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Brasil: envelhecer e enriquecer

Essa nunca foi a maior preocupação em um país que sempre foi sinônimo de juventude.

Silenciosamente, o Brasil se depara com um desafio capaz de definir os rumos de seu desenvolvimento: se impulsionará o crescimento sustentável ou atolará em uma armadilha fiscal de falta de oportunidades. Em apenas 20 anos, a população idosa dobrará de tamanho no país. Em comparação, o mesmo processo levou mais de um século na França.

Populações mais velhas estão normalmente associadas a países com maior grau de desenvolvimento, e o Brasil certamente está se inserindo nesse grupo. O país caminha para um perfil demográfico de primeiro mundo e ao mesmo tempo embarcou em um processo que está elevando muito os seus índices sociais. Contudo, também é verdade que o envelhecimento nunca esteve entre as principais preocupações de um país que sempre foi sinônimo de juventude e confiança em um futuro melhor.

Mas as rápidas mudanças demográficas em curso no Brasil não representam necessariamente um problema. O Banco Mundial acaba de lançar um amplo relatório que esmiúça os impactos fiscais, no crescimento, na pobreza e na prestação de serviços da mudança de perfil etário da população. A principal conclusão é que as mudanças são, antes de tudo, uma enorme oportunidade para impulsionar o crescimento e o desenvolvimento social. O país pode envelhecer e enriquecer ao mesmo tempo.

O Brasil passa por um curto período, o chamado “dividendo demográfico”, único na história de cada nação, quando a força de trabalho é muito maior do que a população dependente. Este é um ponto de inflexão que no Brasil deve persistir apenas até 2020, mas cujos impactos – positivos e negativos – durarão indefinidamente.

Contudo, o modelo sócio econômico atual, desenvolvido após a Constituição de 1988 em um contexto demográfico jovem, com grande pobreza, instituições nascentes e alta inflação, tende a desperdiçar os benefícios do dividendo. Ao favorecer as transferências públicas para os idosos, o modelo foi muito eficaz para reduzir a pobreza e a desigualdade, mas levou a gastos semelhantes aos de países da OCDE – embora a estrutura etária do Brasil ainda seja relativamente jovem. O resultado é uma menor capacidade de investimento nas camadas etárias que logo serão responsáveis por sustentar o crescimento do país e os benefícios de idosos, crianças e outros grupos dependentes.

Em um contexto demográfico fundamentalmente diferente, onde a população cada vez mais madura aumentará os pesos fiscais e de serviços sobre o sistema, o país pode ser forçado a tomar decisões difíceis, com consequências para a pobreza entre grupos vulneráveis e para o crescimento.

No “dividendo demográfico”, a força de trabalho é muito maior do que a população dependente
O Brasil precisa aproveitar a oportunidade real do dividendo e se preparar para as mudanças estruturais que irá encontrar nas próximas décadas. Por exemplo, o mercado de trabalho precisa criar oportunidades suficientes para a população em idade ativa no curto prazo, mas também terá que estimular a participação das mulheres e outros grupos na economia para sustentar o crescimento da produtividade no longo prazo.

Além disso, serão necessárias políticas eficientes para financiar os gastos fiscais associados ao aumento da idade da população e estimular o crescimento da poupança e do crescimento. Dessa forma, diferentemente do que normalmente se espera, o envelhecimento pode induzir um grande acúmulo de capital e aumentos de renda, riqueza e bem-estar ao longo da vida. O Brasil pode envelhecer e ao mesmo tempo se tornar um país rico, desmistificando a noção de que o desenvolvimento teria de vir antes da mudança demográfica. Os anos do dividendo demográfico, até 2020, são a janela de oportunidade para assegurar que isso ocorra.

Assim, é impossível exagerar a importância do momento. As escolhas em termos de educação, saúde e previdência nesta fase determinarão a capacidade do país para investir adequadamente nos seus jovens, dar uma vida digna e longa aos seus idosos, e continuar crescendo, oferecendo serviços de qualidade cada vez maior à população, e competindo internacionalmente – em suma, assumindo cada vez mais a condição de país desenvolvido.

Mas mudanças institucionais são difíceis de negociar com a sociedade, e têm longos períodos de transição. A experiência internacional mostra que, o quanto mais se adiam as reformas, maior será a sua necessidade, e mais drásticas elas terão de ser.

Afortunadamente, a própria dinâmica da mudança demográfica revela oportunidades de ganhos e compensações que podem ser exploradas. Por exemplo, a queda na fecundidade levará a menos alunos na escola primária, o que liberará recursos para outros propósitos, como o aumento da qualidade na educação e mais acesso ao ensino infantil. Da mesma forma, o processo gradual de envelhecimento é naturalmente propício a programas multianuais e menos drásticos de ajuste dos sistemas previdenciário, de saúde e educação. Mas esses programas precisam ser pensados e discutidos com antecedência para maximizar os benefícios e a transparência, e minimizar possíveis impactos adversos.

Os idosos de 2050 estão entrando na força de trabalho hoje, e as atuais regras da previdência, educação e saúde estão influenciando as suas decisões de longo prazo. É essencial que eles tenham os corretos contextos institucional, econômico e social para tomar as melhores decisões – para si, para as próximas gerações e para o país. Mas, o mero fato de o Brasil hoje debater como assegurar e expandir as suas conquistas ao envelhecer é testemunho do enorme caminho já trilhado rumo ao desenvolvimento e a erradicação da pobreza.

Makhtar Diop, ex-ministro da Fazenda do Senegal, é diretor do Banco Mundial para o Brasil desde janeiro de 2009