Situação Interna
Há muito tempo não se vê uma safra com notícias tão boas no início. A primeira delas, obvio, é o nível de preços do milho no mercado interno e principalmente no externo. Embora o preço do milho tenha caído um pouco neste segundo semestre, os valores ainda estão bem compensadores e incentivaram os agricultores a aumentar a área plantada.
A segunda é que com o incentivo da perspectiva do preço foi possível aos agricultores tomarem a decisão sobre o que plantar de forma mais rápida e isso facilitou o início do plantio. Em todas as regiões o plantio do milho de verão foi iniciado em épocas favoráveis, de acordo com o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (cujo foco é evitar frustações de produtividade) do Ministério da Agricultura. Plantios realizados nessa época têm menor risco climático, o que é talvez a maior contribuição para a obtenção de rendimentos agrícolas mais elevados. Além do plantio na época mais adequada (a agência Safras & Mercados reporta um ritmo de plantio para a safra de verão 7% superior ao do ano passado), o clima também tem sido favorável neste início.
A terceira, que vai afetar principalmente a safrinha, é que o plantio da soja também está antecipado em relação aos outros anos, o que possibilitará a implantação da safrinha em épocas menos arriscadas e mais favoráveis à obtenção de maiores produtividades agrícolas. Levantamentos realizados pelo Imea (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária) indicam que o plantio da soja no estado de Mato Grosso está 9% adiantado em relação ao da safra de 2009/10, que foi implantada sob um regime de chuvas muito favorável. A grande contribuição deste plantio em épocas mais favoráveis, principalmente na safrinha, é que os produtores podem aumentar a quantidade e a qualidade dos insumos que irão utilizar, principalmente porque o risco é menor. O Imea apresenta uma estimativa preliminar de crescimento da área plantada com milho safrinha de 14% em relação à safra passada (que foi afetada pelo atraso no plantio da soja).
Relacionado com a realização do plantio na época mais adequada, previsões dos meteorologistas indicam um La Niña mais fraco, situação em que problemas climáticos podem ocorrer; porém serão de curta duração e de baixa severidade. Caso isso ocorra, pois previsões são previsões e não certezas, as condições para a obtenção de produtividades recordes existem.
Isso tudo em um ano em que a área plantada com milho no Sudeste/Sul do Brasil se incrementou consideravelmente. O Deral (Departamento de Economia Rural da Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Paraná) informa um incremento de 19% na área plantada com milho no verão. A Emater-RS projeta um acréscimo de área plantada superior a 4,5% em relação à safra passada (além de um ritmo de plantio que já supera em 10% o percentual da área plantada nas safras anteriores).
Como resultado, as consultorias privadas já estimam uma safra recorde para o milho. A Céleres elevou em 3 milhões de toneladas a sua previsão inicial da safra 2011/12 (verão mais safrinha), com um acréscimo de 10 milhões de toneladas com relação à safra passada.
Para finalizar, as exportações continuam firmes. No período janeiro-outubro deste ano já foram exportadas 700 mil toneladas a mais do que no mesmo período do ano passado. Isso com toda a dita dificuldade de logística.
Com certeza há muitos anos não se via tanto entusiasmo com a cultura do milho. O resultado final fica por conta do clima, mas isso ainda é futuro. A única certeza está na permanência da pressão representada pelo aperto nos estoques existentes e na abertura do mercado para outros potenciais exportadores, dentre os quais o Brasil se coloca.
Situação Mundial
No mercado internacional, existem poucas novidades. Os estoques continuam baixos, sem muitas perspectivas de crescimento. Em decorrência, os preços continuam elevados e devem continuar. Surgiram novos participantes do mercado exportador, principalmente no Leste Europeu. Porém, os projetos de elevação de produção de suínos na região, há muito acalentados, podem aumentar também o consumo regional. Para finalizar, a China vai mesmo, pela pressão de consumo de sua população, aumentar as importações de milho. Nuvens carregadas apenas em função da recessão que ronda os países ricos e seu possível efeito sobre a demanda por alimentos nesses países. O ponto positivo é que existem outras despesas para cortar nos países ricos, antes dos alimentos.
Na Argentina, a disputa sem fim entre os agricultores e o governo, derivada da imposição de quotas de exportações e retenções fiscais, tem direcionado parte da produção de grãos para a produção de biodiesel (no caso da soja) e etanol (no caso do milho). Como a comercialização desses derivados no mercado exportador é menos controlada pelo governo, este se torna a alternativa à exportação direta de grãos (a Argentina já é o maior exportador mundial de biodiesel, vendido principalmente para a Europa). Os problemas de balanço de pagamento também têm aumentado o interesse da substituição do diesel e da gasolina importada pelo biodiesel e pelo etanol. Um programa governamental instituiu uma meta de mistura de 7% desses produtos no diesel e na gasolina. Ao mesmo tempo, verifica-se o crescimento da participação da carne de frango na dieta dos argentinos (um estudo do Rabobank já indica o crescimento acelerado da participação do frango argentino no mercado mundial). Esses acontecimentos no segundo maior exportador de milho do mundo indicam uma tendência cada vez maior de procurar usos internos para produtos agrícolas, mediante transformações em outros alimentos (proteínas animais) ou em produtos industrializados (combustíveis).
Dentro dessa perspectiva, o mercado externo funciona como balizador de preços internos e para atender necessidades eventuais provocadas por problemas climáticos. A busca da autossuficiência, principalmente nos países pobres e dependentes do milho para atender às necessidades de sua população, deve ser uma preocupação constante dos governos desses países, ao invés da postura de culpar a emergência de outras utilizações como algo prejudicial, na medida em que afeta os preços do milho que importam.
Por João Carlos Garcia e Jason de Oliveira Duarte – Pesquisadores da área de economia agrícola da Embrapa Milho e Sorgo.