Quem disse que o sorgo, costumeiramente utilizado no Brasil e na maioria dos outros países como ração para os animais, não pode servir de alimento para o ser humano? É o que pretende incentivar cientistas da Embrapa Milho e Sorgo (MG), que vêm trabalhando em pesquisas que atestam o valor nutricional deste cereal para o organismo das pessoas.
“Embora o sorgo seja utilizado como base alimentar de milhões de habitantes, principalmente da África e Ásia, no Brasil e na maioria dos demais países utiliza-se este cereal basicamente na alimentação animal. Entretanto, ele vem despontando como alternativa altamente viável como alimento para os humanos devido, especialmente, ao fato de não possuir glúten. Sendo assim, ele é totalmente seguro para o desenvolvimento de produtos para os celíacos, ou seja, para indivíduos com intolerância a glúten”, relata a nutricionista Valéria Aparecida Vieira Queiroz, pesquisadora da área de Segurança Alimentar, Nutrição e Saúde da unidade mineira da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
Outra vantagem do sorgo para a alimentação de humanos gira em torno de seu valor nutricional, semelhante ao do milho, mas com sabor neutro, o que é bom para a indústria de alimentos. “Este cereal ainda apresenta menor custo de produção, vislumbrando a possibilidade de redução dos custos na indústria alimentícia; e também possui uma variedade de compostos bioativos, com elevada capacidade antioxidante e forte potencial para utilização em produtos com apelo funcional, ou seja, de promoção da saúde”, ressalta Valéria.
Menos defensivos
A nutricionista destaca que o sorgo é uma planta maior de sistema radicular e seu cultivo demanda menor quantidade de defensivos agrícolas, em comparação a outros cereais, como o milho, por exemplo. “Este fato possibilita a produção dos grãos com menor quantidade de resíduos químicos e com menor custo, o que poderá contribuir para a segurança alimentar. Além disto, há relatos de que o problema da contaminação de cereais com micotoxinas, especialmente aflatoxinas e fumonisinas, seja bem menos intenso na cultura do sorgo, quando comparado ao milho.”
Por outro lado, o aumento progressivo de casos de doença celíaca tem resultado em uma demanda ascendente por novos produtos isentos de glúten, já que o tratamento para a doença consiste na exclusão total desta proteína da dieta. “No entanto, considerando que o trigo é o cereal mais usado na panificação, a indústria alimentícia enfrenta o desafio de encontrar matérias primas alternativas que sejam, ao mesmo tempo, isentas de glúten, de sabor neutro, nutritivas e de custo mais baixo”, pontua Valéria.
Ela ainda salienta que, atualmente, “os produtos existentes no mercado são, em sua maioria, confeccionados com farinhas de arroz, féculas de mandioca ou de batata, amido de milho – ou com as misturas delas”. “Estes custos são elevados, além de não serem integrais, fato que resultam em produtos com preços finais muito altos e baixos valores nutritivos.”
Benefícios
De acordo com a nutricionista, este fato predispõe os celíacos a uma escassez de produtos que sejam integrais, saborosos e com preços acessíveis no mercado. “E é neste contexto que a farinha integral de sorgo, isenta de glúten e de sabor suave, desponta como alternativa totalmente viável e segura para suprir esta demanda ascendente da indústria alimentícia. Neste caso, qualquer cultivar de sorgo granífero, produzida no Brasil, pode ser utilizada para confecção de produtos sem glúten.”
Outro diferencial do sorgo é que, dependendo da cor do pericarpo (película que recobre os grãos, que pode ser branco, vermelho, bronze, marrom e preto), seus grãos produzem farinhas de cores distintas.
“Esta característica, se for bem explorada pela indústria de alimentos, poderá ser mais uma qualidade do sorgo. Um exemplo disto é que os cereais matinais de sabor chocolate, obtidos de sorgo de pericarpo vermelho ou marrom, não necessitam da adição de corante alimentício. Tendo em vista que o consumidor está buscando alimentos mais naturais, sem uso de aditivos, este seria um grande benefício”, comenta a nutricionista.