Um amplo estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da Organização Mundial do Comércio (OMC) que será divulgado hoje mostra resultados bem diferentes na balança comercial do Brasil, quando medida em termos de valor agregado. E aponta perda de oportunidades para o país ampliar exportações.
Primeiro, o superávit comercial do país com a China seria 45% menor (de US$ 12,1 bilhões para US$ 4,9 bilhões) comparado com o fluxo bruto, pois o país vende basicamente commodities usadas por exportadores chineses. Já com os EUA, o superávit seria maior do que mostram as estatísticas convencionais em 2009 (US$ 6,6 bilhões em termos de valor agregado, ante US$ 5,6 bilhões no fluxo total), e maior o destino final do consumo. Ou seja, os EUA, e não a China, seriam na prática o maior parceiro comercial do Brasil
Segundo, o conteúdo estrangeiro nas exportações brasileiras e a fatia de bens intermediários usados na exportação são menores no Brasil do que em todos os países desenvolvidos e em boa parte do resto do mundo.
De US$ 176 bilhões exportados, US$ 160 bilhões representaram o valor agregado brasileiro em 2009. “O Brasil tem um conteúdo doméstico muito importante nas exportações”, diz o analista Sebastien Miroudot, da OCDE. “É positivo na medida em que o país conserva uma ampla parte do valor que exporta, mas pode ser negativo se representa ocasiões perdidas para ser mais competitivo importando bens e serviços intermediários com custo menor.”
Terceiro, o setor de serviços tem um peso muito maior do que se pensa no comércio exterior brasileiro. Representa uma fatia significativa de valor agregado em commodities e indústrias intermediárias, e mais de 40% do total do valor agregado das exportações.
O estudo leva em conta as complexidades do comércio internacional onde o design, fabricação e montagem de produtos frequentemente envolvem vários países. Procura medir os fluxos comerciais com base no valor que é agregado (salário do trabalhador, taxas, lucros) por um país na produção de qualquer bem ou serviço que é exportado.
Constata, de maneira geral, que as cadeias globais de valor se tornaram dominante nas trocas globais. Não é só a de localização, mas de nova organização da produção, mais sofisticada, e novos consumidores nos emergentes. Outros cálculos da renda gerada pela cadeia global mostram que a parte dos emergentes aumenta. Assim, em vez de medir o valor da exportação entre dois países, procura traçar o valor até o consumidor final.
A competitividade de exportações se define por insumos baratos, estratégias de abastecimento e facilitação de importações para reduzir custos. A produção, da matéria-prima até o produto final, está crescentemente sendo feita onde há qualificação e material disponível a custo competitivo e qualidade.
Com a crescente fragmentação da produção, as tarifas acabam sendo acumuladas quando um produto intermediário passa por países diferentes.
O debate sobre estatísticas tradicionais no comércio e a medida em valor agregado pode ter consequências sérias no mundo real. E alguns emergentes, como o Brasil, acompanham o tema com bastante cuidado. Basta ver que as estatísticas atuais, que mostram enorme superávit da China com os EUA e União Europeia, alimentam batalhas políticas contra o câmbio chinês e suas alegadas práticas exportadoras desleais. Se for considerado que um produto chinês embute muito de conteúdo americano, o superávit chinês cai bastante.
Da mesma maneira, a medida em valor agregado pode facilitar argumentos de Pequim contra sobretaxas impostas pelo Brasil a seus produtos. Os chineses podem alegar que, afinal, o produto não é totalmente deles, apenas uma parte da montagem.
Conforme o estudo, os EUA são o principal parceiro comercial do Brasil e consomem 17% das exportações brasileiras em termos de valor agregado, mais do que os 15% em termos brutos. O oposto ocorre com a China, já que 60% do que o Brasil exporta para os chineses são commodities, muitas das quais terminam como produto final consumido nos EUA e na Europa.
Também em termos de valor agregado, os déficits do Brasil com países europeus e a Índia são menores.
Quanto ao valor agregado estrangeiro nas exportações brasileiras, não passam de 10% do total, refletindo o tamanho e a especialização do país em commodities e no estágio inicial da cadeia de fornecimento de produtos.
Por sua vez o setor de serviços representa parte significativa no valor de exportações de commodities e manufaturas, por exemplo em produtos alimentares, transportes e produtos de mineração. No total, os serviços representam 15% das exportações brasileiras nas estatísticas convencionais, mas 40% em agregação de valor.
As conclusões da OCDE e OMC se somam a recente estudo do Banco Mundial apontando queda na competitividade das exportações brasileiras. Essa pesquisa confirma a baixa no número de empresas exportadoras no Brasil. E aponta a falta de integração na cadeia global de produção como possível explicação para o baixo dinamismo do setor exportador brasileiro.
A extensão pela qual o Brasil está fora da cadeia global de suprimento pode ser avaliada, pelo menos parcialmente, olhando o comércio em partes e componentes, segundo o Banco Mundial.