Aproveitando a discussão da reforma tributária no Congresso, senadores da Região Nordeste querem buscar mais receitas para seus estados, que são grandes produtores de energia renovável e enfrentam problemas financeiros. O senador Marcelo Castro (MDB-PI) sugere a criação de royalties sobre energia solar e eólica na forma de uma emenda à proposta de simplificação dos impostos.
A proposta incluiria na Constituição, como “bens da União”, os “potenciais de energia eólica e solar” e permitiria a possibilidade de cobrança de participação ou compensação financeira, em articulação com os estados, na exploração desses recursos. Já a definição da alíquota dos royalties seria feita por meio de lei, que exige maioria simples na Câmara e no Senado, bem como os critérios de divisão desses recursos entre União, Estados e municípios.
Para o senador Marcelo Castro, essa proposta não seria diferente dos royalties cobrados sobre petróleo, minérios e cursos de água com potencial de geração de energia. “O que muda é o fato de que a energia solar e a eólica ainda não eram viáveis em 1988, quando a Constituição foi feita. O vento não é propriamente uma jazida, mas tem em alguns lugares e em outros não. A minha emenda tenta fazer com que os Estados com potencial de vento e sol tenham algum benefício, já que hoje eles não têm nenhum”, disse.
Para o secretário estadual de Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha, é preciso algum tipo de compensação – seja royalty ou imposto – aos Estados produtores, em razão das dificuldades de caixa que os governos vivem, pela transição rápida em direção a uma matriz limpa e pela desoneração de bens de capital usados na produção de energia, como baterias e turbinas de eólicas.
A cobrança de royalties sobre sol e vento traz discórdia. A taxa tem como origem uma solução econômica para resolver conflitos de direito de propriedade. No Brasil, a Constituição definiu que a posse de petróleo, gás natural, minérios e da água utilizada para geração de energia é da União – e o pagamento de royalties seria uma compensação pela cessão desse direito de propriedade a terceiros.
A taxa é cobrada pelos bens finitos, como petróleo, gás e minérios, e o fim da exploração tende a inviabilizar a economia das regiões atingidas. No caso das hidrelétricas, quase sempre há impactos irreversíveis nas áreas alagadas e que inviabilizam outras atividades – nesse caso, a cobrança se dá sobre a geração de energia, e não sobre a água em si. Em todos os casos, o royalty funciona como uma compensação às localidades atingidas.
Especialistas afirmam que não há como comparar essas situações com a geração de energia solar e eólica. Vento e sol são recursos infinitos e sua exploração não inviabiliza outras atividades econômicas. Além disso, não há conflito de propriedade, pois outras pessoas podem utilizar, ao mesmo tempo, os recursos para outras finalidades – entre elas aquecer água para chuveiros e mover moinhos de trigo, por exemplo.
Contrária à medida, a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Élbia Gannoum, considera o conceito de royalty sobre vento inadequado. “O mesmo vento que gera energia bagunça os meus cabelos. Vamos ter de pagar pela brisa? Se o sol e o vento pertencem a alguém é a Deus”, disse. “Quem vai pagar essa conta é o consumidor. Estarão taxando energia limpa no Brasil, enquanto o resto do mundo incentiva essa produção.”
Da mesma opinião segue o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), Rodrigo Sauaia, afirmando que não há fundamento jurídico nem técnico para esse tipo de taxa sobre a energia solar. “O sol é um recurso renovável, disponível e de uso democrático”, afirma. “O sol é também um recurso imprescindível para agricultura e traz competitividade para a produção nacional. Vão taxar o agronegócio?”, questionou.
Uma alternativa à proposta, para contribuir com os Estados produtores, é a do senador Jean-Paul Prates (PT-RN). A ideia é uma redistribuição dos recursos arrecadados com ICMS sobre energia, hoje concentrados no destino, para a origem. “Essa proposta reequilibraria a arrecadação entre os Estados e beneficiaria o Nordeste”, explicou.