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Logística

Paranaguá tenta zerar déficit de capacidade

Paranaguá opera hoje com déficit de 30% na oferta de capacidade.

Paranaguá tenta zerar déficit de capacidade

Porto que lidera as exportações de grãos e as importações de fertilizantes do país, Paranaguá, no litoral paranaense, desponta como uma das mais atraentes áreas para os aportes que são necessários para zerar um déficit histórico de capacidade que recorrentemente prejudica o comércio exterior brasileiro. Mas para que o porto apare as arestas que insistem em atrasar avanços nesta frente e conseguir agilizar os investimentos nos 25 terrenos que poderão ser licitados pelo governo na reforma portuária – 20 deles de áreas novas -, investidores cobram melhorias de gestão e pressionam por menos burocracia ao longo dos processos de aprovação de projetos.

A estimativa da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA) é atrair pelo menos R$ 1,6 bilhão em recursos privados com as licitações. Só na parte de grãos, um de seus principais motores de crescimento, Paranaguá opera hoje com déficit de 30% na oferta de capacidade. “Precisaríamos de seis novos terminais para o granel já. Aí a gente zera o relógio”, afirma Luiz Dividino, superintendente da APPA. Ele identifica em uma falta de planejamento nas últimas décadas o principal fator para o gargalo. Quando o Valor esteve no porto na semana do dia 12, havia 86 navios na barra à espera de “vaga”, e para entre 30 e 35 deles o problemas era justamente a falta de capacidade de recepção no porto.

Especialistas entendem, também, que a produtividade poderia aumentar em Paranaguá se o poder público saísse da operação de embarque – algo que a reforma portuária de 1993 defendeu e o convênio de delegação do porto determina. A APPA foi recentemente multada em R$ 100 mil pela Antaq, agência reguladora dos portos, por continuar na faixa portuária. Em parte do corredor de exportação de grãos, quem atua no cais é a APPA. Ali os terminais não têm berços de atracação arrendados, como em outros portos, e as instalações privadas são interligadas ao cais público com correias. Nove terminais, dois públicos e sete arrendados à iniciativa privada, conectam-se por meio de 32 quilômetros de correias em um eixo comum que desemboca em três berços públicos de atracação. Cada berço tem dois “shiploaders” públicos que embarcam as cargas nos navios.

“Esse modelo prejudica melhorias de eficiência. O ideal é que fosse feito como no Tegram [no Maranhão], em que um pool de empresas faz toda a operação”, defende Luiz Fayet, consultor de logística da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e integrante do Conselho de Autoridade Portuária (CAP) de Paranaguá. Segundo ele, há momentos em que as empresas têm de fazer “caixinha” para sanar problemas públicos no corredor. “O CAP já foi informado há anos que, para evitar paradas, as empresas que usam a estrutura pública se cotizam para fazer pequenas manutenções e evitar perder tempo com licitações”, afirma.

Atualmente, a APPA está trocando os equipamentos por modelos mais modernos, que poderão elevar a produtividade da expedição no navio em 30%. A substituição integra um plano de investimentos com recursos próprios de R$ 400 milhões. Os aportes, que deverão ser concluídos em 2014, envolvem desde a dragagem até serviços de manutenção.

Dividino concorda que não é bom o poder público dividir esse espaço com a iniciativa privada. “Mas tem o lado positivo. Foi criada a maior plataforma de embarque FOB do mundo. O afretador, o comprador, não se obriga a comprar de um só. Os três berços recebem os navios e em qualquer navio chegam duas correias de qualquer um dos terminais. Foi criada uma condição de versatilidade na operação”. No caso dos fertilizantes, que lideram a movimentação de cargas no porto, a capacidade tambem será ampliada.

Contudo, um dos maiores investimentos realizados no porto nesse ramo está pronto há quase um ano e meio e ainda não iniciou as operações. A Rocha Terminais Portuários e Logística, maior empresa de operação portuária com fertilizantes da região, espera há quatro meses o alfandegamento de seus armazéns. A empresa investiu R$ 100 milhões na modernização e na ampliação da capacidade de importação e passou a ofertar um complexo formado por quatro armazéns com capacidade estática para 400 mil toneladas.

O investimento foi realizado com a promessa de mudar a forma de escoar a carga, já que contemplou a construção de um conjunto de esteiras aéreas que se interligam ao Terminal Público de Fertilizantes (Tefer). Com as esteiras no lugar dos caminhões, aumenta a velocidade de descarga e parte das multas por sobrestadia dos navios (“demurrage”) é evitada. Um navio parado custa entre US$ 20 mil e US$ 30 mil por dia, ou quase US$ 1 por tonelada.

Entre as exigências para o alfandegamento dos terminais da Rocha, salta aos olhos as mais de 200 câmeras exigidas – e compradas – para o monitoramento dos quatro armazéns. “O porto opera com padrões africanos e exige de quem investe excelência suíça”, diz o representante de um embarcador. Estima-se que a Rocha tenha deixado de faturar de R$ 50 milhões a R$ 60 milhões desde que sua estrutura ficou pronta, mas a empresa não quis se manifestar.

A Alfândega em Paranaguá explica que os armazéns da Rocha só poderiam ser alfandegados após o mesmo processo ter sido concluído no Tefer, o que ocorreu em maio. Segundo Jackson Corbari, inspetor-chefe da Alfândega no porto, uma vez cumpridas as questões formais e técnicas da regra do alfandegamento, o ato é publicado em 15 dias, em média. “O cumprimento dos requisitos técnicos independe da Receita. E o fato de um eventual recinto ter preenchido as questões formais não quer dizer que ele tenha preenchido as questões técnicas”, diz Corbari.

A regra do alfandegamento está descrita em portaria da Receita Federal de 2011, que endureceu os critérios para terminais de contêineres ao determinar, também, o uso de scanners para vistoriar as cargas, exigência dispensada para instalações de granel. “A regra de 2011 praticamente mantém o mesmo texto dos últimos dez anos”, diz o inspetor. Há dois pedidos pendentes de alfandegamento em Paranaguá – o da Rocha e um da Cattalini, líder em movimentação de líquidos, para duas linhas que acessam o píer público.

Por conta das filas de navios, são comuns casos de embarcações carregadas com fertilizantes que desviam a rota para portos próximos. A primeira alternativa costuma ser São Francisco do Sul (SC), que recebe, em média, quatro navios por mês carregados de fertilizantes originalmente destinados a Paranaguá, informa a autoridade do porto catarinense. Em 2012, o porto paranaense recebeu 42% das 19,5 milhões de toneladas de fertilizantes importados, conforme a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda). A fatia do porto de Santos foi de 17%.

“Não é que esse navio desviou, ele já ia para lá. Ele tentou Paranaguá porque aqui o frete do caminhão é muito mais barato que em São Francisco do Sul”, diz Dividino. Segundo ele, isso ocorre porque os milhares de caminhões que levam grãos ao porto retornam vazios ao interior.

Ex-presidente do terminal privado Ponta do Félix, em Antonina, Dividino assumiu a APPA em 2012 com a promessa de modernizar Paranaguá, um dos 16 portos delegados ao governo estadual, atualmente liderado por Beto Richa (PSDB) depois de oito anos de administração do senador Roberto Requião (PMDB-PR). No governo Requião, Dividino foi diretor empresarial da APPA e diretor do porto de Antonina, o que não o livrou de herdar problemas da gestão anterior.

Contrariando o convênio de delegação do porto, que veda a operação pública, a APPA construiu o Tefer em 2008 e prometeu interligá-lo com os demais armazéns privados por meio de um chamamento público (com dispensa de licitação). O caso redundou em ações do Ministério Público e em uma CPI na Assembleia do Estado. Parte das irregularidades foi corrigida com uma resolução da Antaq, mas o imbróglio atrasou em quase quatro anos o início da operação do Tefer, o que aconteceu em julho.

Como não pode operar, a APPA permitiu que a Associação de Granéis Sólidos de Importação (Agrasip) iniciasse os trabalhos no Tefer em caráter de teste e pediu à Antaq uma orientação sobre o que fazer enquanto o terminal não é licitado – o Tefer foi incluído no programa de arrendamentos do porto. “É um abacaxi”, diz o superintendente.

O Valor entrou em contato com a Antaq para saber se já há uma posição sobre o assunto, mas não obteve resposta. A Agrasip é presidida por um representante da Rocha, a única das três empresas habilitadas no chamamento público que, até agora, efetivamente construiu instalações para se conectar ao Tefer.

Por meio de sua assessoria, o senador Roberto Requião disse que o chamamento público “foi claro e transparente, e está previsto na Lei de Licitações estadual”. E ressaltou que o governo federal, na Lei dos Portos, criou a chamada pública como uma das maneiras de estabelecer “a comprovação da inexigibilidade de licitação através do atendimento a todos os interessados”.

Sobre a operação do Tefer, disse que o Tribunal de Contas da União (TCU) estabeleceu, em 2005, que a APPA não pode fazer a carga, descarga e movimentação da mercadoria, mas “que a armazenagem é receita e faina permitida à APPA”. Apesar de servir como um armazém, o Tefer precisa ser operado, diz a APPA.

Mas, se alguns gargalos resistem, outros vêm sendo eliminados. Em julho, por exemplo, finalmente saiu, depois de anos de espera, uma licença de operação do Ibama que regularizou uma década de pendências ambientais. O projeto mais premente é a dragagem de manutenção do canal de navegação, bacias de evolução e berços, que de tão assoreados comprometem as operações.

A Paraná Operações Portuárias (Pasa), uma das maiores exportadoras de açúcar do porto, só depende da dragagem para dobrar a expedição de embarque. Para tanto, precisa substituir o atual “shiploader”, com capacidade para 1.500 toneladas por hora, por um de 3.000. “Só não trocamos o equipamento porque o berço público não tem calado suficiente para receber navios maiores, do tipo panamax”, afirma o diretor da empresa, Pérsio Souza de Assis.

A licitação para restabelecer as profundidades originais foi aberta em 13 de agosto. Seis empresas compareceram. O resultado sai em setembro. O teto do valor para a obra é de R$ 131 milhões. O canal de navegação já tem 15 metros, mas alguns pontos têm de ser recuperados. Já os berços terão a profundidade restabelecida, de 8,5 metros (a parte mais antiga do cais) para até 13 metros.