As barreiras argentinas à entrada de mercadorias no país impuseram um duro golpe às exportações do Brasil em abril, que caíram cerca de 30% em relação a abril do ano passado, segundo informações obtidas pelo Valor. O fraco desempenho da balança comercial do Brasil será confirmado hoje, com a divulgação dos resultados do mês passado, que já preocupam autoridades. Parte do resultado negativo é provocado pela queda nas vendas ao mercado argentino, um dos principais destinos dos bens manufaturados do Brasil. Empresas se queixam de barreiras arbitrárias, que afetam cada vez mais setores.
“Há um desordenamento total no fluxo do comércio exterior”, queixa-se Elisabeth de Carvalhaes, presidente-executiva da Bracelpa, que reúne, no Brasil, produtores de papel e celulose, um dos novos setores alcançados pelas barreiras burocráticas criadas na Argentina. Cerca de 40% dos embarques de janeiro a março foram retidos nas alfândegas, e as remessas de abril estão totalmente bloqueadas provocando custos logísticos crescentes, relata.
A queda nas vendas brasileiras à Argentina vem aumentando progressivamente. Foi de pouco mais de 22% em março (em relação a março de 2011), acumulando uma retração pouco superior a 5% nas exportações do primeiro trimestre em relação ao mesmo período do ano passado. Em abril, com as vendas limitadas a 70% do resultado de abril de 2011, a queda no ano deve superar 11%.
As retenções prejudicam indiscriminadamente setores como o de carne suína e o de máquinas agrícolas, mas até empresas com instalações argentinas têm enfrentado dificuldade para receber peças enviadas do Brasil, como foi o caso da Marcopolo, que chegou a ficar sem componentes para carrocerias fabricadas em sua subsidiária Metalpar. Reservadamente, empresários ameaçam seguir o exemplo da Fiat, que paralisou linhas de montagem por falta de peças. Para o setor privado é evidente que o governo argentino não age para estimular determinados setores domésticos, mas para evitar uma queda no superávit comercial.
“Querem evitar que o superávit na balança comercial caia abaixo de US$ 5 bilhões, para não ter os problemas com as contas externas que o Brasil teve nos anos 80”, avalia o presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Rubens Barbosa.
Preocupados com a situação argentina, os dirigentes da Fiesp convidaram a vir ao Brasil o secretário de Comércio Interno do país, Guillermo Moreno, principal artífice e operador das barreiras comerciais no vizinho. Ele chega a São Paulo dia 8 de maio com uma missão empresarial para discutir o aumento de importações brasileiras de produtos argentinos. “Dissemos a eles que queremos colaborar, aumentando as importações vindas da Argentina”, diz Barbosa.
Na véspera, a secretária de Comércio Exterior argentina, Beatriz Pagliari, vai a Brasília encontrar-se com a secretária de Comércio Exterior do Brasil, Tatiana Prazeres, para discutir o assunto. Na última reunião da Câmara de Comércio Exterior (Camex), na semana passada, as dificuldades com a Argentina foram mencionadas, mas não há decisão no governo sobre a resposta a dar ao problema.
A crescente impressão de que as barreiras se devem a problemas do balanço de pagamentos no país vizinho e o fato de que o Brasil ainda mantém superávit nas relações com a Argentina, de quase US$ 1 bilhão de janeiro a março de 2012, pesam em favor dos que defendem evitar atitudes de confronto. Mas as queixas dos empresários, com fortes prejuízos devido à retenção de mercadorias, alimentam discussões sobre uma possível reação mais severa contra as barreiras no país vizinho.
O caso dos exportadores de papel e celulose incomoda por afetar um setor que negociou com os produtores privados na Argentina um acordo de monitoramento das exportações, e vem cumprindo seus compromissos. Apesar disso, a Bracelpa constatou casos como o de mercadorias que tiveram o certificado de origem vencido enquanto aguardavam, por mais de 90 dias, a liberação da alfândega argentina. “Quando saiu a liberação de entrada da mercadoria, ela foi retida novamente por ter vencido o certificado”, relata Elisabeth de Carvalhaes. “Ninguém consegue exportar mais nada, as empresas tentam remover a mercadoria da fronteira para outros destinos, a um custo absurdo.”
Devido ao grau de arbitrariedade das autoridades aduaneiras argentinas, a maioria dos empresários evita falar publicamente sobre seus problemas. Nos últimos dias, segundo um executivo com grandes interesses no país vizinho, o consulado argentino em São Paulo tem convidado empresários para “conversas”, nas quais é apresentada a reivindicação do governo de Cristina Kirchner para que aumentem os investimentos em território argentino. O tom, relatam empresários, é de ameaça de retaliação.