A multinacional americana Bunge, uma das maiores empresas do agronegócio mundial e principal exportadora do setor no Brasil, está prestes a incrementar de maneira significativa a sua capacidade de moagem de trigo no país. A companhia acaba de aprovar a construção de três novos moinhos, um no Rio e dois no Nordeste. O investimento total é de US$ 350 milhões, a ser aplicado nos próximos cinco anos, informou ao Valor na quinta-feira o vice-presidente de alimentos e ingredientes da Bunge Brasil, Gilberto Tomazoni.
Esse é o maior investimento da Bunge desde 2009, quando a empresa aplicou R$ 169 milhões em um único moinho no Complexo Industrial Portuário de Suape, em Pernambuco, que se tornou o mais moderno da América do Sul.
Hoje, a múlti conta com nove moinhos no país, em sete Estados e no Distrito Federal: além de Suape, existem unidades em Belém (PA), Contagem (MG), Brasília (DF), Rio de Janeiro (RJ), Santos (SP), Tatuí (SP), Ponta Grossa (PR) e Joinville (SC). O investimento está vinculado à estratégia da companhia de ampliar a participação de derivados de trigo nas vendas totais, apostando na produção verticalizada. “Estamos olhando para produtos de maior valor agregado”, diz Tomazoni. “E temos preferência por aquisições”.
No início de junho, a empresa desfez o Consórcio Trigo Brasil, que mantinha há oito anos com a J. Macêdo. Pelo acordo, a Bunge produzia para a J. Macêdo farinha de trigo para consumo doméstico ou como ingrediente de massas, misturas e biscoitos feitos pela empresa, o que a impedia de disputar esses mercados. Já a J. Macêdo não podia concorrer em panificação e alimentação fora do lar (“food service”), uma vez que atendia à Bunge no fornecimento de farinha para esses negócios.
“Com o fim do acordo, cada empresa pode trabalhar qualquer segmento de mercado a partir de março de 2013”, diz Tomazoni, destacando que o fim do consórcio foi uma decisão tomada em comum. Segundo o executivo, o investimento nos novos moinhos consolida a posição da Bunge em farinhas e derivados, fortalecendo a estratégia de expandir sua atuação em categorias sinérgicas. A ordem na Bunge – dona da margarina Delícia, do óleo Soya, da maionese Salada e dos molhos Etti – é se dedicar a itens que ofereçam maior margem. “Massas e biscoitos são possibilidades de expansão do nosso negócio”.
No fim do ano passado, a empresa foi uma das candidatas à compra da Marilan, quarta maior fabricante de biscoitos no país. No páreo, estavam as americanas PepsiCo e Campbell e a brasileira M. Dias Branco. A Bunge chegou a fazer “due diligence” na empresa, com sede em Marília (SP). Mas a fabricante de biscoitos pedia no mínimo R$ 600 milhões pelos seus ativos e nenhum dos interessados atingiu o valor. Em dezembro, a Bunge levou a marca Etti da Hypermarcas, entrando no mercado de atomatados. “Temos relacionamento com os produtores, que são nossos clientes em fertilizantes”.
Em entrevista ao Valor em dezembro, o diretor corporativo da Bunge, Adalgiso Telles, disse que a marca Etti tem potencial para pratos prontos e instantâneos. Segundo afirmou Telles à época, o mercado de alimentos representa cerca de 25% das vendas da Bunge no Brasil, que em 2011 foram de US$ 17,4 bilhões. No mundo, a fatia da divisão de alimentos e ingredientes é de 12%.
Caso expanda seu portfólio para massas e biscoitos, a divisão de alimentos e ingredientes da Bunge vai movimentar um mercado em franca consolidação, formado por centenas de fabricantes regionais e familiares. Em novembro, a PepsiCo levou a goiana Mabel por R$ 840 milhões, na mesma época em que tentava comprar a Marilan. Entre dezembro e maio, a M. Dias Branco – que também produz óleos e margarinas, como a Bunge – fez três aquisições, que totalizaram R$ 400 milhões: Pelágio (biscoitos Estrela), Moinho Santa Lúcia e Pilar. Com a investida, a cearense procura blindar o Nordeste contra o avanço dos concorrentes.
Mas, se depender da Bunge, a disputa está longe de acabar. “Vamos elevar em 50% os investimentos em marketing este ano”, diz Tomazoni, que destaca o Nordeste como principal mercado da Primor. A marca, mais conhecida pela margarina, expandiu o mix para atomatados, arroz, maionese e óleo. “Reposicionamos o nome para um consumo em família, com preço acessível”.
A empresa também mudou a formulação da margarina Delícia e apresentou este ano nova campanha de mídia, assinada pela Lew’LaraTBWA, voltada a um público mais jovem. Relançou o azeite Cardeal com quatro índices de acidez, cada um para um tipo de prato. Reposicionou Salada como marca de óleos premium e apresentou Cyclus como opção mais saudável de óleo e margarina.
Nos últimos anos, a Bunge passou a contar com uma frota exclusiva de distribuição, de mais de 100 caminhões. “Antes, os terceiros distribuiam produtos também dos concorrentes”, diz Tomazoni. Hoje, o mix da Bunge chega a 190 mil pontos de venda no país.
Há quase três anos no cargo, o executivo é ex-prata da casa da Sadia. Sua missão é preparar a Bunge para estar entre as maiores do varejo de alimentos. “A Bunge tem tradição no ‘food service’, é líder com farinhas, mas ainda há trabalho a fazer com o consumidor”, diz ele, destacando que o mercado de agribusiness, principal receita da empresa, é mais volátil do que o de consumo. Daí a decisão de apostar nas marcas.