anos, mas já está em curso.
No fosfato, o investimento, em Patrocínio, Minas Gerais, foi anunciado pela Fosfertil, cujo controle recentemente passou para a Vale quando esta adquiriu os ativos minerais da divisão de adubos da americana Bunge no país. Há outro plano envolvendo uma jazida de fosfato na região metropolitana de Florianópolis, que enfrenta forte resistência de ambientalistas.
Potássio e fosfato são duas das três fontes básicas de nutrientes para a produção de fertilizantes agrícolas. A terceira é o nitrogênio, frente na qual a Petrobras também tem planos. A estatal promete fazer a terceira Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen) – as outras são na Bahia e Sergipe -, mas ainda não definiu a localização.
“Quando players do peso de Vale e Petrobras entram no jogo e prometem ampliar investimentos em expansão da produção brasileira de fertilizantes, ninguém duvida. Mas as coisas não são tão simples assim. Há projetos que estão por aí há anos e não saíram do papel. E não pela falta de dinheiro, mas pelas incertezas em relação ao retorno do investimento”, afirma um executivo.
Ao vender seus ativos minerais para a Vale, a Bunge reiterou que a nova era de investimentos globais na exploração de jazidas de fertilizantes, que está começando, é liderada por grandes mineradoras. A Vale é uma delas. A australiana BHP Billiton é outra, mas até agora o grupo está concentrado em outros países.
Para Carlos Eduardo Lustosa Florence, diretor-executivo da Associação dos Misturadores de Adubos do Brasil (AMA-Brasil), o mais importante, no momento, é entender exatamente que tipo de incentivo fiscal será oferecido pelo governo para que as empresas se sintam estimuladas a investir.
Esses incentivos, conforme duas outras fontes, terão de vir associados à isonomia tributária entre produção nacional e importações, tendo em vista que os fertilizantes que vêm de fora não pagam ICMS e têm vantagem, uma vez que os preços no país são definidos no mercado internacional.
“Para competir com importados, temos que dar desconto. Em Mato Grosso, o desconto é de 5%; em São Paulo e Minas Gerais, chega a 8%”, afirma um gerente de vendas de uma companhia.
O alinhamento com os preços internacionais, avaliam especialistas, não mudará nem com a autossuficiência defendida com unhas e dentes pelo ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, porque a referência continuará no exterior e os custos de oportunidade seguirão sendo definidos com os olhos em outros países.
Para o secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, Sérgio Barroso, não ficou claro se o benefício fiscal planejado pelo governo valerá para toda a indústria de fertilizantes. O Estado negocia com a Petrobras a instalação de uma fábrica de amônia, derivada do nitrogênio, no Triângulo Mineiro. Minas também conta com reservas de fosfato em Patrocínio e Serra do Salitre, no Alto Paranaíba.