Fatores negativos que levaram o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro a recuar 0,5% na passagem do segundo para o terceiro trimestre de 2013, feito o ajuste sazonal, continuaram presentes nos últimos três meses do ano passado e frustraram expectativas de retomada mais pronunciada da economia no período. No entanto, analistas afastam a ideia de que o Brasil pode ter passado por uma recessão técnica no segundo semestre de 2013 (quando a atividade acumula dois trimestres consecutivos de queda).
Para especialistas, a manutenção da confiança em patamar baixo, o acúmulo de estoques pela indústria e avanço mais moderado do consumo levaram a economia a se recuperar apenas parcialmente do tombo observado de julho a setembro. Segundo a estimativa média de 20 consultorias e instituições financeiras ouvidas pelo Valor Data, o PIB subiu 0,3% no quarto trimestre de 2013, na comparação com o terceiro, feitos os ajustes sazonais. As projeções para as Contas Nacionais Trimestrais, a serem divulgadas amanhã pelo IBGE, vão de alta de 0,1% até 0,5%. Para 2013, a expectativa média dos economistas consultados aponta para expansão de 2,2%, acima, portanto, do crescimento de 1% visto em 2012.
O desempenho ruim da indústria no quarto trimestre frustrou expectativas de recuperação um pouco mais pronunciada da economia de outubro a dezembro, na avaliação de Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria. No início do quarto trimestre, Alessandra esperava alta de 0,5% para o PIB no período, mas o recuo de 0,8% da produção industrial em relação ao terceiro trimestre foi uma surpresa negativa. Agora, as projeções da Tendências contam com avanço de apenas 0,2% da economia na passagem trimestral, enquanto o PIB industrial deve ter caído 1,6% na mesma comparação, após alta de 0,1% nos três meses anteriores, principalmente por causa do acúmulo de estoques após o tombo na atividade no terceiro trimestre.
O volume maior de mercadorias paradas prejudicou principalmente a atividade do setor automobilístico, que teve esfriamento adicional das vendas nos últimos três meses de 2013, afirma Alessandra. Apesar do segundo semestre fraco, a indústria deve encerrar o ano com alta de 1,1%, após retração de 0,8% no ano anterior, de acordo com a média das projeções dos economistas.
Ainda pelo lado da oferta, Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, estima que o setor agropecuário contribuiu para um resultado melhor da economia no fim do ano, com alta de 0,5%, após ter recuado 3,5% entre julho e setembro de 2013, sempre na série com ajuste sazonal. Já o setor de serviços também se recuperou, mas menos, e deve ter passado de uma alta de 0,1% para avanço 0,5% na passagem trimestral. A LCA estima alta de 0,4% do PIB no quarto trimestre, em relação ao terceiro, na série com ajuste sazonal.
A possibilidade de uma recessão técnica no segundo semestre de 2013 é remota, na avaliação do economista. Para Borges, embora o Índice de Atividade Econômica do BC (IBC-Br), que procura antecipar o comportamento do PIB, tenha mostrado dois trimestres consecutivos de queda na segunda metade do ano passado, os dois indicadores nem sempre mostram variações semelhantes.
De acordo com cálculo da LCA, se a série do IBC-Br for compatibilizada pelo ajuste sazonal usado pelo IBGE para calcular o PIB, o indicador teria subido 0,2% entre outubro e dezembro, após queda de 0,5% nos três meses imediatamente anteriores. Na série oficial, o IBC-Br recuou 0,2%, tanto no terceiro quanto no quarto trimestre, sempre em relação aos três meses imediatamente anteriores.
O Itaú também considera pouco provável que o PIB volte a recuar no quarto trimestre, mas o economista Aurélio Bicalho lembra que essa possibilidade está contemplada na margem de erro de sua projeção, que é de alta de 0,3% do PIB entre outubro e dezembro. Para Bicalho, a alta de 0,4% esperada para o consumo das famílias evitou um resultado ainda pior do PIB, mas mostra que o consumo está perdendo força, em linha com o cenário de menor criação de vagas e reajustes salariais menos robustos, já que no terceiro trimestre a demanda avançou 1%.
No ano, de acordo com a média das projeções dos economistas ouvidos pelo Valor Data, o consumo das famílias deve ter avançado 2,4%, menor variação desde 2003, quando houve queda de 0,8% desse componente do PIB.
Na avaliação da MCM Consultores, o esgotamento do efeito de vários estímulos criados pelo governo para impulsionar a demanda evidenciou a fragilidade da atividade na segunda metade do ano passado, após um primeiro semestre mais forte. Do lado da demanda, a MCM espera que o destaque negativo vai partir dos investimentos. A expectativa é de retração de 2,8% da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e construção civil) na passagem do terceiro para o quarto trimestre, puxada principalmente pelo recuo de 3% da produção de bens de capital no período. No ano, o investimento deve ter subido 5,3%.
A alta dos juros, afirma André Muller, da Quest Investimentos, ainda não exerceu forte influência sobre a atividade, já que o aumento do peso dos bancos públicos na concessão de crédito tem tornado a transmissão da política monetária mais lenta. No entanto, com o aumento do nível de incerteza em função do início da normalização da política monetária americana, o investimento deve ter dado contribuição negativa para a atividade no quarto trimestre e é o principal fator de risco para sua projeção de PIB em 2014, atualmente em 2%.
Borges, da LCA, projeta queda de 4,5% da formação de capital fixo no quarto trimestre, mas avalia que esses dados são ilusórios. No período, a exportação contábil de plataformas de petróleo pela Petrobras impulsionou as exportações, que devem ter aumentado 5,1% na passagem trimestral. Como esses bens de capital não saem efetivamente do país, deveriam entrar na conta dos investimentos, diz Borges, o que levaria a formação de capital fixo a ficar estável entre o terceiro e o quarto trimestres. Já as exportações teriam andado de lado no período, diz, o que mostraria um quadro mais real do setor externo no período.
O crescimento fraco esperado para o último trimestre do ano passado deixa uma herança estatística ruim para 2014, avalia Bicalho, do Itaú. Nos cálculos do Itaú, o chamado “carry over”, que foi de um ponto percentual de 2012 para 2013, se reduzirá a 0,4 ponto na passagem do ano passado para 2014. Para o primeiro trimestre, diz, a previsão é de crescimento nulo do PIB, devido à manutenção da confiança em patamares baixos e um cenário ainda ruim para a formação de capital fixo.