O corte de R$ 55 bilhões no orçamento da União para este ano, anunciado ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pela ministra do Planejamento, Miriam Belchior, pretende garantir o cumprimento da meta plena de superávit primário e viabilizar novas reduções da taxa Selic. Para compor esse contingenciamento, o orçamento dos ministérios foi subtraído em R$ 35 bilhões nas despesas discricionárias.
O restante do ajuste anunciado pelos ministros, R$ 20 bilhões, decorre da reestimativa dos gastos obrigatórios, entre eles os benefícios da Previdência Social, subsídios e benefícios assistenciais.
Em relação ao que teriam pela proposta original de Orçamento, os ministérios estão perdendo R$ 9,86 bilhões em dotações para despesas discricionárias, menos de um terço do corte anunciado nesse tipo de gasto. A maior fatia do ajuste, portanto, foi feita sobre dotações acrescentadas durante a tramitação do Orçamento no Congresso, onde o volume de despesas não obrigatórias subiu de R$ 220,97 bilhões para R$ 246,11 bilhões, entre emendas e ajustes de relatoria.
No decreto de programação financeira, a previsão de receita também cai. A receita primária ou não financeira (basicamente tributos) é estimada em R$ 908,29 bilhões ou 19,86% do Produto Interno Bruto (PIB), já descontadas as transferências constitucionais a Estados e municípios. Isso significa uma arrecadação R$ 29,49 bilhões abaixo da que foi estabelecida na lei orçamentária aprovada pelo Congresso. Sem descontar as transferências, a receita calculada pelo governo é inferior em R$ 36,41 bilhões. As principais diferenças referem-se a Imposto de Renda (R$ 12,1 bilhões), contribuições previdenciárias (R$ 4,76 bilhões), Cofins (R$ 4,18 bilhões) e Cide-Combustíveis (R$ 4,55 bilhões).
Na reprogramação, o governo foi mais conservador do que ele mesmo foi em agosto do ano passado, pois retirou da estimativa de receita líquida mais do que os R$ 26,1 bilhões acrescentados pelo Congresso à cifra prevista no projeto que deu origem à lei orçamentária.
Ano após ano, o Congresso tem reestimado a receita para cima, para poder incluir novas despesas no Orçamento. Ao proibir os ministérios de executar R$ 35 bilhões em gastos discricionários, o governo atingiu em cheio as dotações inseridas pelos parlamentares. Do total bloqueado, R$ 20,3 bilhões referem-se a emendas de deputados e senadores, informou a Secretaria de Orçamento Federal.
A diferença de quase R$ 30 bilhões na previsão de receita líquida não foi o único motivo do corte anunciado ontem. O contingenciamento teve que chegar a R$ 55 bilhões por causa da meta fiscal implícita na lei orçamentária, inferior à que o governo decidiu perseguir.
Na lei, as despesas foram calibradas para um superávit primário de R$ 71,4 bilhões no âmbito do governo central (Tesouro Nacional, Banco Central, Previdência Social). Mas o governo quer economizar R$ 97 bilhões, para que o conjunto do setor público não financeiro alcance um superávit de R$ 139,8 bilhões em 2012.
Os R$ 25,6 bilhões de diferença correspondem à parte dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) permite abater da chamada “meta cheia” de superávit primário. O Orçamento aprovado pressupõe o uso dessa possibilidade. Mas o governo já decidiu que não vai abater nada do PAC, embora pretenda executar integralmente o Orçamento do programa, fixado na lei em R$ 42 bilhões e preservado do corte.
Incluindo o PAC, as despesas primárias foram limitadas a R$ 811,3 bilhões, aí consideradas discricionárias e obrigatórias. O Orçamento de 2012 autorizava R$ 866,3 bilhões.
O orçamento total da União passa de R$ 2,25 trilhões, pois inclui investimentos das empresas estatais e despesas com rolagem da dívida. Mas atualmente é o gasto primário que interessa para efeitos de ajuste fiscal, inclusive para controle do endividamento público. Com a sobra da receita não financeira, ou seja, superávit primário, o governo cobre parte de suas despesas com juros da dívida.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, informou que o corte permitirá que a relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB feche 2012 em 35,3%, ante 36,5% registrados no fim de 2011. A conta pressupõe que a economia vai crescer 4,5% e que a inflação do IPCA ficará em 4,7% este ano.
Mantega voltou a falar em déficit nominal zero no futuro, o que implicará superávit primário suficiente para cobrir totalmente os gastos com juros. Não há, porém, um prazo definido para que se consiga trabalhar com essa meta.