A alta do dólar frente o real não foi suficiente para proteger os produtores brasileiros da queda nos preços internacionais de algumas das principais commodities agrícolas em 2011, mas ajudou a minimizar a pressão baixista vinda das bolsas internacionais.
Levantamento realizado pelo Valor Data mostra que os preços da soja, do açúcar, do algodão e do trigo, que sofreram recuos expressivos no mercado externo no ano passado, ficaram mais baratos também quando convertidos na moeda brasileira.
Afetados principalmente pela crise de confiança entre os investidores e pelo desaquecimento da economia mundo afora, os mercados agrícolas registraram perdas expressivas no ano passado. Em Nova York, os contratos de algodão e açúcar amargaram baixas de 33,3% e 21,7%, respectivamente. Já os contratos em dólar de soja e trigo mergulharam 13,9% e 18,2% na bolsa de Chicago.
Em contrapartida, também influenciado pelo ambiente de aversão ao risco, o dólar foi na direção contrária e amorteceu o impacto da queda das commodities no mercado interno. A valorização de 12,5% na comparação com o real não foi suficiente para compensar integralmente as perdas, mas aliviou o pouso.
Convertidos em reais, os preços do algodão e do açúcar caíram 25% e 11,9%, enquanto as cotações da soja e do trigo foram reduzidos em 3,1% e 7,9%.
Ao menos do ponto de vista da relação preço-câmbio, o milho foi o grande vencedor em 2011. Embora tenha encerrado o ano muito abaixo das máximas, a commodity foi a única a fechar 2011 no azul no mercado internacional. Nos 12 meses, os contratos em dólar avançaram 2,87% em Chicago. Convertidos em reais, o avanço ficou acima de 15,8%. Os cafeicultores também não têm do que reclamar: apesar da queda de 5% em Nova York, os preços em moeda brasileira avançaram quase 7%.
Contudo, o câmbio teve uma influência decisiva sobre a manutenção dos níveis de preço domésticos quando se consideram apenas os últimos quatro meses do ano, depois que o cenário externo se deteriorou de modo acentuado, e as tendências observadas para o câmbio e os preços nos nove primeiros meses do ano foram revertidas.
De janeiro a agosto, a cotação do dólar frente o real havia acumulado uma queda de 4,7%, enquanto várias commodities ameaçavam retornar aos níveis históricos (pré-crise) de 2008. A partir do mês de setembro, o cenário mudou radicalmente.
Dali até dezembro, o dólar saltou mais de 18% e os mercados agrícolas sofreram a maior queda desde o colapso de o que se seguiu à quebra do banco Lehman Brothers, em setembro de 2008.
A soja resume bem o efeito que o câmbio teve sobre a renda dos produtores nos últimos meses. Embora os preços de referência, em dólar, tenham caído mais de 17% desde setembro, os preços de exportação, em real, cederam pouco mais de 2%. Algodão, milho, trigo, que também sofreram perdas de dois dígitos no exterior, tiveram oscilações positivas na conversão.
O analista de commodities da Jefferies Bache em Nova York, Vinícius Ito, observa que um dos efeitos do “bônus cambial” foi o aumento da competitividade brasileira e o estímulo às exportações.
Os embarques de soja, que geralmente são residuais no fim de ano, deram um salto de mais de 400% nos meses de novembro e dezembro. Só no mês passado, foram despachadas 1,46 milhão de toneladas da oleaginosa, contra 292 mil toneladas um ano antes.
“O mercado de câmbio é muito maior do que o de commodities, então é natural que o preço da soja se ajuste ao câmbio dos maiores produtores – e não o contrário”, afirma Ito. Em outras palavras, “se o real não tivesse se desvalorizado, os preços em dólar provavelmente teriam se mantido em níveis mais altos”, acrescenta.
A economista da Tendências Consultoria, Amaryllis Romano, afirma que, embora tenha dado alguma sustentação aos preços domésticos, o dólar mais alto ataca a competitividade brasileira pela via dos custos de produção. Algumas das principais matérias-primas utilizadas pela agricultura, como fertilizantes e agrotóxicos, são diretamente afetadas pelo comportamento do câmbio.
Apesar disso, o efeito ainda não será sentido na safra 2011/12, já que os insumos do último plantio foram comprados quando o câmbio ainda se encontrava em patamares baixos. “Não houve nenhum grande descompasso na safra atual. De modo geral, o cenário foi positivo para os produtores”, afirma.