O governo não pretende auxiliar as geradoras de energia que ficarem expostas ao mercado de curto prazo em decorrência do déficit no volume produzido pelas hidrelétricas, com um rombo estimado no setor em R$ 20 bilhões. Segundo o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Romeu Rufino, o risco de exposição das geradoras faz parte da “regra do jogo”.
“Esse é um risco do negócio. É por conta e risco [da geradora] a comercialização da energia. É diferente da distribuidora, que é obrigada a estar 100% contratada. A geradora é outra realidade. É a regra do jogo”, disse ontem o diretor, no 11º Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico (Enase), no Rio de Janeiro.
Rufino admitiu que existe potencialmente o risco de a geradora não produzir o volume de energia suficiente para honrar seus compromissos. Por isso, segundo ele, a geradora fica exposta ao mercado de curto prazo, cujo preço spot está hoje no patamar de R$ 800 por megawatt-hora (MWh), valor muito superior ao preço médio dos contratos dessas empresas, pelos quais elas são remuneradas.
O presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), Mario Menel, afirmou que, caso o governo adote uma medida de racionalização ou racionamento de energia, será necessário criar um mecanismo para evitar que as geradoras hidrelétricas sejam ainda mais prejudicadas. Isso porque, na prática, uma redução forçada do consumo para economizar mais água dos reservatórios implicaria necessariamente em uma produção menor pelas hidrelétricas, que ficariam ainda mais expostas ao mercado de curto prazo.
Com relação às distribuidoras, Rufino sinalizou com a possibilidade de aumentar o valor do empréstimo obtido pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), de R$ 11,2 bilhões, se for necessário. Ele, porém, disse que ainda é preciso avaliar qual foi o volume das operações do mercado em abril, que será liquidado em junho, para saber se o total obtido pela CCEE cobre a exposição das distribuidoras.
“A solução já está dada. Para toda a exposição [das distribuidoras], a solução que está aí é a do empréstimo. Se esse volume de recursos não for suficiente, vai se buscar uma complementação de valor para cobrir”, afirmou Rufino. “Mas não sabemos o que será apurado em abril e liquidado em junho. Então não posso dizer que vamos ter todo o recurso remanescente para a liquidação de junho”, completou.
Dos R$ 11,2 bilhões adquiridos pela CCEE, R$ 4,7 bilhões foram disponibilizados para a liquidação das operações de fevereiro, feita em abril, e R$ 3,3 bilhões estão separados para a liquidação de março, que será feita em 12 e 13 de maio. Restam R$ 3 bilhões para a liquidação de abril, cujo valor ainda será apurado e será realizada em junho.
Com a realização do leilão de energia existente na última semana, o volume de exposição das distribuidoras caiu de 2,4 mil megawatts (MW) médios para 350 MW médios. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, Nelson Leite, apenas para efeito de cálculo, esse volume remanescente terá um impacto para as empresas da ordem de R$ 907 milhões, considerando uma estimativa de preço spot médio de R$ 600/MWh em 2014.
Leite contou que pretende discutir com a Aneel uma solução para o impacto previsto da ordem de R$ 1,5 bilhão no fluxo de caixa das distribuidoras relativo à diferença entre o preço médio do leilão (R$ 268/MWh) e o valor médio da carteira das distribuidoras (entre R$ 110/MWh e R$ 150/MWh). Pelas regras do setor elétrico, esse impacto só poderá ser repassado ao consumidor no reajuste tarifário de cada distribuidora. Nesse caso, as mais prejudicadas são Ampla (RJ), Cemig (MG) e CPFL (SP), que só terão novo reajuste em março e abril do próximo ano.
Rufino, no entanto, deixou claro que não haverá um novo socorro para as distribuidoras sobre esse assunto. “Há um impacto bem atenuado e que faz parte da regra. A solução será uma solução tarifária”, afirmou ele.
Com relação ao quarto ciclo tarifário das distribuidoras, Rufino sinalizou que a autarquia pretende priorizar a melhoria da qualidade do serviço das empresas, em detrimento da modicidade tarifária – uma das bandeiras do governo no modelo regulatório atual. “Modicidade tarifária é importante, mas talvez temos que por um peso maior na qualidade do serviço” explicou.
A Aneel pretende colocar em audiência pública, antes de agosto, a nova metodologia que está sendo elaborada para o quarto ciclo. O objetivo, disse Rufino, é ter definido o arcabouço legal do processo antes de iniciar as primeiras revisões tarifárias. A primeira distribuidora que passará pelo quarto ciclo é a cearense Coelce, controlada pela espanhola Endesa, em abril de 2015.